Por dentro da exposição de Emanoel Araujo no Farol Santander
Curador explica trajetória do fundador do Museu Afro Brasil; "O Emanoel trouxe a raiz africana para a abstração geométrica", diz Fábio Magalhães
“Vejo Emanoel alegre em seu trabalho, cercado de seu mundo estranho e real: o mistério das casas e das ruas da Bahia, a dança ritual dos candomblés, a malícia e a graça dos felinos.” Este é um trecho de um texto escrito em 1965 por Jorge Amado (1912-2001) que estampa uma das paredes de Emanoel Araujo — Embates Construtivos, em cartaz no Farol Santander. Ele aparece logo abaixo de uma xilogravura do início da carreira do artista, pertencente à família de Graciliano Ramos (1892-1953).
Emanoel, nascido em 15 de novembro de 1940 em Santo Amaro, na Bahia, terra de Caetano Veloso e Maria Bethânia, passou seus anos formativos como artista relacionado a uma turma de nomes conhecidos — além dos conterrâneos, Gal Costa, Tom Zé, Nelson Rodrigues, Glauber Rocha e os dois escritores citados. Com Lina Bo Bardi, que projetou o prédio do Masp, organizou, em 1963, a primeira exposição após a revitalização do Solar do Unhão, prédio que daria origem ao Museu de Arte Moderna da Bahia. “Ele está inserido em um momento de grande ebulição cultural no estado e isso lhe dá uma visão que não se resume a apenas um nicho. É um homem inserido sobretudo na arte popular”, diz o curador Fábio Magalhães, amigo do baiano por cinquenta anos.
Raridades produzidas por Emanoel Araujo (1940-1922) no início de sua carreira são exibidas ao lado de trabalhos marcantes e de seus últimos dois anos de vida. São mais de setenta obras, entre serigrafias, xilogravuras, cartazes e esculturas, que ocupam todo o 24º andar do Farol, provenientes de acervos institucionais e coleções particulares, incluindo a Coleção Santander Brasil e a da Pinacoteca de São Paulo. Nascido em uma tradicional família de ourives, o artista se mudou para Salvador na década de 60, quando ingressou na Escola de Belas Artes da Bahia da UFBA para estudar gravura.
No início, elas eram bastante figurativas, depois, passaram a flertar com o estilo pelo qual ficaria mais conhecido: a abstração geométrica. “Em 1972, ele ganha a Medalha de Ouro na Bienal de Arte Gráfica de Florença, na Itália, pelas gravuras de armar. A proposta dele era não ter vidro e a pessoa poder puxar a escultura e desenvolvê-la. Aí já se vê um interesse pela tridimensionalidade”, explica o curador. A exposição inicia com essas obras bidimensionais, que incluem ainda um álbum de serigrafias homenageando poetas negros, entre eles Gonçalves Dias, Luiz Gama, Machado de Assis e Mário de Andrade, de 2020, e um cartaz feito por ele para uma de suas primeiras exposições, de 1963.
Na década de 70, Emanoel mergulha no abstracionismo geométrico em esculturas feitas de madeira e metal. “São diagonais que se enfrentam, se contrapõem e convergem”, diz Magalhães. E ressalta: “A escola geométrica no Brasil tem raiz europeia. O Emanoel traz a raiz africana”.
Curador e museólogo, o baiano, que viveu até sua morte em uma casa-ateliê no Bixiga, é uma das vozes mais relevantes na valorização da arte e memória afro-brasileira. Em 1988, realiza a exposição A Mão Afro-Brasileira — Significado da Contribuição Artística e Histórica, no MAM-SP, para marcar o centenário da abolição da escravidão. “É a primeira grande exposição que trata de todos os aspectos da presença do negro na cultura brasileira. E ele trabalha isso outra vez em 500 Anos de Brasil, em 2000, no Parque Ibirapuera.”
Em 2004, fundou o Museu Afro Brasil, doando peças de sua coleção pessoal para iniciar o acervo da instituição, que hoje tem mais de 8 000 obras. Foi diretor do museu até sua morte, em 7 de setembro de 2022. Em dezembro do mesmo ano, o equipamento cultural passou a se chamar Museu Afro Brasil Emanoel Araujo. Em São Paulo, também foi diretor da Pinacoteca, entre 1992 e 2001, quando conduziu uma reestruturação do edifício e ampliação do acervo da instituição.
A expografia de Haron Cohen divide as esculturas por cor no espaço expositivo, com uma sessão dedicada aos vermelhos e azuis da série de quatro esculturas Navio, que utiliza a imagem de embarcações negreiras, e uma sala dedicada a obras totalmente brancas. A escolha de cores pelo artista está ligada aos orixás. Na cultura iorubá, o amarelo refere-se a Oxum, que simboliza o amor, a riqueza e a beleza; o branco, a Oxalá, representa a paz, a pureza e a sabedoria; o vermelho e o azul-escuro são as cores de Ogum, o orixá guerreiro; vermelho somado a branco remete a Xangô, o orixá da justiça.
Um destaque é a clássica escultura de grandes dimensões intitulada Homenagem à Louise Nevelson (1998), composta por quatro painéis em acrílica sobre aglomerado e compensado, obras que refletem a influência barroca na produção de Emanoel, e uma aquarela, técnica pouco usada em sua diversa trajetória.
Farol Santander. Rua João Brícola, 24, centro. → Ter. a dom., 9h/20h (entrada até 19h). R$ 45,00. Até 22/2. farolsantander.com.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 14 de novembro de 2025, edição nº 2970.
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