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Dono da Livraria Cultura encara mercado de eletrônicos

Pedro Herz lança biografia e revela o que pretende fazer com a Fnac, adquirida pelo grupo em julho deste ano

Por Dirceu Alves Jr.
Atualizado em 17 nov 2017, 06h00 - Publicado em 17 nov 2017, 06h00
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O empresário Pedro Herz (Leo Martins/Veja SP)
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Uma vara de pescar repousa apoiada na estante do escritório do empresário Pedro Herz no 10º andar de um prédio da Avenida Paulista. O dono da Livraria Cultura, vez por outra, sai do trabalho direto para Ilhabela, no Litoral Norte, onde fisga seus peixes para, em seguida, fotografá-los e devolvê-los ao mar. “Não gosto de nada imóvel ou que gere empecilhos. Então, se algum amigo na sexta-feira me convida para ir à praia, eu caio na estrada sem perder tempo”, conta.

A ferramenta usada na atividade esportiva, no entanto, tem tido pouca utilidade nos últimos meses. Mesmo assim, esse paulistano de 77 anos não reclama das nove ou dez horas diárias dedicadas ao ofício, tampouco cogita uma aposentadoria imediata. “Claro que um dia devo abandonar essa rotina, mas não me imagino sem uma ocupação regular”, diz. “Os desafios sempre são bem-vindos.”

Com a aquisição das operações da rede francesa Fnac no Brasil, em julho, Herz deu início a um novo capítulo da história da Livraria Cultura e encara com leveza as transformações de suas lojas em nome da continuidade. “Os eletrônicos, ponto forte da Fnac, representam um mundo desconhecido para nós, mas também aprendi a vender CDs e DVDs quando o mercado exigiu”, afirma.

Livraria Cultura
A primeira loja, em 1969 (Arnaldo Fiaschi/Estadão Conteúdo)

Em meio a um agitado 2017, ele testa ainda poder em outro segmento editorial que não enfrentara: o de escritor, ou melhor, de narrador da própria experiência.

Na quarta (22), Herz lança a biografia O Livreiro (Editora Planeta, 240 páginas, R$ 49,90) na filial do Shopping Iguatemi, às 18h30. Desta vez será ele quem distribuirá autógrafos. A obra funde memórias e reflexões sobre um pequeno investimento realizado há setenta anos, que fecha 2017 com 29 lojas pelo país, somando-se os pontos de Cultura e Fnac.

A história carrega ares de ficção com final feliz. O casal alemão Eva e Kurt Herz chegou a São Paulo em 1939, fugido da perseguição nazista aos judeus na Europa, e contava os tostões para sustentar os dois filhos, Pedro e Joaquim, nascidos na sequência. O salário do marido, representante da indústria da confecção, não cobria o orçamento.

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Eva, a parte cerebral da dupla, decidiu importar o melhor da literatura para alugar aos compatriotas intelectualizados. A sala da casa dos Herz, na Alameda Lorena, batizada de Biblioteca Circulante, foi o embrião da Cultura, que só inauguraria a primeira loja em 1969, no Conjunto Nacional.

Herz
Eva e Kurt, o filho Pedro e os netos Fábio e Sergio no início dos anos 90: um negócio que uniu três gerações (Arquivo Pessoal/Veja SP)

O endereço virou referência de escritores, artistas e políticos. Ignácio de Loyola Brandão, Lygia Fagundes Telles e Fernando Henrique Cardoso marcavam presença por lá. O poeta Vinicius de Moraes deixou leitores e jornalistas esperando duas horas no lançamento do livro O Falso Mendigo, em 1978. Culpou os muitos botecos encontrados no caminho pelo atraso.

Também foi na Cultura que Fernando Gabeira, recém-chegado do exílio, autografou O Que É Isso, Companheiro?. As gerações seguintes de autores, como Caio Fernando Abreu, Marçal Aquino e Daniel Galera, conservaram a efervescência da loja que deu origem a uma rede nacional.

Para Herz, os livros são o peixe que melhor sabe vender e não pretende entregar os pontos. “Mas reconheço que só com eles não pago mais as contas.” A crise econômica e a mudança de perfil dos leitores afetaram o negócio. O faturamento de 500 milhões de reais, em 2015, caiu para 380 milhões no ano passado. O comércio de eletrônicos, por sua vez, já animou a receita.

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“Graças à compra da Fnac, o faturamento de 2017 deve acabar em 800 milhões de reais”, afirma Sergio Herz, 46, o mais velho dos dois filhos de Pedro e CEO da empresa. “Queremos em três anos dobrar as vendas on-line, que são 30% do faturamento”, completa. O caçula, Fábio, 44, trabalhou no grupo por duas décadas e desde 2014 toca projetos próprios.

FNAC PINHEIROS
A fachada da Fnac do bairro de Pinheiros, “a menina dos olhos”: reforma ao longo de 2018 (Leo Martins/Veja SP)

O prédio da Fnac na Praça dos Omaguás, em Pinheiros, é “a menina dos olhos” da nova fase. Os 7 000 metros quadrados serão redimensionados em uma obra que vai se estender por 2018. Ainda está em estudo se uma marca diferente batizará os pontos adquiridos. Um teatro, como outros seis cravados em unidades pelo Brasil, figura no projeto.

A atriz Clarice Niskier, da peça A Alma Imoral, que há nove anos faz carreira nas salas do grupo, festeja a iniciativa. “O Pedro se preocupa com cada detalhe, e isso é demonstrado na sua presença na livraria”, afirma. “Ele não pega um volume da estante e manda dar baixa no estoque. Entra na fila e paga, como se fosse um cliente.”

O empresário não é o tipo de homem que se amedronta diante do desconhecido. “Sempre é possível engatar uma marcha a ré”, diz. Aos 18, incentivado pela mãe, morou com os tios na cidade de Basileia, na Suíça, onde se matriculou em um curso para a formação de livreiros. De volta ao Brasil, foi casado por uma década com a nutricionista Rosa Maria Herz, mãe de seus filhos, e, separado, nunca mais deixou de se considerar um solteiro. “O que não significa que não tenha relações duradouras”, desconversa.

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O LIVREIRO
‘O Livreiro’: biografia de Pedro Herz (Divulgação/Veja SP)

O desapego material é exercitado. A cobertura em que vive, no Edifício Copan, no centro da cidade, já foi transferida para os herdeiros. Fabricado em 2008, seu carro, um Mercedes-Benz Glk, rodou só 42 000 quilômetros. Herz transita de ônibus ou metrô e prefere o táxi à noite. “Não ando de bicicleta em São Paulo por segurança, mas sempre que visito a Europa alugo uma”, diz ele, elogiando as ciclovias de Berlim.

Os exemplares da biblioteca pessoal também são constantemente distribuídos. “Só não abro mão daqueles que recebi de pessoas queridas ou de quem sou fã”, garante ele, que tenta manter uma média de três livros consumidos por mês, seja no papel, seja no tablet. “Leio menos porque fico cansado”, assume. “Sem falar que tem obra chata que largo e nunca mais retomo.”

Outra de suas paixões é a música clássica. Frequentador dos concertos da Sala São Paulo e do Teatro Municipal, Herz, entre 2002 e 2016, integrou a Sociedade de Cultura Artística e, em três mandatos, ocupou a presidência. “Saí porque vi que era hora de passar o bastão”, afirma.

O rosto conhecido dos clientes se exercita também na TV. Depois de apresentar o programa Arte 1 ComTexto, no canal fechado do Grupo Band, virou produtor do próprio conteúdo. Hoje, ele grava o Sala de Visita e posta toda segunda um vídeo no YouTube.

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Herz conversou com personalidades como o escritor Mia Couto e o ator Wagner Moura sobre literatura e o processo criativo de cada um, atingindo 30 000 visualizações em certas entrevistas. “Todo trabalho tem uma história, um percurso até ficar pronto, e acho importante as pessoas conhecerem essas etapas”, justifica.

Expansão contínua

A Cultura nasceu em 1947 como a Biblioteca Circulante. Eva Herz importava e alugava livros em sua casa, na Alameda Lorena, em São Paulo.

Em 1969, a primeira loja é inaugurada no Conjunto Nacional, na Avenida Paulista.

A primeira loja-âncora de um centro comercial é de 2000, no Shopping Villa-Lobos.

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Em 2007, a Cultura do Conjunto Nacional abre ao público reformada, com 4 300 metros quadrados

A rede possui dezessete pontos, 1 500 empregados, 5 milhões de clientes e 9 milhões de produtos. Com a aquisição da Fnac, ganhou mais doze lojas e 600 funcionários.

A previsão de faturamento em 2017 é de 800 milhões de reais.

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