“No circo, coloco minha vida nas mãos dele a 5 metros de altura”
Entre as apresentações no picadeiro, o equilibrista Giovanni Astorga se apaixonou pela contorcionista Rejane Vargas
Trabalhava no Circo Spacial com minha família desde os 5 anos. Meu marido, Giovanni, 37, sexta geração de artistas circenses, teve uma infância parecida. Viajamos o Brasil inteiro e trocávamos de escola a cada três ou quatro semanas. Quando você vê seus familiares no picadeiro, é natural querer participar também. Meu primeiro número foi de contorcionista, fantasiada de boneca de pano dentro da caixa.
Aos 27 anos, Giovanni se mudou para o Circo Spacial. Demorou alguns anos para que algo acontecesse entre a gente porque ambos tinham outros relacionamentos na época, que terminaram depois. A relação com o circo e entre seus integrantes é intensa. Todos trabalham, moram e viajam juntos, então ficamos íntimos. Giovanni começou a ficar cada vez mais carinhoso comigo, até que um dia nós demos nosso primeiro beijo na coxia, atrás do palco, depois de um espetáculo. Nosso namoro foi acontecendo sem que eu percebesse.
Sete meses depois, engravidei do Ícaro, hoje com 10 anos. Foi uma grande felicidade para nós dois, mas eu não podia mais me arriscar no picadeiro fazendo números nas alturas, nem contorcer minha barriga, então me transferi para a área de atendimento ao cliente. A criação de um filho no circo é tranquila. Tive minha família ao meu redor, podia levá-lo sempre comigo e fazer pausas no trabalho para amamentar sem pressa. Hoje nosso pequeno faz entradas como palhacinho e está aprendendo a arte dos malabares.
Eu e Giovanni resgatamos o número da boneca de pano no show e começamos a fazer outras performances juntos. Eu admiro nele a dedicação que tem quando aprende um truque novo. Treina até atingir a perfeição. Nosso relacionamento é baseado na confiança porque, literalmente, coloco minha vida em suas mãos quando sou carregada a mais de 5 metros de altura.
Em 2017, surgiu a oportunidade de oficializar nosso casamento no programa Fábrica de Casamentos, do SBT. o tema da cerimônia? Circo, claro. Meu vestido foi criado com detalhes que lembravam meu traje circense e os bonecos em cima do bolo eram o noivo segurando um trapézio e a noiva suspensa no tecido.
Paramos com a vida itinerante e trocamos o trailer por um apartamento quando meu irmão, Juliano, 39, o mágico da família, abriu a empresa de entretenimento Circo Show com endereço físico na Quinta da Paineira, região metropolitana de São Paulo. Fazemos festas infantis, eventos corporativos e treinamento circense.
Antes da pandemia, nunca tivemos de parar com os espetáculos. Ficamos assustados. Como íamos sobreviver? Os circos vivem da bilheteria e as famílias não se sentem seguras para levar os filhos. O Circo Spacial está fechado desde março do ano passado.
Para não parar com o Circo Show também tivemos de encontrar outras formas de levar alegria às pessoas e continuar pagando as contas. Passamos a fazer lives contratadas e shows em drive-ins. A repercussão foi boa. Arrecadamos mais de 1 tonelada de alimentos para distribuir às famílias circenses que perderam a renda com a suspensão dos eventos presenciais.
Os aplausos do público no número final e o aceno das crianças é o que nos trazem o sentimento de dever cumprido. A gente faz o que ama, mas tenho receio que as pessoas se cansem do circo virtual.”
+Assine a Vejinha a partir de 6,90
Publicado em VEJA São Paulo de 27 de janeiro de 2021, edição nº 2722