Câmeras para vigiar estudantes começam a proliferar nos colégios
Medida gerou protesto no Rio Branco, uma das mais tradicionais escolas de São Paulo
Um dos colégios mais tradicionais da capital, o Rio Branco, no bairro de Higienópolis, enfrentou no mês passado um protesto surpreendente de uma parte de seus alunos do 3º anodo ensino médio. Depois do intervalo da manhã, 107 deles decidiram não retornar à classe, como forma de criticara instalação de dezoito câmeras nas salas de aula. Seu protesto estendeu-se por aproximadamente duas horas. Os estudantes reclamaram que não haviam sido avisados a respeito da criação do novo sistema de monitoramento. “Achei que foi uma coisa escondida, antidemocrática”,afirma Mariana Rici, de 17 anos, uma das manifestantes. Todos os envolvidos levaram gancho de um dia devido à revolta. Hoje, os responsáveis pela administração do Rio Branco fazem um mea-culpa do episódio. “O investimento nesse tipo de tecnologia é parte de um projeto que vem sendo implementado por aqui há quatro anos”,explica a diretora-geral, Esther de Carvalho.“Já existem câmeras nos laboratórios e nas salas de informática.Não teríamos tido esse problema e desgaste se tivéssemos avisado com antecedência os pais e alunos sobre a nova etapa.” O Rio Branco pretende seguir firme nessa política.Até o fim do ano, o sistema de vigilância tecnológica deverá ser reforçado com a chegada de mais quarenta câmeras. A filial do colégio na Granja Viana também receberá aparelhos no próximo ano.
Na capital, pelo menos outras três instituições de ensino vêm realizando investimento semelhante. Vizinho do Rio Branco, o Nossa Senhora de Sion instalou em fevereiro oito câmeras nas salas do ensino médio. “O motivo principal foi tentar inibir a depredação de nossos materiais”, conta Andreza Licastro, coordenadora de relacionamento institucional do Sion. Pioneiro na cidade em iniciativas do tipo, o colégio Graphein, em Perdizes, começou tirar seu programa do papel em 2006.Atualmente, dispõe de uma infraestrutura com 32 monitores. Vinte deles cobrem áreas externas, como o pátio. O restante dos equipamentos está espalhado pelas salas do ensino fundamental e médio. As cenas podem ser conferidas numa central que fica dentro da escola. “Muitas vezes, os próprios estudantes recorrem às imagens gravadas quando perdem algum objeto”, diz a diretora Nívea Fabrício. A aluna Gabriela Mandim, de 17 anos, aprova a medida. “Acho útil para produzir provas que possam evitar alguma injustiça,como no caso de uma briga, por exemplo”,considera ela.
Nem todas as escolas paulistanas tratam o assunto com a mesma naturalidade.Uma das funcionárias do setor de matrículas do Colégio Porto União,no Butantã, confirmou na semana passada que há ali a mesma tecnologia de monitoramento. Procurados por VEJA SÃO PAULO, os responsáveis pela escola não quiseram dar declarações sobre o assunto. A postura do Porto União mostra como o tema é visto com reservas devido à polêmica que costuma despertar. Muitos estudantes ainda se incomodam com o problema da perda de privacidade. “Os conflitos em sala de aula devem ser resolvidos pelo professor, em conversas com os alunos, e não com a direção envolvida no assunto, olhando o que se passa nas câmeras”, afirma Allan Jachimowicz, de 12 anos, matriculado no ensino fundamental do Rio Branco. “No dia a dia, os garotos filmam, fotografam e postam na internet situações deles próprios e dos amigos. Nesses casos,por que não ficam incomodados com a perda de privacidade?”, contrapõe a diretora Esther de Carvalho. “Como educadores, nós não estamos aqui para fazer o que eles desejam, mas aquilo de que eles precisam.”Os especialistas se dividem quanto a essas questões. Neide Noffs, professorada Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP),acredita que o monitoramento é útil para garantir a segurança de alunos e professores no ambiente escolar.“Dentro da sala de aula, porém, só usaria o recurso em último caso e com a concordância de todas as partes envolvidas”,diz. Segundo ela, a escola é o espaço onde os jovens precisam despertar para valores como solidariedade,respeito e parceria. “O melhor caminho para atingir esse objetivo ainda é o diálogo,e não a tecnologia”, afirma.
OLHO VIVO
Algumas das escolas que investiram na tecnologia de monitoramento
Rio Branco (Higienópolis)
Quando começou: setembro
Total de câmeras: dezoito
Salas: ensino médio
Nossa Senhora de Sion (Higienópolis)
Quando começou: fevereiro
Total de câmeras: oito
Salas: ensino médio
Graphein (Perdizes)
Quando começou: 2006
Total de câmeras: doze
Salas: ensino fundamental e médio