Gamers aproveitam sucesso na carreira para ampliar negócios

Jogadores de esportes eletrônicos investem em marcas de roupa, eletrônicos, bonecos e itens de papelaria

Por Matheus Prado
Atualizado em 19 abr 2019, 06h00 - Publicado em 19 abr 2019, 06h00
O Counter-Strike coloca 6 000 pessoas no Ginásio do Ibirapuera (Blast Pro Series/Divulgação)
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Em um relatório publicado no último mês de outubro, o banco americano de investimentos Goldman Sachs estimou que a movimentação financeira do mercado de esportes eletrônicos vai ultrapassar 1 bilhão de dólares, o equivalente a 3,9 bilhões de reais, em todo o mundo neste ano. A equação inclui valores de patrocínio, publicidade, licenciamento, ingressos e merchandising.

Boa parte desse montante circula especificamente em torno dos jogadores, e algumas dessas figuras ganharam destaque recente não apenas na esfera esportiva, mas também na empresarial. São jovens que se desdobram entre os times e suas companhias próprias, fundadas com o objetivo de aproveitar a fama proporcionada pelos jogos. Em geral, contam com a retaguarda familiar na administração dos negócios. “O exemplo dos gamers é parecido com o dos atletas tradicionais ou dos atores. Eles são influenciadores, e as marcas querem pegar carona nessa credibilidade”, afirma Roberto Iervolino, gerente-geral no Brasil da desenvolvedora americana de jogos Riot Games.

Por aqui, alguns dos principais nomes desse fenômeno “atleta-empresário” são Felipe “brTT” Gonçalves, Felipe “YoDa” Noronha, Gabriel “FalleN” Toledo e Marcelo “Coldzera” David. Os dois primeiros são campeões brasileiros de League of Legends (LoL), jogo on-line de batalhas em arena. Os outros são bicampeões mundiais de Counter-Strike: Global Offensive (CS:GO), jogo on-line de tiro em primeira pessoa. Confira a trajetória deles nas próximas páginas.

FalleN
FalleN e um teclado ECO: início na loja da mãe (FalleN/Divulgação)

O professor e o seu império

Criado na loja de informática da mãe, Kenia, em Itapetininga, no interior do estado, Gabriel Toledo, 27, conheceu o Counter-Strike em 2003, quando adotou o apelido de FalleN. “Um dia, um rapaz pediu para comprar uma camisa da minha equipe de game. Falei que lhe daria de graça se ele fizesse aulas comigo”, lembra. Não só passou a ser professor como também criou uma loja, para fidelizar os fãs. O projeto foi tocado artesanalmente até que o jovem viajou para os Estados Unidos, em 2015. Nessa época, chamou sua mãe e outros familiares para que ajudassem na operação. Separaram a plataforma educacional e investiram mais na loja. Dividiram a marca em três: gear (material), store (loja) e wear (roupas). A primeira produz periféricos: mouses, fones e teclados.

teclado de games – FalleN
(FalleN/Divulgação)
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A segunda licencia e comercializa marcas do mercado. A terceira vende artigos da própria grife. Em 2017, o grupo FalleN passou a funcionar em um galpão em Guarulhos e hoje conta com doze funcionários. Paralelamente ao crescimento da empresa, Gabriel ganhava tudo no game. Foi bicampeão mundial e, só em premiações, estima-se que tenha recebido em toda a carreira quase 1 milhão de dólares, o equivalente hoje a 3,9 milhões de reais. “Uma das minhas grandes motivações como atleta é poder ajudar minha família. Hoje ela me ajuda também”, resume.

brTT
brTT, com roupas da Rexpeita: skate e hip-hop (WilMore oliveira/rexPeita/Divulgação)

Rato da street wear

Foi numa transmissão on-line, em 2013, que tudo começou. Conhecido pelo apelido de brTT, Felipe Gonçalves jogava com um personagem que tem traços de roedor e, ao realizar uma boa jogada, gritou “respeita o rato!”. Os espectadores passaram a repetir a frase no chat e daí surgiu a Rexpeita, em referência ao chiado do sotaque carioca do jovem. Fundada com o irmão Leandro e o amigo Felipe Salgado, a empresa começou a vender bonés, a única peça visível durante as lives dos jogos. Encomendou 200 unidades para testar o mercado, e as peças sumiram rapidamente do estoque. A partir de 2015, surgiu a intenção de extrapolar o universo dos esportes eletrônicos. “Queríamos crescer em outras áreas”, diz Gonçalves, de 28 anos. Assim, eles passaram a enviar os produtos para atletas do surfe, do skate e do jiu-jítsu, além da comunidade hip-hop.

Rexpeita
Boné da Rexpeita (Marcelo Ávila/rexpeita/Divulgação)
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A marca ganhou visibilidade e cresceu até mais que o nome de brTT. Hoje, a empresa possui oito funcionários e alcançou um faturamento de quase 2 milhões de reais por ano. Gonçalves participa das reuniões e dá palpites no processo criativo dos produtos. Em 2017, o trio decidiu que era o momento de agradecer à comunidade gamer e criou a PlayerLink, plataforma cujo objetivo é organizar aulas e competições para jogadores amadores de LoL. A iniciativa conta com mais de 180 000 usuários.

Coldzera
Coldzera em ação em torneio (Blast Pro Series/Divulgação)

Vasourada nos planos

Nascido em São Paulo, Marcelo David tinha todo o seu futuro previamente planejado pelos pais. Ele deveria terminar os estudos e assumir a administração da fábrica de vassouras da família. Mas em 2015, quando apareceu a chance de profissionalizar-se como jogador de Counter-Strike, não deixou ninguém mais interferir em sua vida. Convidado por FalleN para integrar seu time, foi morar nos Estados Unidos. Sagrou-se bicampeão mundial, recebeu prêmio de melhor do mundo — entregue pelo site especializado HLTV — por duas vezes, em 2016 e 2017, e faturou quase 1 milhão de dólares. Os resultados impressionantes fizeram com que o pai, Mauro David, mudasse de ideia rapidamente. Ele sugeriu, então, que o filho criasse uma marca para fortalecer sua fama. “No início fiquei na dúvida, não queria dividir minha atenção.

Boneco Coldzera
Boneco Coldzera: peça exclusiva de olho no público infantil (Tiago Cardeal/Coldzera/Divulgação)
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Mas decidimos procurar um sócio para ajudar a tocar o projeto”, explica Marcelo, hoje com 24 anos e conhecido como Coldzera. Em 2017, os dois travaram contato com o empresário Sérgio Caramico, que já administrava as marcas Motorgrid e Cafajestando no e-commerce Lx650. Juntos, os três elaboraram uma linha de produtos batizada com o apelido do rapaz. Além de roupas, chaveiros e acessórios, a linha inclui um boneco colecionável do jovem, que mira o mercado infantil. No momento, o grupo negocia a venda na rede de brinquedos Ri Happy.

YoDa
Conhecido como YoDa, é um ávido streamer (Tom Rodrigues/Sehloiro/Divulgação)

Máquina de gírias

Uma das estrelas de League of Legends, Felipe Noronha tem o toque de Midas. Entre licenciamentos, patrocínios e outras atividades, a empresa do jovem deve faturar 3 milhões de reais até o fim de 2019. Aos 23 anos, ele conta com o apoio de sua mãe, Adriana, para pôr ideias em prática. Mas nem sempre foi assim. Paulistano, ele precisou convencer os pais de que videogame traria retorno. O jovem, conhecido como YoDa, é um ávido streamer (realiza transmissões ao vivo de seus jogos) e cria gírias que proliferam entre os fãs. Tudo começou em 2015. À época com uma média de 3 000 espectadores em suas lives, ele prometeu pintar o cabelo de loiro se esse número subisse para 10 000. Conseguiu, e daí veio o primeiro bordão: “SehLoiro”, com a nova cor de cabelo substituindo a palavra “louco”.

caderno YoDa
Caderno de sua marca: aposta em licenciamentos (Spiral/Divulgação)
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A expressão passou a batizar sua marca, que fechou parcerias com gigantes como a rede de papelarias Kalunga e o e-commerce Submarino. Seus próximos projetos são a entidade beneficente Yo Gamers do Bem, que busca inclusão de jovens por meio de jogos e tecnologia, e a plataforma de música e jogos Masters Of, concebida em parceria com o DJ Alok e com lançamento previsto para este ano.

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 24 de abril de 2019, edição nº 2631.

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