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Solidariedade zero

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Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 11 jan 2022, 16h09 - Publicado em 18 set 2009, 20h17
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  • Estou na podóloga. Jogamos conversa fora enquanto ela ajeita minhas unhas. Como de praxe, falamos sobre assaltos, tão comuns no dia a dia do paulistano. Recentemente, conta ela, assistiu a um, em frente ao seu salão: três rapazes arrombaram um carro, sem se importar com o alarme, depenaram e fugiram. Fico espantado.

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    – Você não chamou a polícia?

     

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    – Eu não! Tive medo de que eles descobrissem e se vingassem mais tarde.

     

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    Observo a rua. Há uma banca de revistas, dois bares e prédios com porteiros devidamente protegidos por grades. Indago:

     

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    – Como saberiam, se você está aqui dentro?

     

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    – Ah, não sei… Mas o homem da banca disse que eu fiz bem.

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    É uma atitude frequente. Assaltantes cometem violências diante de testemunhas que desviam o olhar. Nos semáforos, enquanto alguém é roubado, os outros motoristas ficam em silêncio, imóveis. Raramente alguém chama a polícia. Ao sair de um caixa automático de um banco, à noite, certa vez um conhecido testemunhou o que poderia ser um sequestro-relâmpago. Uma jovem em lágrimas era levada para dentro de um carro, onde já havia um motorista esperando. Surpreendi-me:

     

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    – Ficou quieto? Não fez nada?

     

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    – E se fosse só uma briga de família? Com que cara eu ia ficar?

     

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    – Se a moça estava chorando e sendo forçada a entrar no carro, mesmo pelo marido, você teria feito muito bem em pedir socorro – respondi.

     

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    Recebi de volta uma expressão de desagrado.

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    As pessoas preferem se abster. Pior: às vezes ficam aliviadas, por não serem elas mesmas as vítimas. Somem de cena, voam para seus carros, enquanto alguém se rala. Dia desses uma amiga comentou, falando de outra:

     

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    – Estava conversando no celular no meio da rua. Também, pediu para ser assaltada!

     

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    Além de ser roubada, a pessoa ainda leva a culpa? É um jeito muito maluco de encarar a situação. Mas comum. Recentemente, um conhecido comentou:

     

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    – Fui assaltado quando passeava no bairro de noitinha. A culpa foi minha, porque aquela rua é muito vazia.

     

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    Foi assaltado e a culpa é dele mesmo? Estava andando em um local cheio de prédios, com porteiros e zeladores que assistiram impávidos à violência.

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    O descaso se estende até a situações onde não há violência explícita. Certa vez, na Rodovia Raposo Tavares, passei por um carro parado na pista do meio. O motorista caído sobre o volante. Os veículos desviavam. Impossível parar e atravessar a pista para ajudar, devido ao trânsito. Acelerei até o posto rodoviá-rio. Pedi socorro, mais por desencargo de consciência. Estava certo de que muitos outros já haviam feito o mesmo. Coisa nenhuma! Ninguém tinha se dado ao trabalho de avisar!

     

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    Não me julgo um exemplo. Só tento me colocar no lugar da pessoa. Como me sentiria se me roubassem e todo mundo fingisse não ver? Há maior solidão do que essa? No entanto, abandonar o próximo em uma situação difícil não é uma total falta de compaixão?

     

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    Sinto que o cidadão trocou a segurança pela burrice. Durante o papo com a podóloga, questionei:

     

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    – E se todo mundo, você, o revisteiro, o pessoal dos bares, os porteiros, chamasse a polícia todas as vezes em que houvesse um assalto?

     

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    Ela me olhou admirada. Concluí:

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    – Em pouco tempo a situação iria se inverter. Os ladrões deixariam de roubar por aqui.

     

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    Ela suspirou e terminou de lixar minhas unhas. Prometeu que vai mudar de atitude. Será? Fui embora com a sensação de que a vida na metrópole será muito melhor quando cada um descobrir que se tornará mais forte ao ajudar o próximo.

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