Criador da KondZilla, Konrad Dantas segue o baile com expansão de negócios
Dono da gravadora de funk que virou o maior YouTube do país quer revolucionar ensino on-line, comédia e publicidade, e até lançar ações da empresa na bolsa
Na Olimpíada de Tóquio, a ginasta brasileira Rebeca Andrade fez apresentações com coreografia arrebatadora ao som de Baile de Favela, funk de MC João. A mesma música, em setembro de 2016, mudou a vida de outro jovem de periferia: Konrad Dantas, 32, nascido no Guarujá e dono da gravadora por trás daquele sucesso, a KondZilla.
O pancadão se tornou o primeiro clipe a atingir números estratosféricos no canal de YouTube do empresário, com 100 milhões de visualizações em um mês. Além disso, o hit levou Konrad a uma decisão que transformaria seus negócios. “Na entrevista com o MC João, a (apresentadora) Fátima Bernardes falou que a música teria ido ainda mais longe se não tivesse palavrão. Por isso, deixei de fazer clipes com palavrões, armas e meninas de lingerie”, ele diz. “Muitos disseram que eu iria afundar o funk. Mas nosso clipe seguinte, Deu Onda, foi o segundo vídeo mais visto do mundo na época — e nós decolamos.”
A estratégia ajudou a transformar a KondZilla no maior canal de YouTube do país — é no portal que a gravadora lança os clipes que produz para os funkeiros. Tem atualmente 64 milhões de seguidores (50% a mais que o segundo colocado, o humorista Whindersson Nunes) e chegou a ser terceiro maior canal do site no mundo, em 2018. Dos quatro vídeos brasileiros com mais de 1 bilhão de visualizações, dois foram feitos pelo selo. Selo, não: dez anos após sua fundação, a KondZilla é agora uma holding de entretenimento. Tem 100 funcionários e duas sedes no Tatuapé, onde mora o empresário. Agencia quarenta artistas, grava e publica clipes e outros vídeos, produz séries de streaming e cria campanhas para marcas que buscam atingir os jovens de periferia, como uma espécie de produtora publicitária especializada no segmento. Entre os clientes, tem empresas como Itaú, Ambev, Google, Vivo, Facebook e Redbull — a KondZilla fatura entre 100 000 e 3 milhões de reais por empreitada.
Uma ação recente para as Casas Bahia, na qual Konrad aproveitou para emplacar um funkeiro da gravadora, foi o vídeo mais visto do mundo no dia do lançamento, com 22,5 milhões de acessos. “Hoje, é difícil uma marca falar com jovens das classes C, D e E sem usar as empresas do Konrad ou da Anitta. A diferença é que ela é uma estrela e ele vive atrás das câmeras”, diz Renato Meirelles, fundador do Data Favela e do Instituto Locomotiva, especializados no nicho.
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Com números tão superlativos, Konrad ganhou a aura de midas dos negócios — aquele que transforma em ouro as aventuras nas quais lança as mãos. E, longe dos holofotes, ele agora investe em iniciativas que pretendem revolucionar segmentos como o ensino on-line, a comédia e a publicidade baseada em influenciadores digitais. Sonha até com um IPO (lançar ações da KondZilla na bolsa). “Estamos em due diligence (avaliando o valor da empresa). Do tamanho que as coisas ficaram, acho possível que aconteça”, diz.
A primeira investida autoral de Konrad fora de seu hábitat — a música — se deu em 2019, quando ele criou a série Sintonia, da Netflix. A história dos três jovens amigos da periferia paulistana foi a produção brasileira mais vista daquele ano no serviço de streaming. O sucesso fez se abrirem as portas desse mercado. A segunda temporada, recém-gravada, estreia ainda neste ano.
“O Konrad cuida para que os episódios tenham autenticidade na música, na religião e no crime, os principais universos da trama”, diz Haná Vaisman, diretora de séries de ficção brasileiras na Netflix. Em junho, a Kondzilla lançou outro seriado, na Globoplay, sobre a cantora Lexa. Ainda tem títulos em desenvolvimento para o YouTube Originals e o Multishow.
No início do ano, a marca de Konrad chegou à TV aberta, com o programa HERVolution, da Rede TV!, comandado por sua esposa, Alana Leguth. “O Kond sempre expande o próprio universo. A série que vamos lançar, por exemplo, não tem nada a ver com o funk (como Sintonia e Lexa)”, diz Renata Brandão, CEO da Conspiração Filmes, parceira em uma das novas produções — e onde Konrad trabalhou como diretor de vídeos publicitários, nos idos de 2016.
O próximo alvo é o segmento de educação. O empresário vai lançar, nos próximos meses, uma plataforma de ensino on-line que levará o nome da Kondzilla. Terá desde aulas sobre produção audiovisual e empreendedorismo até conteúdos tradicionais como matemática e inglês.
“Os modelos atuais de aprendizagem não conseguem competir com os celulares pela atenção dos jovens. Vamos usar uma linguagem e uma abordagem que eles gostem para aumentar a retenção das aulas”, diz Konrad. O projeto vai iniciar os testes de campo na próxima semana, com dezenas de alunos da ONG Gerando Falcões, de Edu Lyra.
Dois dos maiores grupos de ensino do país — cujos nomes ainda estão sob confidencialidade — se tornaram parceiros da iniciativa. “A princípio, será um produto voltado aos jovens da periferia. E ninguém sabe falar melhor com esse publico que o Konrad”, acredita Lyra, cuja ONG atua em mais de 1 000 favelas brasileiras. “A marca KondZilla se tornou algo aspiracional para essa juventude. Eles querem ser relevantes como o Konrad — e essa é uma das forças da empreitada”, ele avalia.
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Cada vez mais interessado no filão publicitário, Konrad também acaba de comprar participações societárias em startups que querem modernizar o mercado dos influenciadores digitais e da música comercial. Os investimentos aconteceram nos últimos dois meses. Uma dessas empresas é a Humanz, plataforma israelense que garimpa influenciadores na internet usando apenas inteligência artificial.
“A ferramenta varre as redes sociais utilizando robôs. Se você tem mais de 1 000 seguidores, ela pode indicá-lo para uma campanha”, diz Konrad. Fora do país, a startup já tem clientes como Visa, McDonald’s e Adidas. O outro investimento é na Strm (pronuncia-se “streaming”), que faz algo parecido no nicho musical. “Ela encontra talentos sem depender do fator humano”, ele diz. “Na viagem que fizemos à China, vi o Konrad dar ‘aulas’ de tecnologia em visitas a empresas do setor”, completa Ronaldo Lemos, advogado especializado em inovação.
“O ensino atual não retém a atenção do jovem. Traremos outra proposta”
Konrad Dantas
Os tentáculos da KondZilla também devem invadir o universo da comédia. Konrad negocia com uma série de humoristas que andam viralizando nas redes sociais para representá-los comercialmente. “Já estamos produzindo conteúdos com nomes como o Chapola e o Michel Elias”, ele diz. Os diferentes negócios formam uma teia que o empresário define como “modelo Disney”.
“As áreas da empresa se cruzam: uma funkeira vai fazer quadros de humor na internet, outro vai apresentar um programa na TV aberta, ou participar de uma campanha publicitária”, ele explica. “É o que faz a Disney — e me inspira.”
Foco mental e temperamento de empresário não faltam ao todo-poderoso midas do funk. No frio do inverno paulistano, Konrad tem acordado às 5h30 da manhã — inclusive nos fins de semana. Antes das reuniões diárias das 8 horas, ele se exercita na academia da luxuosa casa onde mora ou pedala na ciclovia da Marginal Pinheiros. Emagreceu 20 quilos nos últimos meses: chegou a pesar 96, agora tem 76. Não é só questão de estética ou saúde. “Vejo as entrevistas do Abilio Diniz e do Alê Birman (CEO da Arezzo e guru corporativo) e eles acordam nesse horário”, conclui.
UM SUCESSO EM QUATRO TEMPOS
A educação como herança
A mãe de Konrad, a professora Áurea Cunha, morreu em 2008 e deixou um seguro de vida de 110 000 reais para os dois filhos. Ele usou para os estudos
Início na música
A foto mostra Konrad em 2009, no apartamento do conjunto habitacional onde morava, no Guarujá, cidade em que nasceu. Nessa época, o futuro empresário começou a produzir clipes musicais.
Saída da caixa
Em 2019, a Kondzilla transcendeu de vez o universo musical e estreou, na Netflix, a série Sintonia. Konrad dirigiu os primeiros episódios (abaixo). A trama foi a produção brasileira mais vista daquele ano.
Honra internacional
Konrad integrou a lista dos 100 afrodescendentes mais influentes do mundo (o Mipad, na sigla em inglês), em 2019. Acima, ele recebe o reconhecimento na sede da ONU, apoiadora da iniciativa, em Nova York.
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Publicado em VEJA São Paulo de 04 de agosto de 2021, edição nº 2749