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Bons tempos

Bel, quase 6 anos, passeia pelo shopping enfeitado com as cores e agitado pelos sons do Natal. Entronado em um cadeirão, um Papai Noel posa para fotos com as crianças. — Vô, você tem foto com Papai Noel, de quando era criança? — Não, não tenho. — Por quê? — Ah, não tenho. Avô não […]

Por Ivan Angelo
Atualizado em 5 dez 2016, 19h02 - Publicado em 16 dez 2009, 16h05
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  • Bel, quase 6 anos, passeia pelo shopping enfeitado com as cores e agitado pelos sons do Natal. Entronado em um cadeirão, um Papai Noel posa para fotos com as crianças.

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    — Vô, você tem foto com Papai Noel, de quando era criança?

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    — Não, não tenho.

    — Por quê?

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    — Ah, não tenho. Avô não tem isso. Pergunta se algum avô das suas amiguinhas tem foto com Papai Noel. Não tem.

    — Não tinha Papai Noel?

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    — Ter, tinha. Mas a gente não via.

    — Nem no shopping?

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    — Não tinha shopping.

    — Não tinha shopping?!

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    — Não.

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    — Você está mentindo, vô. E onde que comprava, então?

    — Tinha loja na rua, tinha rua só de lojas e tinha loja que vendia de tudo.

    — Tudo?

    — O que você quisesse.

    — Não via Papai Noel nem na televisão?

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    — Não tinha televisão.

    — Ah, vô, brincadeira.

    — Verdade. Ainda não tinham inventado a televisão.

    — E o que você fazia depois da escola, então?

    — Brincava. Jogava bola. Bolinha de vidro. Pique. Batia figurinha. Pulava corda.

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    — No playground?

    — Não tinha playground.

    — Não tinha nada, vô! Brincava onde?

    — Na rua. Prédio não tinha playground. Brincava na rua mesmo. O playground era a cabeça da gente. Quase todo mundo morava em casas. Onde não tinha prédios de apartamentos, também não tinha carro.

    — Minha mãe não me deixa brincar na rua. Nem sair do portão pode, que é perigoso, passa carro, tem ladrão.

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    — Isso mesmo. E faça o favor de obedecer, viu? Quase não passava carro na nossa rua. Ninguém que a gente conhecia tinha carro.

    — E como que ia pra escola, como que ia trabalhar, passear…

    — De bonde. Já te expliquei o que era o bonde. De ônibus.

    — De metrô…

    — Não, metrô não tinha.

    — Vô, eu tou achando que esse seu tempo não era muito bom não.

    — Era, era bom sim. Nem ladrão aparecia, o portão ficava aberto.

    — Ah.

    — Verdade, Bel. Tinha ladrão, mas a gente não via, igual não via Papai Noel.

    — E se chovia? Não podia brincar na rua.

    — Aí ficava em casa.

    — Fazendo o quê?

    — O mesmo que você. Jogos. Via revistinha, livro. Ouvia histórias. Desenhava. Brincava de bonecas…

    — …da Disney… Barbie… Hello Kitty…

    — Não, isso não tinha.

    — Não tinha a Hello?!

    — Assim você me deixa arrasado, Bel. Não tinha a Hello, pronto.

    — E Papai Noel? Tinha o de verdade e o de mentira?

    — Como assim?

    — Esse Papai Noel que a gente vê no shopping é de mentira. O que a gente não vê é que é de verdade.

    — Se não vê, como sabe que é de verdade?

    — Porque eu ganho presente no Natal, ué. No meu aniversário, é o meu pai e a minha mãe que me dão presente. No Natal, é o Papai Noel que dá.

    — Ah, bom.

    — Mas a minha madrinha também dá, e meu outro vô, você, minhas duas vovós, minhas tias, meus tios… Eu ganho um monte de presentes. Um monte! E você, ganhava quantos?

    — Um, unzinho só. Do Papai Noel.

    — Ó, vô, acho que eu não ia gostar do seu tempo não.

    — É, acho que não. A gente só gosta do tempo da gente.

     

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