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O verde aprisionado

Houve um tempo em que, se eu estivesse andando pela região da Paulista, eu atravessava o Parque Trianon. É uma pequena reserva de Mata Atlântica. Bastam alguns passos entre a vegetação densa para a gente se esquecer do barulho e da loucura da cidade. Não eram passeios programados. Só um intervalo na corrida cotidiana, como […]

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 19h44 - Publicado em 18 set 2009, 20h18
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  • Houve um tempo em que, se eu estivesse andando pela região da Paulista, eu atravessava o Parque Trianon. É uma pequena reserva de Mata Atlântica. Bastam alguns passos entre a vegetação densa para a gente se esquecer do barulho e da loucura da cidade. Não eram passeios programados. Só um intervalo na corrida cotidiana, como estudante ou jornalista. Gastava quinze, vinte minutos caminhando entre as árvores, relaxando. Se tinha mais tempo, sentava em um banco. Muitas vezes passava pela casa do administrador (esse era seu cargo, pelo que lembro) e observava seu quintal repleto de galinhas, patos. Uma casa do interior no meio da Avenida Paulista. Cheguei a entrevistá-lo, uma vez. Ele me explicou:

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    – Muitas crianças só conhecem frango de supermercado. Aqui elas podem ver como é uma galinha de verdade. Uma porção delas se admira, sabe?

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    A casa ainda está lá. As galinhas não vi mais. Se voltaram, eu não sei. Pelo simples fato de que não entro mais no parque. Faz um bom tempo, a maior parte de sua área foi cercada por grades. A entrada permanece aberta. Mas a possibilidade de estar na Alameda Santos e simplesmente desviar pelo parque desapareceu. O motivo foi o de sempre: violência. Pessoas eram assaltadas. Como acharam impossível resolver o problema, cercou-se o parque.

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    Quando foram construir a garagem subterrânea, cheguei a participar de um movimento de protesto. Junto com minha professora de ioga e um batalhão de ativistas, “abraçamos” o parque, criando simbolicamente um cordão humano em torno. Temíamos que as árvores morressem. Isso não aconteceu. Muito pior que qualquer garagem são as grades.

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    O problema é que nem posso ser radicalmente contra, sem dizer que a solução deve ser mais profunda. Há muitos anos, subindo a Avenida Lacerda Franco, na Vila Mariana, tive uma constatação arrepiante. Alguém quebrara o tronco de todos os arbustos plantados ao longo da calçada. Todos. Cheguei a exclamar em voz alta:

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    – Que tipo de pessoa é capaz de destruir tantas árvores, metodicamente?

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    Eu não gostaria de deparar com alguém assim. É um comportamento assustador.

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    Sempre reclamo quando nos comparam com outras cidades do mundo, para apontar defeitos. No caso, é inevitável. Em outras metrópoles, o parque, a praça fazem parte do tecido urbano. Convive-se com o verde quando se atravessa uma rua, quando se sai de casa no fim da tarde, quando se marca um encontro. É um hábito. Aqui, a vegetação, que já não é muita, é protegida por grades, como se ela própria fosse uma criminosa condenada à prisão perpétua.

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    Já morei na Aclimação, perto do Largo General Polidoro. Era uma pequena praça romântica, delicada. Todos os dias, ao sair de casa, tinha o prazer de olhá-la. Muitas vezes pegava um livro e passava algum tempo tomando sol, mergulhado em um romance. Recentemente passei por lá. Gradeada. Pichada. A pavorosa estrutura de ferro acabou com a beleza. O Parque do Ibirapuera está sendo cada vez mais cercado. Até para cobrar estacionamento. A Praça Roosevelt, no centro, ficou repleta de grades e portões. A cada dia, deparo com nova barreira. Seria impossível relacionar todos os locais. Tenho certeza de que todo mundo já viu uma pracinha querida assumir o aspecto de prisão de segurança máxima. Sem dúvida, os fabricantes de grades ficam felizes. Mas só eles. A cada árvore engaiolada, a cidade perde alguma coisa.

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    Pior que tudo, é um termômetro de nossa qualidade de vida. Em uma cidade onde até as árvores são aprisionadas, como fica o cidadão?

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