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Os trechos inéditos da biografia de Roger Abdelmassih

'Tudo Por Um Monstro', que será lançado na quinta (23), revela detalhes nunca divulgados sobre a vida do ex-médico, como os dias na prisão, o medo da morte

Por Ana Carolina Soares
Atualizado em 20 Maio 2019, 20h27 - Publicado em 20 Maio 2019, 15h36

O livro Tudo por um Monstro, da jornalista Angela Tucker, que trabalhou durante vinte anos como assessora de imprensa do ex-médico Roger Abdelmassih, terá lançamento on-line nesta quinta (23).

Abdelmassih era referência em fertilização in vitro, amigo de celebridades como Pelé e Roberto Carlos, e mundialmente reconhecido. Em 2008, uma sequência de denúncias descortinou a suja realidade do que acontecia na clínica do médico, na Avenida Brasil, nos Jardins. Em 2009, o especialista em reprodução humana foi condenado a cerca de 100 anos de prisão por estuprar mais de trinta mulheres. Desde 2017, por causa de sua saúde, ele cumpre sua sentença em prisão domiciliar.

O título é uma ironia e faz referência ao primeiro livro de Abdelmassih, Tudo por um Bebê, que explicava como a ciência da reprodução poderia ajudar casais inférteis. A intenção da obra de Angela é mostrar a versão de Abdelmassih para o escândalo, com informações até então desconhecidas do público. “Não quis entrevistar todas as vítimas nem conversei com ele sobre o processo de estupro, porque tudo está nos processos e foi amplamente divulgado pela imprensa”, diz Angela.

A jornalista entrevistou ex-funcionários e médicos que passaram pela clínica de Abdelmassih, amigas das vítimas famosas, além de ter tido acesso a documentos judiciais. Ela também obteve um manuscrito, ditado por Abdelmassih a Ramiro Augusto, um ex-companheiro de cela em Tremembé.

Manuscrito de Abdelmassih (Divulgação/Veja SP)

No ano passado, Angela também teve cerca de dez encontros com o ex-médico no apartamento dele, nos Jardins, onde está em prisão domiciliar. “Ele está extremamente debilitado”, conta. Em um dos capítulos, Abdelmassih descreve sobre o medo da morte. “Serei criticada antes mesmo de ser lida, mas sei também que muita gente espera para ouvir o outro lado dessa história”, conta.

A autora Angela Tucker (Divulgação/Veja SP)

O livro custa entre 59 e 30 reais e pode ser adquirido aqui.

A seguir, alguns trechos do livro:

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A ex-namorada que o acusou de estupro 

A defesa de Roger levou testemunhas que acompanharam o caso Luciana e anexou ao processo alguns dos bilhetes, as fotos sorridentes quando grávida, fotos dos trigêmeos e até o convite para a apresentação de ballet da filha mais velha. Quase três anos depois do(s) estupro(s), Luciana ainda mandava notícias dela e das crianças, pedia desculpas a Roger, reclamava educadamente por não ter a atenção do médico e levava presentes. Quando a juíza lhe perguntou sobre a autoria dessas cartas e dos bilhetes, ela ficou chocada, tentou negar, começou a chorar e disse: ‘é porque eu fui vítima de estupro e eu queria chamar a atenção dele para que ele me pedisse desculpas’.

O bigode raspado no primeiro dia na penitenciária

No primeiro dia de penitenciária, ocorreu uma outra difícil separação para Roger. Vestindo seu uniforme, foi fotografado, identificado, e recebeu uma notícia inesperada e doída: seu bigode, companheiro desde a juventude, seria raspado. Ele tentou argumentar, implorou que não fizessem aquilo, mas a própria diretora do presídio veio lhe explicar, de forma muito atenciosa, que os detentos teriam que estar barbeados e sem bigode. Foi uma separação definitiva, até o fechamento deste livro, Roger não usou mais a marca registrada de todas as suas caricaturas e personagem descrito em vários depoimentos de abusos.

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Os companheiros de pavilhão deram a ele as instruções sobre os horários de alimentação, saídas para banhos de sol e demais procedimentos da rotina carcerária. As visitas aconteciam nos finais de semana, mas Larissa podia visitá-lo com frequência, pelo fato de ser advogada. O farnel de frutas, bolos e biscoitos, que a companheira lhe trazia, era dividido com outros presos e funcionários. Acordar cedo, fazer exercícios leves, ler muito, assistir televisão, conversar com os companheiros de cela, praticar os ritos da religião católica e estudar a Bíblia sob o entendimento de companheiros evangélicos passou a ser a rotina de Roger na prisão.

Os presos procuravam por ele para pedir uma opinião e orientação médica, Roger conseguiu, por meio de malabarismos de comunicação, que um famoso geneticista brasileiro, com quem ele havia trabalhado, desse assistência para a filha de um dos carcereiros, que sofria de uma séria desordem genética. Na prisão, Abdelmassih pôde exercer um tipo de caridade diferente, doando seu conhecimento, assistindo e confortando pessoas, ao invés das gordas contribuições monetárias que fazia a igrejas e associações de combate ao câncer, entre outros beneficiários, todos os meses.

Roger escreve em seu manuscrito ‘Minhas Outras Vidas’ que a estada na prisão contribuiu de forma definitiva para o seu crescimento espiritual, que teve tempo para refletir sobre suas atitudes de soberba e arrogância, que ele considera a essência de sua derrocada. “Eu realmente acreditava que estava acima de tudo e de todos – até que a vida, ele diz Deus, lhe mostrou que as coisas não eram bem assim”.

A vida na prisão domiciliar (trecho de um manuscrito de Roger Abdelmassih)

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Eu me refiro ao presídio como “aquele lugar”, não gosto de pensar nisso. A pior parte de estar naquele lugar era acordar – quando conseguia dormir – e pensar nos motivos para eu estar lá. No tamanho da injustiça, na desproporção do castigo, nos motivos dessa gente, no tamanho do ódio que têm contra mim, de saber que me consideram um ser monstruoso. Eu não fui um santo, mas não sou isso que dizem, meu Deus, eu não sou. Não dá para não ficar deprimido e doente quando você carrega sentimentos desse tipo, é uma dor constante, pesada, sem remédio.

E por incrível que pareça tenho muitas pessoas que conheci lá na memória do meu coração, homens que me marcaram, a quem agradeço pela generosidade, pela atenção que tiveram comigo. Conheci pessoas que me conduziram no caminho da espiritualidade, que me ajudaram muito e que sempre terão meu carinho e meu respeito.

É meio absurdo, mas todos os dias agradeço a Deus pela doença que vai me matando, mas que me possibilita estar fora daquele lugar. Não que isto seja um paraíso, eu ainda sou um prisioneiro, esta é domiciliar, mas é uma prisão. Eu não saio na varanda do apartamento, nem no hall do elevador, as pessoas podem me ver, prefiro evitar confusão. Desde que saí daquele lugar não tomo sol.

O medo da morte (trecho de um manuscrito de Roger Abdelmassih)

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A rigor, ninguém quer morrer. Mas eu te digo – se eu não tivesse a mulher que tenho e as minhas crianças talvez eu quisesse morrer, não teria razão para viver. No entanto, apareceu uma deficiência cardíaca severa, meu ventrículo esquerdo está completamente podre, estou sendo levado com remédios, 22 por dia agora. Sempre exerci a medicina com praticidade e é assim que vejo o meu amanhã – eu sei que mais dois ou três anos, no máximo, tchau!

Eu nunca fui um santo, errei muito, mas não cometi essas loucuras horrorosas pelas quais a imprensa e a justiça me condenaram, acatando o depoimento de algumas mulheres sem contestação, sem investigação das causas que realmente as fizeram chegar onde chegaram, sem levar em consideração as testemunhas que nunca observaram qualquer violência, as circunstâncias da rotina da clínica e o espaço físico, as portas abertas, nada.

Eu acho que chegou um momento da minha vida em que Deus falou: “Chega! Você está demais, você está muito prepotente e mandou esse castigo que eu vivo há mais de 10 anos. Eu não blasfemo, eu agradeço a Deus, porque eu me aprofundei na parte espiritual. Hoje eu sei que sou um ser mais humano, voltado para o meu amanhã junto de Deus, por isso não temo a morte.

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