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Cursinho para motorista

Fui renovar minha carteira de motorista. Surpresa! Devido a uma lei mais ou menos recente, eu deveria fazer um cursinho sobre trânsito durante quinze horas. Podia optar por um exame direto, mas o que lembrava do assunto? Horrorizei-me. Principalmente porque o intensivo começava às 8 da manhã, sábado e domingo. Lamentei-me com um amigo: – […]

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 19h44 - Publicado em 18 set 2009, 20h19
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  • Fui renovar minha carteira de motorista. Surpresa! Devido a uma lei mais ou menos recente, eu deveria fazer um cursinho sobre trânsito durante quinze horas. Podia optar por um exame direto, mas o que lembrava do assunto? Horrorizei-me. Principalmente porque o intensivo começava às 8 da manhã, sábado e domingo. Lamentei-me com um amigo:

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    – Que injustiça! Tenho carta há séculos!

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    – Olha, eu soube de um amigo de um primo do vizinho de uma tia de um despachante que quebra o galho. Você renova sem fazer o curso.

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    Não gosto de certo tipo de coisa. Como reclamar contra a máquina do governo se na primeira oportunidade…

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    – Vou fazer o curso – respondi, bocejando por antecipação.

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    Inscrevi-me. Ficava no Jabaquara. Ao chegar, cadastraram meu dedo indicador.

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    – Para quê?

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    – Na entrada e na saída das aulas, você confirma a digital. Para evitar fraudes.

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    Oh, céus! Teria de assistir às aulas! O curso começou. Minhas pestanas batiam mais que leque de chinesa, para ficar acordado. O professor explicou sua história. De origem indígena, saíra da tribo para estudar sociologia. Mais tarde, sua irmã e seu sobrinho morreram atropelados por um motorista imprudente. Dedicou-se então ao estudo do trânsito. Suspirei, pensando: “Nunca imaginei que alguém tivesse tal vocação!”.

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    A certa altura, ele perguntou:

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    – Alguém aqui nunca teve multas?

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    Duas senhoras ergueram as mãos. Dirigiam havia 25 anos. Eram do tipo que navega calmamente no asfalto, enquanto rôo as unhas atrás. Lembrei-me de dois amigos que se consideram melhores motoristas que eu. Ambos com a carta suspensa, por excesso de multas. Justamente, o professor falava da confraria dos que não acreditam em placas.

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    – As pessoas acham que podem negociar com o limite de velocidade – ele explicou. – Mas placa é placa.

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    Dias antes, um dos sem-carta andava furioso. Esbravejava:

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    – Levei a multa a 40! O limite era 30, mas alguém anda a 30?

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    Por que tantos de nós não costumam acreditar nas leis? Não conheço ninguém capaz de bater uma carteira. A maioria acha normal passar pelo vermelho ou entrar na contramão. Outro amigo costuma dirigir após uma dúzia de cervejas, com o argumento:

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    – Ooo aaalllcoooooooooooolll nãããooo meee afeeeta!

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    – Nesse caso, você deve ser estudado num laboratório! – respondo. – Pois está sendo contra tudo o que a ciência já descobriu sobre bebida e coordenação motora.

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    Muita gente, como eu, cresce com a impressão de que o trânsito é uma guerra, na qual quem anda devagar é perdedor. Correr, ultrapassar, dirigir com ferocidade é sinônimo de macheza. Para muitas mulheres, de auto-afirmação feminina.

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    Apesar do sono, dos resmungos e dos bocejos, gostei de ter feito o curso. Achava ser mais um espasmo burocrático para arrecadar dinheiro. Fiquei a favor. No mínimo, tomei consciência de que leis são leis. Não foram feitas para eu fingir que não existem.

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    Renovei a carta.

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    O único problema é que meus amigos criaram horror de carona comigo. Se a placa diz 30, ando a 30. Se não pode virar, não viro. E assim por diante. Aos seus olhos, é incompreensível. Quando um deles reclamou demais do meu estilo, reagi:

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    – Quero lembrar que eu tenho carta e você está suspenso.

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    – Isso não significa que você seja bom motorista! – retrucou.

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    – Não, de fato. Só significa que eu posso dirigir e você não.

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    Engatei a primeira e aumentei a velocidade para 40, como autorizava a placa, enquanto ele rugia ao meu lado.

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