Quem é e o que pensa Bruno Covas, o próximo prefeito de São Paulo
Ele diz que não haverá recursos para melhorar a zeladoria da cidade sem a reforma da Previdência municipal e que não manterá o estilo workaholic de Doria
O segundo homem na hierarquia da cidade costuma passar despercebido quando troca o carro pelo metrô. Ao menos uma vez por semana o percurso de casa, na Barra Funda, ao trabalho, no Viaduto do Chá, é feito pela Linha 3 – Vermelha, uma das mais movimentadas da metrópole. No trajeto de pouco mais de vinte minutos, o homem de 1,84 metro e 84 quilos dificilmente é reconhecido pelos demais passageiros. O mesmo ocorre em locais desconexos com o mundo político, como bares e restaurantes.
Essa vida “invisível” aos olhos da população está com os dias contados. Com a iminente renúncia do prefeito João Doria, que vai concorrer nas eleições estaduais de outubro, Bruno Covas Lopes, de 37 anos (fará 38 no dia da posse, 7 de abril), vai herdar o comando da capital paulista.
O homem responsável por gerir um orçamento de 56 bilhões de reais é muito diferente do político pálido, gordinho e de cabelos bagunçados que participou há quase dois anos da campanha vitoriosa do PSDB em São Paulo. Até o ano passado, Covas pesava mais de 100 quilos, usava terno e gravata e reclamava da falta de disposição.
Por indicação de Doria (“coloquei o Bruno num spa forçado”, costuma dizer o prefeito), o neto do ex-governador Mário Covas é hoje outro homem. Perdeu 20% do peso e só usa camisa para fora da calça jeans e sapatênis. O que não mudou foi seu gosto por rock. Ouve desde a adolescência Metallica, Black Sabbath, Nirvana e Pearl Jam.
Acorda antes das 6 da manhã, toma um preparado de chá-verde, própolis, limão e glutamina. Na volta da academia, localizada nos Jardins, onde faz musculação cinco vezes por semana, ingere dois ovos mexidos, dez castanhas e quinze amêndoas. O almoço é composto de uma proteína e salada à vontade. O jantar é leve e sem carboidrato.
Enquanto mudava radicalmente de estilo, Bruno Covas, divorciado há quatro anos, passou a curtir mais a vida. Sete meses depois da posse, viajou de férias com três amigos para a Croácia, onde ficou por treze dias. Entre praias, piscinas e muita agitação no verão europeu, resolveu raspar a cabeça e deixar a barba crescer. A transformação no visual rendeu-lhe comentários no Instagram. “Todo trabalhado na morenice!”, escreveu uma seguidora.
Apesar dos elogios, os périplos mundo afora ocasionaram críticas à falta de dedicação. Durante uma esticada de duas semanas em Paris (dessa vez de forma oficial, apesar de ter participado de apenas dois eventos), em outubro, seu adjunto na pasta das regionais, Fábio Lepique, foi demitido por Doria. Na época, o descontentamento da população com a zeladoria arranhava a popularidade do prefeito, que foi eleito após dizer que a cidade parecia um “lixo vivo”.
Insatisfeito com a decisão que culminou com a demissão de seu aliado, Covas viu-se na mesma situação pouco depois. De acordo com o que antecipou VEJA SÃO PAULO na ocasião, Doria o tirou das regionais e pôs em seu lugar o advogado Cláudio Carvalho, ex-diretor da construtora Cyrela e tido como um “tocador de obras”. O vice nega que tenha havido rusgas com o chefe e credita o desgaste à falta de dinheiro na pasta (veja entrevista abaixo).
A mudança levou Covas à recém-criada Casa Civil. Sem os holofotes diários no cargo nas regionais, ele passou a se dedicar mais à relação com a Câmara Municipal, cujos vereadores reclamavam da pouca atenção de Julio Semeghini, da Secretaria de Governo, então responsável pela interlocução. “Ele prometia empenho por nossas demandas, mas não cumpria”, diz um parlamentar que pediu para não ser identificado.
Como a praia de Covas é mais a política que o posto de “gestor”, a mudança foi bem-aceita por ele e pela base governista. “O Julio estava sobrecarregado e a mudança foi ótima. Entendo as angústias que os vereadores vivem”, afirma Covas.
Formado em direito pela USP e em economia pela PUC, o futuro administrador da cidade não usará o bordão “Não sou político, sou gestor”, de Doria. “Eu me orgulho de ser político”, diz. Neto mais velho de Mário Covas, que foi prefeito, governador e senador, Bruno levava para a escola bexigas com o nome do avô durante a campanha vitoriosa para o Senado, em 1986.
Dois anos depois, percorreu, de mãos dadas com a mãe, Renata, as casas vizinhas em Aparecida, bairro de Santos, onde nasceu, para colher assinaturas visando à criação do PSDB. Em 1995, trocou a Baixada Santista pelo Palácio dos Bandeirantes, e passou a conviver diariamente com o avô até sua morte, em 2001. A entrada oficial na vida pública ocorreu em 2004, quando concorreu ao cargo de vice-prefeito em sua cidade natal. A empreitada não deu certo, mas, após deixar o último dos três estágios em escritórios de advocacia, abraçou a carreira política.
No ano seguinte, ingressou como assistente parlamentar no gabinete da liderança tucana na Assembleia Legislativa. Em 2006, foi eleito deputado estadual, com 122 000 votos. Na eleição seguinte, sua votação dobrou, e ele ficou em primeiro no ranking do estado. Em 2011, em uma entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, na condição de secretário estadual do Meio Ambiente, Covas disse ter recebido oferta de propina vinda de um prefeito.
Embora afirmasse que não aceitara a quantia de 5 000 reais, o fato de não ter denunciado a tentativa de suborno o tirou da corrida pela prefeitura paulistana. Ele discorda: “Saí da disputa para abrir caminho para o José Serra”. Dois anos depois, Covas foi eleito deputado federal.
A experiência no Legislativo e o traquejo político credenciam o futuro prefeito, mas pouco se sabe de projetos ambiciosos ou de sua capacidade executiva. Questionado sobre a sempre prometida renovação do centro, diz que faltam recursos. Como prioridade no cargo, elege a habitação, mas não se estende sobre os problemas da área.
Como ainda restam duas semanas para assumir a vaga, ele teria tempo para pensar mais sobre os desafios que viverá, mas vai aproveitar o período
para uma nova viagem de férias. Embarcou para Miami na terça (20), o mesmo dia em que a cidade ficou alagada após chuva forte. Três pessoas morreram e mais de sessenta árvores caíram. Na volta, Covas vai esticar o feriado de Páscoa em Santos, ao lado dos pais e do filho Tomás, de 12 anos. “Não levarei nem celular, vou me desligar do mundo”, promete.
Após sete meses no cargo, Doria já não escondia aos aliados sua frustração com a lentidão e a burocracia da prefeitura nem a vontade de deixar o cargo quanto antes. Covas diz que está preparado. “Não estou chegando de outro lugar, já vi como é.”
A BOLA DA VEZ
O que pensa o próximo prefeito de São Paulo
João Doria costuma dizer que não é político, mas um gestor. Isso também vale para o senhor?
Dá para ser as duas coisas. Sou um político, sim, e me orgulho disso. Nas férias escolares, eu passava os dias com meu avô, em Brasília.
À frente da Secretaria das Prefeituras Regionais, sua atuação foi criticada a ponto de o atual prefeito tirá-lo da pasta. O que faltou?
Faltou dinheiro para tocar a secretaria. No último ano da gestão Kassab, as regionais tinham um orçamento anual de 1,3 bilhão de reais, em valores atualizados. Em 2017, foram 350 milhões de reais. Eram oito equipes de manutenção de logradouros no centro em 2012. Para cobrir o déficit da Previdência, sobra menos. Vai reduzindo, reduzindo, até chegar a uma equipe hoje.
O senhor emagreceu, separou-se, viajou bastante no ano passado. Até aliados diziam que estava “curtindo a vida adoidado”.
Tenho 37 anos e vivo como uma pessoa dessa idade. Mas, se até agora eu levava uma vida de solteiro, a partir de 7 de abril vou ser um homem casado com a cidade de São Paulo. Serão vidas distintas.
João Doria chamou o ex-governador Alberto Goldman de fracassado. Agora está às turras com José Aníbal. Como será sua relação com o PSDB e seus antigos caciques?
O partido está em ebulição. Saímos da eleição de 2016 como a legenda mais vitoriosa do país e fechamos o ano passado com a mesma rejeição do PT. Meu perfil é agregar, ciscar para dentro. Conheço todos (os caciques) desde que nasci. Mas é claro que há uma mudança de geração no comando do partido. Isso é inegável.
A reforma da Previdência municipal passará na Câmara?
Tem de passar. Em 2017, o déficit foi de 4,7 bilhões de reais. Neste ano será de 5,8 bilhões de reais. De cada 10 reais que a população paga de IPTU, 9 vão para cobrir as aposentadorias do funcionalismo. Não dá mais para ficar como está.
A relação da prefeitura com o Tribunal de Contas do Município não andava bem e piorou depois que o vereador Milton Leite defendeu a extinção do órgão.
A cidade perde com esse conflito. Cada um tem seu papel. Não há nenhuma necessidade de reclamar dos procedimentos. Se acaba aqui, vai para o Tribunal estadual. Se uma proposta de extinção tramitar na Câmara, vou falar para a base do governo votar contra.
O modelo de concessão dos parques municipais é viável? Existe a possibilidade de alterações, caso não haja atratividade nos chamados “combos”?
O primeiro combo, do Ibirapuera com outros cinco locais de menor visibilidade, é viável. Lá na frente vamos verificar os outros parques. Se o modelo se exaurir, buscaremos novas formas de negócio.
Como fugir das comparações entre o senhor e Doria?
Uma vez ele me ligou às 11 da noite e ficou meia hora na linha. No outro dia, às 6h30, ligou de novo perguntando que providências eu havia tomado (risos). Esse é o estilo dele, não o meu.
Está ansioso para assumir a prefeitura?
É claro! Já viu criança quando vai para a Disney pela primeira vez? Estou igual.
PROGRAMA DE MILHAGEM
Em 2017, Bruno Covas ficou 46 dias ausente
Chile
De 23 a 26 de abril. Motivo: workshop sobre meio ambiente.
Inglaterra
De 9 a 17 de maio. Motivo: evento sobre mobilidade em Londres.
Croácia
De 26 de julho a 7 de agosto. Motivo: férias.
Estados Unidos
De 15 a 20 de setembro. Motivo: encontro de prefeitos.
França
De 12 a 25 de outubro. Motivo: um fórum e um encontro político.