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Neschling acumula funções no Municipal e recebe R$ 5,5 mi em 3 anos

Segundo CPI, o diretor artístico do Theatro Municipal escalava a si mesmo para récitas e concertos à frente da Orquestra Sinfônica Municipal

Por Estadão Conteúdo
Atualizado em 27 dez 2016, 16h17 - Publicado em 8 ago 2016, 10h59
john neschling terraço paulistano ed. 2337
john neschling terraço paulistano ed. 2337 (Adriano Vizoni / Folhapress/)
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Notas fiscais entregues à CPI do Teatro Municipal na Câmara de Vereadores mostram que o diretor artístico da casa, John Neschling, escala a si mesmo para récitas e concertos à frente da Orquestra Sinfônica Municipal. 

Responsável pela grade artística, é o próprio maestro quem define quantas vezes se apresentará. Na programação deste ano, por exemplo, o nome dele aparece 19 vezes, de um total de 36 concertos. Ambos os serviços chegam a custar 280 000 reais mensais. Em três anos, já são 5,5 milhões de reais.

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A autocontratação não é vetada pela Fundação Theatro Municipal, mas o acúmulo de funções, sim. De acordo com o estatuto, a “diretoria artística não pode ser ocupada por regentes dos corpos artísticos”, como a OSM. Na prática, isso quer dizer que Neschling não poderia ser diretor artístico e também regente da orquestra. Mas é o que informa o site da fundação. 

O maestro diz que seu contrato prevê direção artística e regência. 

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À frente de ambos os cargos, Neschling tem autonomia para escolher quem se apresentará no Municipal. Essa atribuição é exclusiva porque outro item do estatuto não é seguido à risca: a atuação de um conselho que discuta e defina, em conjunto, a grade artística. Uma das notas obtidas pela reportagem deixa claro que essa função é centralizada no maestro.

Em outros teatros do mundo o acúmulo de funções é permitido, mas o salário pago por mês já inclui as regências que o maestro faz no teatro que dirige. Foi assim com o próprio Neschling em 2014 e 2015. Os contratos estabeleciam que o maestro teria de fazer ao menos 20 récitas por ano. O atual não estipula o número de regências, cita só “serviços artísticos” como objeto do acordo e apresenta uma programação que, segundo o texto, pode mudar.

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O salário fixo de Neschling, de 150 000 reais por mês, e suas decisões artísticas são alvo de investigação no Ministério Público Estadual (MPE). Os promotores apuram, entre outras coisas, por que o maestro recebe salário mesmo quando não está no Brasil – vereadores que compõem a CPI afirmam que ele passa de quatro a cinco meses no exterior – e por que contrata espetáculos do mesmo agente que o representa na Europa. Essa última condição é vetada no contrato vigente.

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Neschling, no entanto, continua contratando espetáculos montados pelo agente Valentin Proczynski, que é um de seus empresários. Neste ano, o produtor já encenou no teatro dois espetáculos: Lady Macbeth e El Amor Brujo. É dele também o polêmico projeto Alma Brasileira, cancelado depois de a prefeitura ter pago 1 milhão de reais.

Para o vereador Ricardo Nunes (PMDB), da CPI, esse formato de contratação proporciona o que ele chama de “farra orquestrada do mau uso do dinheiro público”. “O maestro contrata quem quer, pelo valor que julga necessário (já que não existe licitação) e, como retribuição, é contratado pelas mesmas pessoas”, critica.

Os negócios firmados com Proczynski são investigados pelo MPE. O esquema teria desviado ao menos R$ 15 milhões do teatro, entre 2013 e 2015, por meio de espetáculos superfaturados e uso de notas frias. Ex-diretor-geral da fundação, José Luiz Herência é réu confesso. Ele assumiu ter desviado R$ 6 milhões e firmou acordo de delação, no qual acusa Neschling, o ex-diretor do Instituto Brasileiro de Gestão Cultural (IBGC), William Nacked, e o secretário municipal de Comunicação, Nunzio Briguglio Filho, que negam envolvimento.

Contas

Contratado pelo Instituto Brasileiro de Gestão Cultural (IBGC), organização social que comanda o teatro, o maestro entrega mensalmente notas sobre os serviços prestados. Elas indicam os valores e o tipo de serviço. Há notas que mencionam récitas em meses em que Neschling não as realizou, segundo o site da fundação. A gestão Fernando Haddad (PT) não se manifestou sobre as notas e o acúmulo de funções do maestro.(Colaboraram Alexandre Hisayasu e João Luiz Sampaio)

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Defesa

John Neschling afirmou, em entrevista por e-mail, que o contrato dele prevê direção artística e regência. Segundo o maestro, como diretor, ele “tem todo o interesse em reger a orquestra para implementar a qualidade que deseja” e pode fazer isso quantas vezes quiser. O maestro afirmou ainda que não recebe por récita, por isso, quanto mais vezes ele reger, mais econômico será.

Sobre o acúmulo ilegal de funções, Neschling negou. “Se a Fundação Theatro Municipal e o Instituto Brasileiro de Gestão Cultural descrevem as minhas funções de forma diferente à que está no contrato, não é minha responsabilidade. Meu trabalho obedece estritamente o estatuto”, afirmou.

Já em relação ao salário de 150 000 reais que recebe mensalmente, o músico disse que se “faz muito barulho em torno disso”. Segundo Neschling, um maestro nos Estados Unidos, em posição equivalente recebe entre 1,2 milhão e 1,7 milhão de dólares por ano, sem exclusividade.

O maestro justificou a forma de apresentação das notas fiscais. Segundo ele, o descritivo foi sempre orientado e feito de acordo com o IBGC, sob o comando inicialmente de William Nacked e, depois, do interventor nomeado pela Prefeitura, Paulo Dallari.

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Sobre contratar seu agente como produtor do teatro, Neschling disse que não há conflito de interesse porque ele mesmo pagava pelos agenciamentos feitos por Valentin Proczynski. “Aliás, o fato de que Valentin é um dos meus agentes no exterior sempre foi do conhecimento de todos na Fundação Theatro Municipal e no IBGC”, diz.

Por fim, o músico afirma que a acusação de José Luiz Herência trata-se de uma “forma desesperada de proteger a família dele e os amigos envolvidos em seu esquema sujo”. Segundo e-mail enviado por Neschling, uma “minuciosa apuração realizada pela Controladoria-Geral do Município deixou claro que ele não teve nenhuma participação nos desvios perpetrados”.

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