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“O teatro paulista tem uma cara muito própria”, diz Silvia Buarque

Em cartaz no Sesc Pinheiros com 'A Menina Escorrendo dos Olhos da Mãe', a atriz fala da sua admiração pela classe teatral de SP e sua relação com a cidade

Por Alice Granato
28 jun 2024, 06h30

Seu avô era paulista. Neta do escritor e historiador Sérgio Buarque de Holanda, a atriz Silvia Buarque, 55, frequenta São Paulo desde pequena. “Metade da minha família é paulistana”, destaca.

Em cartaz com a peça A Menina Escorrendo dos Olhos da Mãe no Sesc Pinheiros até o final de julho, ao lado da atriz Guida Vianna, Silvia é só elogios ao público e à classe teatral da cidade. “Me sinto muito acolhida em São Paulo”, afirma.

A atriz está também em duas séries no streaming: Betinho — No Fio da Navalha e Impuros. Em agosto terá mais um lançamento de que participa, desta vez um longa, o filme Mais Pesado É o Céu, com direção de Petrus Cariry, e Matheus Nachtergaele e Ana Luiza Rios nos papéis centrais.

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Primeira das três filhas de Marieta Severo e Chico Buarque, a atriz nasceu em Roma, no período do exílio de Chico, mas logo foi para o Rio de Janeiro, onde vive e foi criada.

Silvia viajou a Paris para a comemoração do aniversário de 80 anos do pai e teve de voltar antes de a família toda chegar, para estrear em São Paulo. “Mas consegui ficar bastante com ele”, diz, sorrindo.

Muito atenciosa, me recebeu em sua casa, no Jardim Botânico, com café e bolo de fubá. Leia a seguir os principais trechos da conversa.

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Como é a sua relação com São Paulo?

Metade da minha família é de São Paulo. Meu avô era “o” paulistano, e minha avó, “a” carioca. Tiveram sete filhos, quatro nasceram no Rio, três em São Paulo. O meu pai (Chico Buarque) é o quarto filho, o último que nasceu no Rio. Depois foram morar em São Paulo quando ele era pequenininho e, por isso, muita gente acha que ele é paulista. A paixão do meu avô era São Paulo. Ele morava na Rua Buri, no Pacaembu.

Quais as suas memórias de infância da cidade?

Dessa casa eu lembro dos livros. Eu era criança, os livros já não cabiam mais nas estantes, ficavam empilhados no escritório do meu avô, eram pilhas muito altas. Lembro que o meu avô era muito gozador e também me recordo dele tossindo, pois fumava muito. Tenho uma lembrança bonita dele com a máquina de escrever, quando começou a ter o recurso para apagar. Ele veio me mostrar como uma supernovidade, já que era escritor. Tenho uma dedicatória dele no Raízes do Brasil: “Para Silvia, que aprendeu a ler com 4 anos”.

Na sua vida adulta, o que a cidade representa?

São Paulo para mim é teatro, trabalho, cultura, exposições, que gosto muito, e comida. É a oitava peça que faço em São Paulo. Na primeira eu tinha 24 anos. Adoro o polpettone do Jardim de Napoli; meu tio Serginho me levava lá depois das peças. Sou turista e meio deslumbrada com a cidade, pelo aspecto cultural; sou muito urbana, a vida paulistana eu acho a coisa mais linda.

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Qual o seu retorno do público da capital paulista?

Acho um público muito comprometido. Tem paciência para ver peças mais longas. Consome muito o teatro mais alternativo. As peças do Sesc lotam, as do Oficina também. Gosto muito da classe teatral de São Paulo. Me sinto muito acolhida aqui. Os atores vão assistir aos colegas, são generosos, olham no olho, é uma classe muito carinhosa. Eles têm uma integração e se valorizam.

“Acho o público de São Paulo muito comprometido. Consomem muito o teatro mais alternativo”

Quais os caminhos teatrais que mais a atraem?

O tipo de teatro que costumo fazer é mais alternativo. Faço peças para um público interessado no teatro mais denso. Minha peça está na categoria drama.

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A peça fala da relação mãe e filha. Tem alguma coisa a ver com a sua vida pessoal?

Não há identificação entre aquelas mães e filhas e a minha vida real. O que me pegou foi a qualidade do texto da Daniela Pereira de Carvalho. Nessa peça, não se resolve nenhum conflito, não fecha, fica tudo no ar. Gosto de um texto sólido, com começo, meio e fim aberto, e das dezenas de camadas da peça.

Como está sendo contracenar com a Guida?

Um sonho. Guida é das melhores parceiras que já tive na vida. É a primeira vez que faço uma peça de apenas duas pessoas. Ela é muito maternal, não tivemos uma rusga, o que é muito raro. Nem mesmo artisticamente, nada. Nos ensaios a gente falava bastante de maternidade. Mais das nossas filhas do que das nossas mães, pois nós duas somos mães de filhas únicas.

Quais são os grandes desafios da relação mãe e filha, e como é a relação com a sua mãe?

Tem uma frase na peça muito bonita: “Sou monogâmica em termos de mãe”. Eu me identifico com essa frase. Tenho uma relação muito estreita com a minha mãe, temos a mesma profissão, a gente troca muito.

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Você faz mais teatro e cinema do que televisão, por quê?

Fiz muitos filmes. A partir do Gonzaga — De Pai para Filho, do querido Breno Silveira, comecei a fazer mais cinema; depois teve Pobres Diabos e Homem Onça, filmes do meu coração. Atribuo ao meu casamento com o Chico (Diaz) ter feito mais cinema. Ele é um ator de cinema. No início da minha carreira fiz muita novela, foram sete. O streaming está me seduzindo. Quero até me oferecer (risos). As séries estão entre o cinema e a TV.

Sua mãe é dona do Teatro Poeira, junto com a Andrea Beltrão, no Rio. Qual a sua relação com esse teatro?

Uma relação profissional. Tudo que fiz ali tem muita qualidade, entraria ali mesmo sem mim. É um teatro magnífico. Tem um público dele. A curadoria era da minha mãe, da Andrea e do Aderbal (Freire Filho). Fui dirigida por ele duas vezes. Uma antes de ele namorar minha mãe. Maior diretor de ator com quem já trabalhei. Ele era conversador e tinha uma percepção rara. Tem a Bia Lessa, o Leonardo Netto agora… Sou muito feliz com minhas escolhas teatrais. Estou com saudade do Aderbal (seu padrasto, que morreu em agosto de 2023), pois o Poeira fez 23 anos. As cinzas dele estão lá. Ele é bem a alma daquele teatro.

Como foi ver seu pai completar 80 anos?

É estranho ver meu pai com 80 anos, não junta na minha cabeça, não o vejo com essa idade. Fizemos uma viagem muito afetiva a Paris, consegui ficar muito com ele, mesmo tendo de ir embora antes de a família toda chegar, filhos e netos. Senti que ele estava achando bonito juntar todos. Foi muito tocante ver os cadernos culturais abrindo espaços incríveis para o meu pai, que é (apenas) o Chico Buarque (risos). Tenho a noção de quem ele é e não sou blasé com isso. Consigo ouvir e ler a obra dele como se não fosse meu pai. Consigo gostar mais de uma música do que da outra. Adoro os livros dele e não fico lembrando que ele escreveu. Me incomodam os haters, as porradas políticas que ele leva, aí não separo, não, é meu pai. E não levo desaforo pra casa.

Publicado em VEJA São Paulo de 28 de junho de 2024, edição nº 2899

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