Corregedoria da PM investiga morte de adolescente em São José dos Campos

Segundo a denúncia, o autor dos disparos, um cabo da PM, teria mandado a mãe comprar um caixão para o filho dias antes do fato

Por Estadão Conteúdo
Atualizado em 14 fev 2020, 15h57 - Publicado em 26 set 2019, 09h58
Imagem mostra veículo da Polícia Militar, com o logotipo da coorporação
Viatura da Polícia Militar (Facebook/Polícia Militar/Reprodução)
Continua após publicidade

A Corregedoria da Polícia Militar do Estado de São Paulo investiga denúncia da mãe de um adolescente de 12 anos de que o filho foi morto com dois tiros durante uma ação policial, quando já havia se rendido, em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, interior do Estado. Segundo a denúncia, o autor dos disparos, um cabo da PM, teria mandado a mãe comprar um caixão para o filho dias antes do fato. A PM apresentou o caso como resistência seguida de morte, pois o menino estava em um carro roubado e teria apontado uma arma para os policiais. Os PMs foram afastados das ruas.

O cabo Thiago Santos Sudré, que atirou em Miguel, alegou ter agido em legítima defesa. O boletim de ocorrência cita “homicídio decorrente de intervenção policial, amparado em causa justificante, em relação ao policial militar”. De acordo com o registro, Miguel e outros três garotos teriam roubado um automóvel Fox Vermelho por volta das 18 horas. Localizado o veículo, os policiais iniciaram uma perseguição que terminou quando o condutor entrou com o carro num descampado onde havia um parque de diversões e bateu na grade do carrossel. Os garotos saíram com as mãos para cima e atenderam a ordem para se deitarem no chão. Miguel teria saído com uma arma em punho e foi alvejado por dois disparos, segundo o registro.

Outros três menores, um jovem de 17 anos que dirigia o veículo e dois adolescentes de 13 e 14 anos, foram detidos e encaminhados à Fundação Casa. A mãe alega que, avisada da morte, foi ao local e, quando um policial disse que Miguel tentou atirar neles, várias pessoas que estavam ali gritaram que era mentira. Segundo disseram a ela, seu filho não estava armado e desceu do banco de trás do veículo com as mãos levantadas, quanto tomou o primeiro tiro próximo à axila.

A mãe relata que, duas semanas antes, o cabo Thiago, conhecido na região como “Carioca”, foi à sua casa e disse para “comprar um caixão bem pequeno, porque se pegar seu filho na rua de novo o mataria”. Miguel era negro, franzino e tinha 1,33 m de altura. Ela conta que deixou o local e foi ao plantão policial perguntando quem tinha matado seu filho, quando se deparou com o cabo e gritou. “Parabéns, você conseguiu, estou indo comprar o caixão”. Segundo o relato, ele a chamou de louca e disse que o filho “não era boa coisa”, pois estava em um carro roubado. “Ele é uma sementinha do mal”, teria dito.

Procurado, o cabo não retornou os contatos feitos pela reportagem. O comando da PM de São José dos Campos informou que o garoto morto estava com um revólver calibre 32 nas mãos e escondia um simulacro de pistola sob o tapete do veículo. A dona do automóvel não reconheceu nenhum dos garotos como autores do roubo do veículo. A investigação teria apontado que os menores seriam receptadores do carro roubado.

Continua após a publicidade

Andréia, que é cuidadora de idosos e tem dois filhos mais velhos empregados em empresas do setor aeronáutico, disse que Miguel era dependente de drogas. O menino, estudante da Escola Estadual José Frederico Marques, começou a fumar maconha com dez anos e foi “recrutado” pelo tráfico como “aviãozinho” – vendedor de drogas em “biqueiras”. A mãe conta que o internou durante 27 dias em uma clínica de recuperação e procurou ajuda de um serviço ambulatorial para tratamento de dependência química de adolescentes, mas não adiantou.

Depois de ter se rebelado contra a ação policial, Andréia passou a receber ameaças e, no dia 15, à noite, teve seu apartamento invadido. A porta foi arrombada e os armários revirados. Numa parede, foi gravado com objeto pontudo os nomes dos seus filhos – o de Miguel aparece cruzado com um risco. Os familiares passaram a serem alvos de ataques em redes sociais. A família se viu obrigada a mudar do bairro.

No último dia 18, Andréia fez denúncia formal à Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo, que abriu procedimento para apurar a ação do PM. Atendendo pedido do ouvidor Benedito Domingos Mariano, a corregedoria geral da PM instaurou investigação. “Estive em São José e obtive mais detalhes do caso. Solicitei da Polícia Técnica laudos do local, exames de balística das armas e laudo necroscópico. Assim que receber, terei condições de fazer um relatório preliminar para anexar à investigação”, disse Mariano.

Continua após a publicidade

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública do Estado informou que todas as circunstâncias relativas aos fatos são apuradas pelo 3º DP de São José dos Campos e pela Polícia Militar por meio de IPM (Inquérito Policial Militar), que é acompanhado pela corregedoria da corporação. “As armas dos policiais foram encaminhadas para perícia, assim como o revólver calibre 32 e um simulacro utilizado pelos suspeitos. Os envolvidos seguem afastados da atividade operacional, cumprindo expediente administrativo, enquanto durarem as investigações”, disse a pasta.

Dados da Ouvidoria mostram que 432 pessoas foram mortas por policiais em serviço ou fora dele, no primeiro semestre deste ano, no Estado de São Paulo. O aumento geral foi de 2,5%, mas se consideradas apenas as mortes por policiais em serviço, o aumento é de 11,5%. As mortes por policiais, segundo Mariano, já representam 24% de todos os homicídios dolosos no Estado, porcentual que sobe para 34% na capital.

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja SP* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de São Paulo

a partir de 35,60/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.