Julia Gallo constrói carreira artística com obras que causam fascínio e estranheza
Artista de 27 anos expõe sua primeira individual, 'Aguardente', no Paço das Artes, com desenhos feitos com carvão, café e papel
Para ver as obras de Julia Gallo, 27, é bom começar de perto e então se afastar. Cada desenho esconde uma infinidade de outros, que se juntam até formar seres inventados. “Gosto de não saber onde começa e onde termina”, diz a artista. Até o dia 6 de outubro, ela expõe sua primeira individual, Aguardente, com dez obras no Paço das Artes, em Higienópolis.
Gallo registra em desenho o que vê em um passeio com amigos, uma ida à feira, uma tarde no parque. Quando sente que tem material suficiente, ele se junta em algo maior. Às vezes, um registro feito há um dia resgata outro de anos atrás. “Quando a imagem mexe comigo, mas não consigo definir o que ela é, aí eu a potencializo”, explica.
Na infância, queria ser bióloga, arqueóloga e artista. “Desenhava bichos. Depois, o compromisso com o real ficou de lado”, conta. Filha do paulistano Rogério Gallo, diretor de TV, e da atriz carioca Maria Luísa Mendonça, ela nasceu no Rio, mas veio para São Paulo aos 14 anos, onde se formou em artes visuais na Faap. Com oito anos de carreira, mesmo jovem, suas obras são facilmente reconhecíveis pelo traço único e os materiais utilizados: café, carvão e papel.
O carvão veio por seu caráter definitivo. “Qualquer decisão que você tomar vai aparecer na obra.” Depois, a limitação de uma tela quadrada a fez explorar os recortes de papel. Um dia, durante a pandemia de covid-19, Gallo, amante de café, derramou a bebida em um deles — e gostou do resultado.
Os recortes são expostos a uma certa distância da parede, por meio de ímãs colocados em parafusos. “Quero potencializar a sensação de pele e de corpo que o material traz.”
Em 2024, a artista participou de cinco exposições coletivas, em São Paulo, Rio de Janeiro e Hamburgo, na Alemanha. Em setembro, ingressou na residência artística Domo Damo, em uma construção de Paulo Mendes da Rocha, na Granja Julieta. O período promete uma nova leva de produções e a experimentação de novos materiais. “Me sinto com vontade de trabalhar. Quero fazer isso pelo resto da vida. Essa é minha meta.”
Publicado em VEJA São Paulo de 20 de setembro de 2024, edição nº 2911.