Eleições municipais podem ter um trio de apresentadores na disputa
José Luiz Datena entra na briga pela prefeitura da cidade em 2016, que já conta com a presença de Celso Russomanno e poderá ter ainda um terceiro apresentador na disputa, João Doria Júnior
Quando circularam as primeiras especulações sobre a possível entrada do apresentador José Luiz Datena, de 58 anos, na disputa eleitoral à prefeitura da cidade em 2016, Fernando Haddad, que vai tentar mais quatro anos no cargo, tratou a notícia como uma brincadeira. “O que eu tenho medo é que o SBT resolva lançar o palhaço Bozo como candidato”, disse ele, em um encontro com blogueiros da “mídia alternativa”. O que parecia piada virou realidade na última terça (28). Nessa data, Datena havia agendado uma reunião às 19 horas com os dirigentes do Partido Progressista (PP). Ansioso pelo cardápio do compromisso, chegou bem mais cedo ao local.
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Às 15 horas entrou no “boteco”, nome informal dado à garagem onde Antonio Buonerba, dono da cantina Jardim de Napoli, recebe amigos em noites regadas a massas e vinhos, em Higienópolis. De lá, ligou para o deputado federal Guilherme Mussi, diretor estadual da sigla, e o deputado estadual Delegado Olim, do comitê municipal. Queria antecipar o encontro. Pedido feito, pedido aceito. Quando o relógio Rolex do apresentador bateu 17 horas, Mussi e Olim apareceram na companhia do consultor Maurício Brusadin. Enquanto petiscavam patê de berinjela, mortadela e polpettone em pedaços, Datena fez um balanço das três sondagens que havia recebido para tentar chegar ao Edifício Matarazzo. Contou ter achado oportunistas as abordagens de PSDB e PSB, pois não lhe davam autonomia para escolher sua chapa nem montar equipe.
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O explosivo homem de 1,83 metro e 115 quilos gosta de ter o controle da situação. O PP lhe garantiu isso. Uma das imposições feitas: Olim teria de ser o vice de sua chapa (os dois ficaram próximos quando o jornalista passou a exibir diversas operações do delegado em seus programas de TV). Fechado o acordo, todos brindaram com cerveja Original.O delegado Wagner Giudice, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), e o apresentador Otávio Mesquita, do SBT, foram lá para comemorar. O último postou um vídeo nas redes sociais. “O meu prefeito está chegando”, exultou. (Veja entrevista com o apresentador no fim desta matéria).
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Há dezesseis anos Datena aborda temas como segurança, enchentes e saúde pública, caprichando no tom sensacionalista (sua tribuna atual é o Brasil Urgente, da Band). Sempre que perguntado sobre a possibilidade de usar a popularidade para obter dividendos na política, dava de ombros, jurando não possuir a menor vocação para mudar a realidade que costuma mostrar em seus programas. “Eu sou uma porcaria como administrador. (…) Não teria capacidade nenhuma para ser um bom político”, disse em entrevista ao portal UOL, em 2012. Agora, o discurso mudou. “Quis entrar porque os políticos de carreira acabaram com a cidade e com o país”, justifica o jornalista. “Jamais virarei um produto de marketing. Quem votar em mim será com minhas qualidades e meus defeitos, que não são poucos.”
Antes mesmo da candidatura, um de seus alvos prediletos era Haddad, a quem faz constantemente críticas duras no ar. O tom deve subir ainda mais na campanha. “O cara quer administrar por decreto, não sabe ouvir as pessoas”, fustiga Datena. Na quarta (29), o prefeito ainda não parecia levar a sério o novo concorrente. “Que bobagem ele está fazendo”, disse a amigos. Para interlocutores próximos, Haddad não deu a devida importância ao fato. Seu plano de conquistar a reeleição esbarra na maré de lama que envolve o PT e na vontade da população. Segundo a pesquisa mais recente sobre sua gestão no município (do Datafolha, em fevereiro), 44% o consideravam “ruim” ou “péssimo”, ante 20% que o avaliam entre “bom” e “ótimo”.
A campanha de 2016 já tinha um nome forte da TV na disputa, Celso Russomanno, do PRB. Na única sondagem da opinião pública feita até agora a respeito do pleito, realizada pelo instituto Paraná Pesquisas em junho, ele aparece com 41% das intenções de voto, à frente de Marta Suplicy (18%), ainda sem partido, e Haddad (14%). Além de Datena e Russomanno, a disputa pode ter um terceiro apresentador no páreo. Na semana passada, João Doria Júnior, responsável pelo Show Business, programa de entrevistas voltado para o mundo dos negócios e exibido nas madrugadas de sábado pela Band, revelou que está tentando emplacar como o candidato do PSDB. Até agora, os tucanos não dispõem de um nome definido. No levantamento do Paraná, dois dos políticos cogitados pelo partido, Bruno Covas e Andrea Matarazzo, não chegaram a dois dígitos na pesquisa.
Se Doria for bem-sucedido em seu plano, portanto, os paulistanos terão como opções nas urnas três pessoas vindas do universo da TV. A proliferação das candidaturas heterodoxas se deve a um descontentamento com o cenário atual, manchado por denúncias de corrupção e desgaste de nomes tradicionais. Historicamente, a aventura das celebridades pelas urnas costuma resultar em derrota. Quando o que está em jogo são cargos do executivo, o fracasso é ainda maior, muitas vezes por falta de um programa de governo estruturado. “Essas figuras costumam ter mais chance em votações proporcionais, como para vereador e deputado”, explica Rubens Figueiredo, consultor da Fundação Espaço Democrático. Datena e Russomanno, porém, não podem ser encarados como simples celebridades. Os dois estão à frente de atrações com forte apelo popular. “Eles discutem aquilo que é realidade na rotina do povo”, avalia o cientista político Rui Tavares Maluf. “A tendência é que o paulistano, pouco fiel a partidos ou ideologias, acabe escolhendo o candidato que faça oposição à gestão em vigor”, afirma Márcia Cavallari Nunes, CEO do Ibope Inteligência.
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Datena diz estar preparado para o papel de vidraça na campanha que vem pela frente. Uma das primeiras críticas surgidas na semana passada a sua candidatura estava relacionada ao fato de o apresentador, com o seu discurso moralista, ser associado ao PP, sigla que tem Paulo Maluf como um dos caciques no país. O próprio ex-prefeito e atual deputado federal estranhou a adesão de Datena. “Se ele quiser ser candidato, pode ser. Mas eu acho que é um rapaz muito inteligente e não acredito que troque o salário de 500 000 reais por mês na Band por um de 25 000 reais na prefeitura”, disse. “Engraçado, ele aprendeu a fazer conta”, rebate o jornalista. “Porque antes o dinheiro de suas obras ia parar em paraísos fiscais”, ironiza. “Maluf e Haddad deviam andar de bicicleta pela Avenida Paulista, pois são parecidos: ambos quebraram a cidade, um por superfaturamento e o outro por má gestão.”
O PP começou a tratar da parte burocrática da pré-candidatura. Mandou um emissário a Ribeirão Preto, terra natal do apresentador, para saber a situação dele com o diretório do PT (Datena é amigo do ex-presidente Lula e antigo simpatizante do partido). Nos anos 1980, a convite de um conterrâneo do interior, o ex-ministro Antonio Palocci, cogitou disputar uma vaga para vereador, mas mudou de ideia. O jornalista da Band também precisa transferir seu título para a cidade de São Paulo e mudar de residência, de Alphaville para cá. No mundo da política, é quase consenso que Datena e Russomanno devem disputar o mesmo espaço, com chance de um deles ir para o segundo turno. Uma das fofocas de bastidores aposta que o comandante do Brasil Urgente teria motivação extra para vencer a briga: o ressentimento com a Record, emissora à qual pagou uma multa estimada em 20 milhões de reais, quando rescindiu o contrato e voltou para a Band, em 2011. Além de ser uma das estrelas do canal de Edir Macedo, Russomanno conta com o apoio da Universal e de várias outras igrejas evangélicas. Datena nega ter o espírito de vingança. “Paguei minha dívida à Record e sempre fui bem tratado pelo Celso.”
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Nome forte na disputa, Russomanno se elegeu no ano passado deputado federal com 1,5 milhão de votos. Perdeu de forma dolorosa a eleição para a prefeitura em 2012. Depois de ficar um bom tempo na liderança das pesquisas, não chegou sequer ao segundo turno. Mesmo com o cargo no Legislativo, manteve seu palanque na Record, que lhe garante uma hora de exposição por dia, de segunda a sexta. “A TV me trouxe um público fiel e importante, a dona de casa, que é a formadora de opinião no lar”, conta. Seu quadro atinge uma média de 7 pontos na audiência. Nas próximas semanas, a emissora estuda transferir o Patrulha do Consumidor, que passava no Programa da Tarde, para o Cidade Alerta, exibido no fim da tarde, no mesmo horário do Brasil Urgente, de Datena. Assim, curiosamente, os dois personagens vão brigar diretamente no Ibope, numa prévia do que deve acontecer na política. De acordo com a legislação eleitoral, eles podem trabalhar como apresentadores até noventa dias antes do pleito.
No time de oposição a Haddad ainda há duas grandes indefinições. Uma delas envolve o rumo de Marta Suplicy, sem partido desde que abandonou o PT. Destinos possíveis são o PMDB e o PSB. Outra incógnita é o candidato tucano. O vereador Andrea Matarazzo e o deputado federal Bruno Covas aparecem com chance de ocupar a vaga. Mas o apoio do governador Geraldo Alckmin será decisivo na balança — e ele já manifestou a pessoas próximas o desejo de lançar alguém novo. Boa parte das esperanças de João Doria Júnior reside na amizade de mais de trinta anos com o governador. Os dois foram apresentados, na década de 80, pelo então prefeito de São Paulo, Mario Covas (1930-2001). Alckmin era deputado estadual, e Doria, secretário de Turismo de Covas.
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Hoje, em paralelo ao trabalho à frente de um programa de negócios, o apresentador comanda o Lide, um instituto que reúne cerca de 3 000 executivos de empresas brasileiras e multinacionais, promovendo debates e palestras sobre política e economia. Para formular seu plano de governo para São Paulo, diz ter convocado um grupo de trabalho com 27 pessoas. Fazem parte da turma os ex-ministros Roberto Rodrigues (da pasta da Agricultura do governo Lula) e Celso Lafer (de Relações Exteriores nas gestões de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso). Falta ainda combinar o desejo de Doria com os caciques do PSDB. “É um de nossos filiados, mas não tem vida partidária. Por isso, vai encontrar resistência e precisa superar esse obstáculo”, pondera Mario Covas Neto, presidente do diretório municipal do PSDB. Uma das hipóteses discutidas na sigla é a realização de uma prévia entre os pré-candidatos. A ideia é decidir até dezembro. Doria não se assusta com as dificuldades e prevê um embate excitante em 2016 com os outros dois colegas apresentadores.“Todos têm domínio da comunicação, poder de concisão e sabem falar com as câmeras. Certamente será um horário político mais interessante”, acredita. Isso depende, é claro, do ponto de vista. Para boa parte dos eleitores, a transformação do pleito em um show de TV com essas estrelas é pior do que qualquer palhaçada do Bozo, diante de tantas dificuldades e desafios que a cidade enfrenta nesse momento. Pobres de nós, paulistanos.
Com reportagem de Adriana Farias, Aretha Yarak e Daniel Bergamasco
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› O fato de o senhor não ser político pode atrapalhar?
Não. Essa classe está desacreditada. Os políticos não resolveram nada, estamos sempre diante dos mesmos problemas. O fato de ser novato não significa que eu não tenha conhecimento, sei bem quais são os problemas de São Paulo.
› O senhor já declarou que não gostaria de ser político…Mudei porque a cidade e o país estão abandonados. Com uma equipe boa, posso fazer a diferença. Eu fui convidado por diversos partidos, porém apenas no PP senti confiança e fui tratado com dignidade. Se no meio do caminho eu tiver a perspectiva de ser engolido pelo sistema, chuto o balde. Não existe uma versão light do Datena.
› O que acha do prefeito Fernando Haddad?
O cara quer administrar por decreto, não escuta as pessoas. A redução da velocidade das marginais foi assim. Ele acabou com o sentido dessas vias. Agora, um sujeito de bicicleta consegue assaltar um motorista por andar mais rápido.
› Apoia as ciclofaixas e o programa De Braços Abertos, duas bandeiras da atual gestão?
Não adianta o camarada ir para Londres e Paris, e depois querer implementar medidas aqui em São Paulo. Ciclofaixa não funciona em todos os lugares, muito menos por decreto. Quanto ao outro tema, acho que dar dinheiro a usuário de crack é utópico, porque é claro que ele vai gastar o dinheiro com droga.