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Por Arnaldo Lorençato
O editor-sênior Arnaldo Lorençato é crítico de restaurantes há mais de 30 anos. De 1992 para cá, fez mais de 16 000 avaliações. Também é autor do Cozinha do Lorençato, um podcast de gastronomia, e do Lorençato em Casa, programa de receitas em vídeo. O jornalista é professor-doutor e leciona na Universidade Presbiteriana Mackenzie
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Morre o chef e apresentador Anthony Bourdain

Notícia causa comoção não só no mundo da gastronomia, mas também entre o milhares de fãs que ele conquistou

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Atualizado em 15 jun 2018, 11h51 - Publicado em 8 jun 2018, 10h28

A rede americana CNN acaba de anunciar a morte de Anthony Bourdain. De acordo com a emissora, ele cometeu suicídio. Notícia triste que causa comoção não só no mundo da gastronomia, como também entre os milhares de fãs que o chef conquistou não como cozinheiro, mas como apresentador de TV.

Bourdain, de 61 anos, estava na cidade  francesa de Estrasburgo gravando um episódio da nova temporada de Parts Unkown, série na qual apresentava diferentes culturas culinárias e cinco vezes premiada com o Emmy, o Oscar da TV americana.

Multitalentoso, Bourdain, filho de um nova-iorquino de família francesa, comandava um bristrô até então sem expressão em Nova York, a Brasserie Les Halles. Ele viu a sorte mudar e ingressar no mundo das celebridades ao publicar um artigo para a revista New Yorker em 1999.

O texto agudo e intitulado “Don’t Eat Before Reading This” trazia uma visão ferina e agudíssima sobre os bastidores dos restaurantes da capital americana da gastronomia. Causou o maior reboliço porque muita gente se identificou com aquelas histórias e os clientes tornaram-se mais atentos, em especial com o peixe servido às segundas, que ele dizia ser podre.

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Não tardou para que, no ano seguinte, o texto, muito bem escrito e espichado, se tornasse um livro, ou melhor, o bestseller Cozinha Confidencial, uma colagem de histórias cheias de testosterona. Sem pudor, revelava um mundo pontuado por muita tensão, temperado por bebida, drogas e cenas de sexo. Um mix apimentado e polêmico.

Foi também a senha para que Bourdain ingressasse na TV paga, primeiro com A Cook’s Tour, livro que se tornou o seriado exibido pelo canal Food Network. Migrou depois para o Travel Channel, com No Reservations, ou Sem Reservas, título de outro livro, que garfou dois prêmios Emmy, assim como mais de uma dezena de indicações.

A carreira de escritor, roteirista e apresentador o levou para a CNN em 2013, onde comandou Parts Unknown, que estava na temporada número 11.

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Seu corpo foi encontrado pelo colega Eric Ripert, do restaurante Le Bernardin, um dos mais badalados de Nova York, nessa manhã em que teriam uma gravação. Ele se enforcou.

Um dos livros que mais gosto dele é Anthony Bourdain – Afinal, as Receitas do Les Halles – Nova York, publicado pela Melhoramentos. Reúne receitas clássicas francesas testadas e organizadas com tanta generosidade que até quem nunca encarou o fogão vai cozinhar. E, possivelmente, bem.

Conversei com Bourdain rapidamente em 2003, quando aqui esteve para lançar Em Busca do Prato Perfeito. Na época, na VEJA SÃO PAULO ele foi tema de uma ótima matéria que você lê abaixo.

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Bourdain viveu intensamente. E assim partiu nesta sexta. RIP.

 

Anthony Bourdain: “My God! Que pastel! Que empadinha!”

O badalado chef e escritor nova-iorquino Anthony Bourdain fica extasiado com os comes e bebes paulistanos

Bastou uma só mordida. Assim que sentiu o suculento recheio de bacalhau escorrendo do pastel, ele deu o veredicto: “Delicious!”. Sentado displicentemente no balcão do Hocca Bar, no Mercado Municipal, o nova-iorquino Anthony Bourdain foge da pose que poderia ter um dos chefs mais badalados dos Estados Unidos. Calça jeans larga, camiseta amassada e brinco de argola na orelha esquerda, o cozinheiro não disfarça a satisfação em estar ali. “Sou um cara muito sortudo”, diz, enquanto dá outra dentada no quitute que faz a fama do modesto boteco há 51 anos. “Trabalho com o que mais amo na vida, a comida, e ainda viajo o mundo conhecendo receitas maravilhosas.” Bourdain não está exagerando. Desde que se tornou uma espécie de guru da gastronomia, ao lançar em 2000 o best-seller Cozinha Confidencial, um ácido e bem-humorado relato do que se passa nos bastidores dos restaurantes, ele ganhou notoriedade suficiente para rodar o planeta dando palestras.

E, claro, provando tudo o que aparece na sua frente. De coração de cobra viva a iguana malpassado, em países como Vietnã, Rússia, México e Camboja. Antes de virar escritor, ele fizera sucesso no comando de vários restaurantes de Nova York e atualmente é chef do bistrô Les Halles.

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Em uma rápida viagem a São Paulo para divulgar seu novo livro, Em Busca do Prato Perfeito (Companhia das Letras; 346 páginas; 41 reais), e participar de eventos na Universidade Anhembi Morumbi e no Boa Mesa, encerrado no último domingo (21), Bourdain aproveitou para experimentar algumas famosas comidinhas da capital. Como fez quando preparou a recém-lançada obra, em que percorre lugares distantes à procura de surpresas gustativas, o chef despiu-se de qualquer tipo de preconceito, frescura ou exigência em suas andanças pela cidade. Deleitou-se com o bauru do Ponto Chic, babou no sanduíche de mortadela do Bar do Mané, lambeu os beiços no Rancho da Empada, surpreendeu-se com nossa tapioca. Não deixou, obviamente, de visitar endereços estrelados como o D.O.M. e Jun Sakamoto, onde comeu cogumelos marinados com foie gras e sushis exóticos. Mas, segundo o próprio Bourdain, “a melhor refeição do mundo, a perfeita, raramente é sofisticada ou cara”.

“Esse sanduíche de mortadela, por exemplo, contém tradição, história. Por isso é tão gostoso”, filosofa, encostado numa cadeira do Bar do Mané, no Mercadão. “As grandes criações gastronômicas surgiram da necessidade, porque os homens precisavam conservar os alimentos. Salgaram o peixe, descobrindo o bacalhau, que hoje recheia esse pastel tão gostoso”, arremata, pedindo outro copo de cerveja, sem ligar se ainda são 9h30 da manhã. Ao fim de cada boquinha, acende um cigarro atrás do outro. Num dia, chega a fumar quarenta. “Quase todo chef fuma, mas muitos mentem que não”, entrega. “É uma profissão estressante demais. Fora que tenho tendência ao vício, principalmente os orais, como a comida”, afirma. Aos 47 anos, conservando o estilo mais para lenda do rock do que para superstar das panelas, Bourdain não perde o rebolado nem diante do tosco trailer do Rancho da Empada.

“Ótimo. Quanto mais simples, melhor”, vibra. Foi a primeira vez que viu o salgado, que para ele lembra “um saboroso briochezinho recheado”. Diante da enorme lista de recheios, não titubeou: pediu logo a de carne, devorada em segundos. “Odeio vegetarianos”, provoca. “Repare como vegetarianos são carrancudos, amargos. Na verdade, eles não gostam de comida. E quem não gosta de comer não gosta de viver.”

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Depois de passar anos trancado trabalhando em cozinhas de Nova York, Bourdain só quer saber agora de se aventurar (em breve, muda-se por um ano para o Vietnã, onde pretende pesquisar costumes e receitas locais). Não foi diferente em São Paulo. Durante um passeio por Camburi e Barra do Sahy, no Litoral Norte, bebeu num único dia treze caipirinhas. Em um almoço, levou quatro horas devorando a feijoada do Bolinha, seu prato brasileiro predileto. Ao visitar o Ceasa, traçou bolinhos de bacalhau regados a vários copos de cachaça. E não perdeu a chance de bebericar (mais) cerveja no bar São Cristóvão, na Vila Madalena.

O jeitão despretensioso predominou até em refeições requintadas. Após comer uma moqueca de lagostim no Di Bistrot, fez questão de ir à cozinha conhecer a brigada. “Cumprimentou um por um e ainda ofereceu uma rodada de cachaça para todo mundo”, conta o proprietário, Cassio Machado. Para mostrar as habilidades culinárias, preparou um jantar para alguns chefs premiados da cidade, entre eles Sakamoto e Alex Atala. No cardápio, foie gras com torradas e pêssego grelhado e filé mignon com atemóia (uma espécie de fruta-do-conde). “Várias vezes ele fazia divertidos paralelos entre comida e sexo”, revela Atala. O único trauma de Bourdain em sua estada paulistana foi numa churrascaria rodízio, experiência que promete não repetir nunca mais. “Já maltratei muito garçom na minha carreira”, confessa. “Por isso morro de medo quando vejo um com a faca na mão.”

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