“Precisamos normalizar o envelhecimento”, diz Eliana aos 50
Com 32 anos de carreira, a apresentadora reflete sobre maturidade e visibilidade feminina nos canais abertos e conta qual é seu bairro queridinho na cidade
Ao completar 50 anos de vida, Eliana Michaelichen acredita ter muitos motivos para comemorar — entre eles, o sucesso no SBT como uma das apresentadoras mais longevas da televisão brasileira.
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Em seu programa dominical e nas redes sociais (que acumulam mais de 30 milhões de seguidores), a paulistana se conecta com o público predominantemente feminino, embora ainda seja uma das poucas mulheres na disputa pela audiência aos fins de semana.
Enquanto isso, também mira no streaming e atua como empresária — e, ao dividir-se entre várias funções, seu principal objetivo é mais simples que tudo isso: viver com leveza e exigir menos de si mesma.
Qual balanço você faz desses 50 anos? Conquistou tudo o que queria?
Tenho muito o que agradecer, mas vejo que ainda tenho energia para realizar novos sonhos. Quero voar mais, hoje com segurança sobre a minha capacidade de fazer o que amo. Esses 50 anos me trazem a maturidade e força necessárias para seguir por esse caminho.
Você tem alguma filosofia pela qual vive hoje em dia?
O que tenho é uma palavra que me guia: leveza. Ela permeia minha vida pessoal e profissional, pois não adianta querer ser boa em tudo. Sei que em algum momento vou falhar e preciso me acolher quandoisso acontece. Eu sou mãe, empresária, comunicadora, esposa, organizo minha casa e chegando o fim da semana penso “não consegui fazer tudo o que gostaria”. Tudo bem. Exigir menos e tentar fazer o possível faz parte da maturidade.
Você também completa 32 anos na TV. Tem planos de mudança de carreira ou o formato ainda a satisfaz?
Estou bem satisfeita e apresento há dezessete anos ininterruptos um programa para a família em um ambiente antes predominantemente masculino. Cresci vendo Silvio Santos, Gugu Liberato e Fausto Silva, e depois de alguns anos ter me tornado apresentadora nesse hall de homens foi representativo demais. E falar com as mulheres aos domingos e contar suas histórias é algo especial, assim ficamos mais fortes. Conversar com meu público nas redes sociais me encanta também porque sinto que sou ouvida. Ter voz e ser ouvida é um grande privilégio.
“Meu desejo é não ser a única mulher aos domingos na televisão. Sem dúvida ainda temos machismo”
A única mulher há dezessete anos à frente de um programa dominical de auditório. Isso é sintoma do machismo na televisão? Afinal tem Huck, Faustão, Mion…
O que eu mais desejo é que outras mulheres ocupem essa profissão de comunicadora aos domingos. Por que só eu aos domingos por todo esse tempo? Outros programas vieram, mas se encerraram. Meu desejo é não ser a única. Sem dúvida ainda tem machismo e aos poucos vamos quebrando isso. Fiquei feliz de ter sido acolhida pelo público logo que decidi fazer a transição do infantil para o adulto.
Por que essa transição deu certo?
Porque acredito muito em tudo o que aconteça de dentro para fora. Era um momento em que eu estava pronta, não foi apenas um desejo da emissora, era algo que eu precisava fazer e, se não tivesse feito, talvez não estaria aqui conversando com você e com meu público. Acredito muito que a gente precisa se reinventar para não se extinguir.
Qual é a diferença entre disputar a audiência com Faustão e com Luciano Huck aos domingos?
Na verdade eu disputo a audiência com uma máquina que é uma potência e tem um orçamento muito maior que o meu. E a criatividade a gente tem bastante daqui desse lado. Acho que são profissionais que sempre admirei e essa coisa da disputa fica só nos momentos em que estamos no ar, mas sem dúvida alguma nosso programa está no ar há anos pela criatividade e o empenho de uma equipe afinadíssima.
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Como foi o resultado da sua participação no reality Ideias à Venda, da Netflix? Acha que seu futuro pode estar no streaming?
Amei trabalhar com uma nova equipe e direção, me senti lisonjeada por ter sido vista como alguém para falar não só de entretenimento, mas também de empreendedorismo feminino. Estar em um catálogo mundial para mim é gratificante. Se me convidarem mais vezes, com certeza estarei lá.
Como foi crescer em São Paulo?
Sou de uma família muito simples, meu pai trabalhava em um prédio nos Jardins. Quando você é criança, não sabe ver diferença entre alguém mais simples ou mais abastado, só quer brincar e se divertir, sem essa comparação. Uma vez brincando com os amigos do prédio ouvi de um pai “não quero meus filhos com essa filha de zelador”. Foi a primeira vez que senti o impacto do preconceito, ainda não tinha entendido essa diferença de ser a filha do zelador ou do engenheiro, do médico… Com esse mesmo sentimento, que me deixou mais forte hoje, eu mostro aos meus filhos que não pode existir isso e crio eles de maneira muito pé no chão.
Como é sua relação com a cidade? É feliz morando aqui?
Eu viajo já há alguns anos e a minha profissão me deu essa chance de levar o programa para muitos lugares do Brasil e do mundo. Mas toda vez que volto para São Paulo me reencontro com a culinária, os parques, as avenidas. Sou apaixonada pela Paulista, nasci nos Jardins e subia a pé a Rua Pamplona para tomar um sorvete. Tenho verdadeira paixão por aquela região apesar de não morar mais lá, mas meus pais ainda moram.
Seus pais nunca se mudaram dessa área?
Não! Eles amam o bairro e nossas raízes estão ali, tenho muita história. Minha mãe vive no mesmo prédio em que eu nasci desde então. Antes ela morava no apartamento reservado ao zelador, hoje faz parte da lista de moradores. Ao longo dos anos, a filha dela conquistou seu caminho e comprou esse presente. Hoje meu bairro queridinho é o Alto de Pinheiros, adoro os restaurantes com parte externa, muito verde e a descontração de usar rasteirinha e roupa mais relax, que é como gosto de estar no dia a dia.
Por trabalhar na televisão por muitos anos, você tem se sentido pressionada a manter uma aparência jovem?
Não só por ser uma pessoa pública e estar na mídia, de maneira geral a mulher sofre muita pressão ao envelhecer. Mas precisamos normalizar o envelhecimento como algo ligado à vida. A mulher hoje com cabelos brancos é aceita, mas há alguns anos era vista como alguém que não se cuidava. Precisam nos deixar viver em paz porque isso faz parte da vida, é natural a quem quer viver muito. E eu quero.
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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817