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Kopenhagen, Brasil Cacau e Cacau Show: a guerra dos chocolates

Jovens, bem-sucedidos e bastante competitivos. Os empresários das três maiores redes de chocolaterias do país disputam o gosto e o bolso do consumidor

Por Giuliana Bergamo
Atualizado em 2 jan 2017, 17h25 - Publicado em 26 mar 2010, 19h53

Eles começaram no ramo de chocolates ainda adolescentes e hoje protagonizam uma disputa acirrada pelo mercado. Atual vice-presidente do grupo CRM, Renata Vichi, 28 anos, tinha apenas 16 em 1997, quando entrou para a equipe do departamento de marketing da Kopenhagen, na época recém- comprada por seu pai. Sua missão era ajudar a alavancar a marca, que, embora já fosse a mais tradicional do país, havia padecido nas mãos de uma administração familiar sem fôlego para fazê-la crescer. Quase uma década antes, Alexandre Costa, 39, dera os primeiros passos para criar a sua Cacau Show. Aos 17, o rapaz resolveu seguir os passos da mãe, que comercializava de bijuterias a artesanato pela vizinhança do bairro onde moravam, a Casa Verde. Batendo de porta em porta, ele vendeu 2 000 ovos de chocolate de 50 gramas nas vésperas da Páscoa de 1988. O negócio continuou dando certo mesmo depois do feriado. Costa passou a fornecer doces para varejistas e, há nove anos, inaugurou a primeira daquela que se tornaria a maior cadeia de lojas do ramo, atualmente com 807 unidades espalhadas pelo país — pretende chegar a 1 000 ainda neste ano — e faturamento anual de 275 milhões de reais.

Costa abandonou o curso de administração de empresas na Faap no 3º ano para dedicar-se exclusivamente ao negócio. Casado e pai de três filhos, sonha muito, muito alto. Já afirmou que pretende transformar- se na Zara (ou na AmBev) dos chocolates. Formada em publicidade e propaganda pela Faculdades Integradas Alcântara Machado (Fiam), Renata passou por todos os departamentos da empresa do pai, Celso Moraes, antes de assumir a vice-presidência, em 2006. Desde então, é ela quem está à frente dos negócios. Como presidente e membro do conselho consultivo do CRM, Moraes acompanha os passos da filha semanalmente, em uma reunião realizada às quartas-feiras. Em treze anos, ela elevou o faturamento da chocolateria de 40 milhões para 160 milhões de reais. Nesta Páscoa, a empresária tem uma arma a mais na briga pelos bolsos e paladares paulistanos. Trata-se da Brasil Cacau, sua nova marca, que vende chocolates por até um quinto do preço da Kopenhagen e nasceu justamente para competir com a Cacau Show.

A DISPUTA EM NÚMEROS

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Criada há pouco mais de um ano, a segunda rede do grupo CRM veio para atender um público com poder aquisitivo inferior ao de quem consome os chocolates da pioneira, cujo quilo custa cerca de 150 reais. “É uma estratégia para continuar ganhando o mercado sem comprometer a minha marca principal, que é um produto de luxo”, diz Renata, casada e mãe de um menino. “Passei quase três anos avaliando qual a melhor maneira de pôr esse plano em prática.” Antes disso, em 2007, o grupo ha via comprado a Dan Top. Para dar conta da produção dos novos itens, o CRM construiu uma fábrica, inaugurada em outubro passado, em Extrema (MG). Nos 33 000 metros quadrados de planta, são confeccionados produtos das três marcas da holding. As grandes diferenças estão no ritmo de produção e nas receitas. Para se ter uma ideia, enquanto as Nhá Bentas são ajustadas uma a uma manualmente depois que o marshmallow é coberto pelo chocolate ainda quente, a Dinda, versão barata do produto vendida pela Brasil Cacau, é feita exclusivamente por máquinas. Até o fim do ano, com a instalação de um equipamento alemão, o CRM pretende automatizar ainda mais sua linha de produção. Assim, um só funcionário poderá fazer 150 quilos de bombom cereja por hora, mais que o dobro do saldo atual. “Ao aumentarmos nossa produção, poderemos elevar também nosso faturamento”, acredita Renata.

Nesta Páscoa, os dois pretendem vender juntos quase 10 milhões de ovos. É um número expressivo, mas pequeno se comparado ao dos gigantes do mercado. Só a fabricante Lacta, líder do setor de chocolates, produziu 23 milhões de unidades para colocar nas gôndolas de supermercados, padarias e magazines. A disputa travada entre Costa e Renata fica evidente nas ruas da capital. Até pouco tempo, era possível notar que a Cacau Show procurava pontos próximos a locais onde já estava a Kopenhagen, principalmente em áreas de classe média e alta, como o Shopping Ibirapuera ou o bairro de Higienópolis. Agora, é a Brasil Cacau que surge em regiões onde a concorrência se fixou, em bairros menos valorizados, como a Vila Prudente e a Vila Carrão. Há ainda um terceiro cenário, em que lojas das três redes compartilham território, como os arredores da Avenida Paulista ou a Rua Teodoro Sampaio, em Pinheiros, por onde circulam pessoas de poder aquisitivo variado.

A briga é clara também nas prateleiras. A Cacau Show tem, por exemplo, suas próprias versões das tradicionais Língua de Gato e Nhá Benta, campeãs de vendas da Kopenhagen. Já a Brasil Cacau fez das trufas, um dos principais produtos da concorrência, o seu carro-chefe. Além disso, ambas têm a caixinha de bombons em forma de motivos marinhos. O grupo CRM nunca reclamou formalmente das semelhanças entre sua principal marca e os produtos da rede nascida na Casa Verde. “Eles são nossos seguidores e isso é até um elogio”, declara Renata, de seu escritório sediado no antigo endereço da Daslu, na Vila Nova Conceição. A chegada de um novo concorrente, porém, incomodou Alexandre Costa. No ano passado, ele levou seu desconforto à Justiça e abriu uma ação contra o CRM. “Eles copiaram demais a gente”, diz. “É marketing de guerrilha.” Depois de uma reunião informal, ficou decidido que a Brasil Cacau não cederia a todas as reivindicações da Cacau Show, mas acataria algumas delas, tais como a extinção dos confeitos drageados e de um kit de bombons.

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AS LOJAS DE CADA UMA 

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Embora o processo tenha sido encerrado em setembro passado, os chocolateiros continuam se alfinetando, cada um à sua maneira. Em um vídeo veiculado durante a campanha de Natal do ano passado, o Papai Noel deixa um bombom a uma vendedora da Cacau Show, com um bilhete. No papel, lê-se “para Renata”. Trata-se de uma coincidência, segundo Costa. “Não faço ideia de por que a produtora escolheu esse nome. Sou muito detalhista, mas só percebi isso depois.” O empresário tem investido bastante em campanhas publicitárias. Em 2009, foram mais de 13 milhões de reais. Para o Carnaval, colocou 50 000 reais no desfile da escola de samba paulistana Rosas de Ouro, que escolheu o cacau como tema do enredo e se sagrou campeã. Ele, inclusive, figurou em um dos carros alegóricos. Antes do desfile, os carnavalescos foram surpreendidos por uma exigência da Rede Globo, que transmitiu o evento: teriam de tirar do refrão o trecho que dizia “o cacau é show”, numa referência evidente à chocolateria. “No fim das contas, demos sorte porque o episódio chamou mais atenção ainda”, comemora Costa.

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Vestido com uma doma, uniforme utilizado por gourmets, o empresário recebeu a reportagem de VEJA SÃO PAULO em uma das salas da maior de suas quatro fábricas, localizada em Itapevi, no interior paulista. Lá, havia uma mesa repleta de chocolates Cacau Show. No meio da conversa, Costa disse que tinha guardado com ele chocolates da Kopenhagen. Em seguida, pediu à repórter que os provasse e comparasse com seu produto. Conhecido por sua autoconfiança, é daqueles que não têm dúvida de que seu negócio é o melhor do mundo. “Você nota alguma diferença gigante? Acha que o da Kopenhagen vale cinco vezes o da Cacau Show?”, disse. “Estamos falando de gestão de marca, não de sabor.” Renata discorda veementemente: “Ao degustar produtos Kopenhagen e Cacau Show, é notório que existe uma diferença crucial de sabor”. E, em questão de gestão de marca, ela acha que Costa está errado ao vender, sob um só rótulo, produtos para públicos de diferente poder aquisitivo. “A marca dele é elástica demais, e isso é perigoso, porque não consegue atender consumidores de luxo”, afirma ela, que se negou a posar para a imagem de capa desta edição ao lado de Costa — as fotos dos dois foram feitas em momentos diferentes e depois unidas em computador. “Agora, com dois rótulos e produtos diferentes, eu não preciso de 1 000 lojas. Posso ter 200 Kopenhagen, 500 Brasil Cacau e garantir um bom faturamento.” Atualmente, a Kopenhagen tem 265 lojas e a Brasil Cacau, setenta espalhadas pelo país.

Teste do chocolate

Em janeiro, VEJA SÃO PAULO convidou três especialistas para provar, sem saber a procedência, a Nhá Benta e outros oito produtos com características semelhantes (marshmallow coberto por chocolate) disponíveis no mercado. Depois de degustar, eles teriam de atribuir notas de 1 a 5 a cada um deles. O ranking foi liderado pelos produtos da Kopenhagen, Cacau Show e Brasil Cacau, nessa ordem, e a diferença entre o primeiro e o terceiro colocado foi de apenas 0,33 ponto. “É significativa a evolução da qualidade do chocolate da Cacau Show, que é uma empresa muito jovem”, diz Arnaldo Lorençato, editor de gastronomia de VEJA SÃO PAULO, que participou do teste. “Ainda assim, fica difícil competir com um produto cujo fabricante tem tradição de mais de oito décadas em selecionar bons ingredientes.”

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Especialistas em marketing acompanham a disputa com atenção. “O crescimento veloz da Cacau Show é impressionante e, ao mesmo tempo, o CRM se utilizou de uma estratégia muito inteligente ao criar uma nova marca”, afirma Ivan Pinto, diretor da central de cases da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). “Será muito instigante acompanhar os próximos passos dessa briga.” Afinal, com tanto chocolate nas veias, certamente não faltará à dupla energia para enfrentar novos rounds.

UNS MAIS IGUAIS QUE OS OUTROS

A disputa entre as chocolaterias é evidente também nas prateleiras das lojas, onde figuram produtos muito semelhantes 

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POR QUE É MAIS BARATO

Embora sejam produzidos na mesma fábrica e administrados por uma só empresa, os chocolates Kopenhagen e Brasil Cacau têm uma diferença crucial: o preço. Os produtos da marca mais barata chegam a custar menos de um quinto dos da pioneira. Veja como isso é possível

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