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Região central abriga entidade esotérica fundada há mais de um século

Sede do Círculo Esotérico da Comunhão do Pensamento, criado em 1909, reúne adeptos em rituais e abriga uma biblioteca com 17 000 livros

Por Guilherme Queiroz
Atualizado em 27 Maio 2024, 22h15 - Publicado em 25 mar 2022, 06h00
Suely é uma senhora idosa, branca, de cabelos curtos e grisalhos. Ela usa um suéter rosa e posa ao lado de uma estante de madeira, com um livro na mão. A construção é antiga e, ao fundo, é possível ver quadros com fotos de quatro homens banhadas em ouro.
A presidente Suely, com exemplar da biblioteca. Ao fundo, o fundador e os patronos do Círculo, banhados em ouro (Rogerio Pallatta/Veja SP)
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“Eu sempre fui meio carola”, brinca Suely Fernandes, 73, presidente do Círculo Esotérico da Comunhão do Pensamento, entidade fundada na capital em 1909. Depois de mais de um século de existência, a instituição ainda desperta a curiosidade dos místicos, embora não com a mesma força de tempos passados. Suely explica que não há nada de secreto por ali. “Somos esotéricos”, resume. A fórmula para entender a ideologia está na biblioteca, localizada na atual sede da entidade, construída em 1925 no número 87 da Rua Doutor Rodrigo Silva, no centro. São 17 000 exemplares, com livros sobre budismo, tarô, astrologia, ioga, maçonaria, feitiçaria e religião nórdica, entre outros milhares de assuntos.

“É uma filosofia, nossa ordem se preocupa com o desenvolvimento mental por meio de exercícios de meditação e observação da natureza”, conta a presidente. Os filiados pagam uma taxa anual com valor mínimo de 330 reais e recebem livro de instruções, assinatura de revista trimestral, acesso à biblioteca e aos rituais exclusivos: “A chave de harmonia é o principal, que é diário. Pontualmente, às 18 horas, uma prece, que se pode fazer sozinho em casa. Pede-se harmonia para toda a humanidade”, resume Suely.

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Outro livreto conta com uma frase para cada dia do ano, que deve ser mentalizada ao longo das 24 horas. No dia 14 de março, por exemplo, “Eu vejo Deus em tudo e em todos”. Não há uma religião unânime entre os associados, o difícil é não ter crença. “Um ateu se interessar? Talvez por mera curiosidade. A única coisa é que aqui acreditamos na reencarnação, então pode ficar difícil ser evangélico”, diz Suely.

Às segundas, a chave de harmonia é feita de forma presencial, no prédio de três andares da Doutor Rodrigo Silva. Ali dentro, a imagem do fundador, Antonio Olivio Rodrigues, e, ao seu lado, a dos patronos da filosofia do Círculo, o ocultista Éliphas Lévi, o hindu Swami Vivekananda e o religioso Prentice Mulford, estão banhadas em ouro, assim como o restante das que estão esculpidas nas paredes e no teto. O local é tombado pelo patrimônio histórico e teve uma reforma na fachada concluída há alguns meses.

Centro exotérico. O prédio é um sobrado antigo, com três amplas janelas verticais e duas portas de vidro no andar debaixo. A construção é bege e cheia de arabescos.
A fachada do prédio na Rua Doutor Rodrigo Silva, 87 (Rogerio Pallatta/Veja SP)

Antes da cerimônia às 18 horas, que ocorre no 3º andar, os seguidores se sentam nas cadeiras da biblioteca, no 2º pavimento. No 1º fica uma livraria com livros esotéricos, também do Círculo. “Eu estou aqui há vinte anos, sou da umbanda. Conheci por vizinhos”, diz o alfaiate aposentado Joaquim Libório do Amaral, 84. “Comecei no dia 10 de março, me identifico como cristão. Pessoas da minha família, como minha mãe, frequentavam”, conta o recém-chegado, o atendente de restaurante Kauê Cezaretti de Rezende, 33. “Estou aqui desde 1980, há 42 anos. Eu queria ver o lado bonito, porque no IML (Instituto Médico-Legal) é tudo o que há de mais triste da vida”, explica a ex-auxiliar de necropsia Roseli Aparecida da Silva, 69. Eles estão entre os cerca de 1 500 membros ativos da instituição em todo o país, distribuídos entre as 32 células associadas à matriz paulistana, localizadas em diversas cidades. O número é pequeno comparado ao do passado: nos registros históricos, são mais de 300 000 filiados desde 1909.

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“Tem também o pessoal que se filia e não se mantém, eles deixam de pagar e de contribuir”, lamenta Suely, que se vinculou ao local nos anos 90 e é ex-coordenadora pedagógica da prefeitura de São Paulo. “Estamos lutando para manter isso aqui”, diz. Lutando mesmo, até na Justiça. Quase no fim da Rua Doutor Rodrigo Silva, no número 46, a outra propriedade do Círculo não está tão bem cuidada quanto a biblioteca.

Veja SP
A biblioteca do Círculo conta com mais de 17 000 exemplares sobre diversas religiões e crenças (Rogerio Pallatta/Veja SP)

É um prédio de nove andares, que começou a ser construído nos anos 90 e nunca foi concluído. Apenas dois pavimentos são usados pela instituição, um deles para palestras e o outro como estacionamento. Daquele prédio, que a prefeitura inclusive já tentou desapropriar para uso de habitação social, a administração municipal cobra uma dívida de 930 000 reais de IPTU, não pago desde 2017. “Estamos tentando pedir a isenção do imposto”, explica Suely, já que, pela classificação fiscal como “templo” na construção datada de 1925, a instituição não paga a taxa.

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Como tentativa de atrair novos adeptos, cerimônias passaram a ser realizadas de forma virtual, assim como aulas sobre o livro de instruções dado aos filiados, que explica as crenças e os pilares da entidade. “Está chegando gente nova por causa da internet, temos alunos de Manaus, Espírito Santo, Chapecó”, diz Suely, esperançosa de tempos melhores.

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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de março de 2022, edição nº 2782

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