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Reservatórios que abastecem São Paulo estão em situação pior que há um ano

Mesmo com chuva e economia da população, Alto Tietê e Cantareira sofrem com atraso de obras fundamentais

Por Nataly Costa
Atualizado em 1 jun 2017, 16h42 - Publicado em 1 ago 2015, 00h00

Em agosto de 2014, o paulistano atravessava seu primeiro inverno familiarizado com expressões como volume morto e stress hídrico, antes fora de seu vocabulário. As notícias da escassez de chuvas eram acompanhadas com apreensão, enquanto os índices dos reservatórios despencavam e as torneiras se tornavam conta-gotas. Um ano depois, pouca água passou por debaixo dessa ponte. Com 14,5% e 18,4% da capacidade, respectivamente, Cantareira e Alto Tietê, dois dos principais sistemas responsáveis pelo abastecimento de água da região metropolitana, encontram-se num estado ainda pior que há doze meses. É uma situação preocupante, considerando que precisamos atravessar com essas reservas a fase mais crítica da temporada.

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O Cantareira tinha 200 bilhões de litros de água no início do período de seca do ano passado, entre junho e setembro. Tudo indicava que, com o acréscimo de 105 bilhões de litros da reserva técnica, em outubro, e a ajuda de São Pedro, haveria algum alívio. De fato, a região recebeu quase 70% mais chuvas entre janeiro e junho de 2015 do que no primeiro semestre anterior. Além disso, a população fez sua parte: 83% dos 20 milhões de clientes da Sabesp na região metropolitana estão gastando menos água desde que a companhia começou a aplicar a política de bônus, em fevereiro do ano passado. Somente em junho deste ano, a economia foi de 6 200 litros por segundo, o suficiente para abastecer 2 milhões de pessoas por um mês.

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Por seu lado, o governo nega que tenha implementado um esquema de racionamento. Segundo as autoridades, há apenas uma redução da pressão dentro dos canos, em média de 75% na cidade, para evitar desperdícios com vazamentos. Isso, na prática, resulta em torneiras secas em algumas regiões, principalmente nas mais altas. Dados da Sabesp mostram que as reclamações contra a falta de água aumentaram 62% neste ano. O bairro mais afetado é Santana, na Zona Norte, de onde partem 88 queixas por dia sobre interrupções no fornecimento.

Depois de todas essas ações, começamos este mês com apenas 184 bilhões de litros no “tanque” do Cantareira, 8% a menos do que havia um ano atrás. A si­tua­ção pode piorar. Na semana passada, a Sabesp pediu para aumentar a retirada de água do sistema, de 13,5 para 14,5 metros cúbicos por segundo. Se isso for aprovado, o reservatório poderá fechar o ano com 6,7% de sua capacidade, somando-se duas cotas do volume morto, o que seria o pior quadro da história.

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O cenário não é melhor no Alto Tietê: dos 573,8 bilhões de litros de capacidade, restam apenas 105 bilhões, com a reserva inclusa. Um dos fatores que explicam esse panorama é um fenômeno há muito alertado pelos especialistas: o chamado efeito esponja, causado pelo ressecamento do solo, que acaba “sugando” a água assim que a encontra. Além disso, parte do líquido evapora com o calor. “Isso significa que estamos em uma situação pior, porque, apesar da chuva e da economia, as represas continuam operando sem folga”, diz Marussia Whately, da ONG Aliança pela Água. A irregularidade das precipitações é outro complicador. Será preciso atravessar um agosto seco, com índice pluviométrico na casa dos 25 milímetros — 30% a menos que a média histórica do mês. “É necessário trabalhar com menos dependência das condições climáticas”, alerta o professor Pedro Côrtes, da área de gestão ambiental da USP.

Obra Billings Rio Grande
Obra Billings Rio Grande ()

Não é animador o fato de o sinal amarelo também estar aceso nas principais promessas do governo do estado para estancar a crise. Obras emergenciais de pequeno porte foram inauguradas em junho, trazendo 2 metros cúbicos de água a mais por segundo para o sistema. As interferências mais significativas, no entanto, enfrentam adiamentos ou fazem parte de um horizonte distante. Uma delas vai transferir 4 metros cúbicos de água por segundo do Rio Grande, na Represa Billings, para o Alto Tietê. Previsto inicialmente para o mês que vem, o projeto só deve entrar em operação em outubro. Outras iniciativas de grande importância são a construção do Sistema São Lourenço, que poderá captar 4,7 metros cúbicos por segundo da Ca­choei­ra do França, em Ibiúna, e atender 1,5 milhão de pessoas, e a interligação entre o Rio Paraíba do Sul e a Represa Atibainha. Nesse caso, a conclusão significará uma vazão extra de 5 metros cúbicos por segundo no Cantareira.

O problema é que as duas intervenções só ficarão prontas em 2017. A primeira, com atrasos, está em andamento. A segunda nem sequer foi licitada. Enquanto a população espera, o governo culpa a burocracia. “Há uma dificuldade enorme em realizar obras no Brasil, devido à lentidão no processo de autorizações”, afirma o secretário estadual de Recursos Hídricos, Benedito Braga. “Nossas ações precisam ser urgentes, pois estamos no limite de retirada de água dos reservatórios.”

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Se combalido o Cantareira continua a ser espremido, o governo trata de fazer o mesmo com os outros reservatórios, de forma a aumentar a participação deles no abastecimento da região metropolitana. Um alvo óbvio é o Guarapiranga. Apesar de ter um quinto do tamanho do nosso maior sistema, conta ainda com 76,5% de sua capacidade, o que representa um estoque de 131 bilhões de litros de água. Antes, era responsável por atender 4 milhões de pessoas — hoje tem 6,2 milhões de clientes. Já o Alto Tietê passou de 3,5 milhões para 5 milhões. Tal mudança representou um alívio para o Cantareira, que reduziu o número de usuários de 8,9 milhões para 5,3 milhões. “Trata-­se só de mudar o problema de lugar”, critica Pedro Côrtes.

POÇO SEM FUNDO

A evolução dos indicadores e das iniciativas mais importantes relacionadas ao problema, em comparação a 2014

Economia da população

83% dos moradores da Grande São Paulo baixaram seu nível de consumo desde fevereiro de 2014

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180 bilhões de litros de água foram poupados no período, o equivalente à primeira cota do volume morto do Cantareira

2 milhões de pessoas podem ser abastecidas a cada mês na região metropolitana com a sobra disponível

Status: bom

Obras do governo

› Ligação do Rio Guaió ao Alto Tietê e ampliação da ETA Guarapiranga – Inauguradas em junho, elas somaram só 2 metros cúbicos de água por segundo.

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› Ligação da Billings ao Alto Tietê – Trará 4 metros cúbicos por segundo, mas a Sabesp deve adiar a inauguração, prevista para setembro

› Transposição do Rio Paraíba do Sul – Acrescerá 5 metros cúbicos por segundo. Deveria ter sido iniciada em abril, mas a licitação está atrasada

› Sistema Produtor São Lourenço – O projeto atenderá 1,5 milhão de pessoas, mas foi iniciado com anos de atraso e só ficará pronto em 2017

Status: ruim

Volume de chuvas

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68% a mais de água foi quanto caiu no Cantareira em relação ao ano passado. Mesmo assim, ainda está abaixo da média histórica

25 milímetros é a expectativa de precipitação para agosto, 30% a menos que a média histórica do mês

3 anos é o prazo que levará para os reservatórios do Cantareira saírem do volume morto, caso o índice pluviométrico na região fique dentro da média nesse período

Status: médio

Reservatórios
Reservatórios ()

 

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