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Câmara obriga vereadores a registrar a presença com impressão digital

Parece coisa de escola, mas na volta das férias, é uma tentativa de inibir os políticos gazeteiros

Por Daniel Bergamasco [colaboraram Jéssika Torrezan e Pedro Henrique Araújo]
Atualizado em 1 jun 2017, 18h11 - Publicado em 4 ago 2012, 00h51

Poucas categorias profissionais na cidade se mostram tão hábeis no costume de evitar o local de trabalho quanto a dos vereadores. O hábito tornou-se de tal forma institucionalizado entre a classe que erradicá-lo é uma missão bastante difícil. Nem o desconto por sessão cabulada de 464 reais no salário líquido de 7.178 reais nem a instalação de um equipamento com senhas individuais para registrar a presença resolveram o problema.

Na última quarta (1º), durante o retorno do recesso da Câmara Municipal, mais um instrumento foi colocado em uso para tentar inibir os espertalhões. Agora, na chegada ao plenário, os parlamentares precisam pressionar o dedo em um terminal de biometria. O aparelho lê as impressões digitais e confirma se é o próprio político que está ali, e não um camarada qualquer. Na estreia do sistema, 51 vereadores compareceram ao expediente e apenas quatro estiveram ausentes.

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A visão do lugar, porém, não dava margem a muito otimismo. Enquanto o painel eletrônico acusava um comparecimento maciço, o plenário estava quase vazio, um mistério apenas para quem não acompanha a rotina do Palácio Anchieta. Como de costume, a maioria, depois de garantir a presença, saiu de lá para tratar de seus interesses. Quem ficou parecia ter coisa mais importante a fazer além de ouvir os discursos. José Ferreira, o Zelão, do PT, por exemplo, usava seu iPad para navegar pelo Facebook, onde via foto de Zeca Pagodinho, intérprete de sucessos como “Abrigo de Vagabundo”. Outros batiam papo ali por perto, de costas para a mesa diretora. 

O cerco aos gazeteiros apertou no fim de junho, quando o jornal “O Estado de S. Paulo” denunciou um esquema de jeitinhos para evitar faltas. A reportagem registrou, ao longo de vinte sessões, irregularidades envolvendo dezessete dos 55 políticos da Câmara, cujos nomes pipocariam no painel eletrônico embora eles não estivessem ali. Em alguns casos, funcionários apareciam digitando as senhas no lugar dos políticos. A presidência da Casa afastou temporariamente de suas funções três dos contratados envolvidos e aguarda relatórios para avaliar se alguém será punido. Outra medida pró-moralização envolveu a retirada de um terminal instalado próximo à copa do prédio. Muitos vereadores passavam por lá, pegavam um cafezinho, aproveitavam para registrar sua presença a distância e, zás!, sumiam céleres do pedaço. 

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Terminal - Câmara dos Vereadores - 2281
Terminal – Câmara dos Vereadores – 2281 ()

Mais absurdas que a situação são as desculpas dadas por eles para a dificuldade de comparecer ao trabalho. Das 58 sessões realizadas de fevereiro a junho deste ano, apenas três tiveram quórum completo. O campeão de ausências é o vereador David Soares (PSD), com treze faltas. Na sequência está Aurelio Miguel (PR), com oito. Quem deveria dar o exemplo, o presidente da Câmara, José Police Neto (PSD), é o primeiro a defender a prática. “Não dá para reduzir o papel do vereador ao plenário. Há, por exemplo, o trabalho nas comissões”, argumenta. O vereador José Américo, do PT, segue na mesma linha. “Posso acompanhar tudo no meu gabinete pela TV interna e vir correndo se precisar votar”, diz. 

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Gráfico - Câmara dos vereadores - 2281
Gráfico – Câmara dos vereadores – 2281 ()

 

Diante dessa mentalidade, não é de espantar o nível de produção registrado por lá. Dos 161 decretos e leis aprovados neste ano, 87% são formalidades, como a cessão do título de cidadão paulistano ao jogador Neymar, do Santos, e a inclusão do Campeonato de Futebol Amador do Distrito de Cangaíba no calendário oficial do município. Questões importantes, como a revisão do Plano Diretor (a definição de estratégias para o crescimento da metrópole), arrastam-se na Casa desde 2007, sem nenhuma possibilidade de definição a curto prazo. “A Câmara se tornou um poder inútil e caminha para a irrelevância”, lamenta Claudio Weber Abramo, diretor executivo da ONG Transparência Brasil.

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