“Toda vez que piso em um palco, me lembro dela”, diz filho de Rita Lee

Beto Lee, primogênito de Rita e Roberto, fala sobre o luto, os Titãs e a turnê especial em homenagem à mãe, que passa por São Paulo em julho

Por Tomás Novaes
Atualizado em 28 Maio 2024, 08h47 - Publicado em 30 jun 2023, 06h00
Homem branco de bigode posa segurando guitarra em estúdio. Veste calça jeans e camiseta preta.
Beto Lee. (Mila Maluhy/Divulgação)
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Beto Lee, 46, se sentou e logo pegou uma guitarra que estava encostada. Tocou alguns acordes, com ela desligada, antes de começar a falar. “Desculpa, quando vejo uma guitarra, não consigo me conter”, disse. O músico paulistano recebeu a Vejinha no primeiro ensaio para a turnê em homenagem à sua mãe, que rodará o Brasil a partir de julho e passará por São Paulo no dia 29, com participação de Fernanda Abreu, Luísa Sonza e a Orquestra Sinfônica Villa Lobos. Cantor, compositor e guitarrista, filho mais velho de Rita (1947-2023) e Roberto, afilhado de Gilberto Gil e pai de Izabella, Beto respira música desde sempre. Começou a tocar com a mãe em 1995 e, desde então, percorre seu próprio caminho, com projetos na televisão, discos-solo e com os Titãs, após a saída de Paulo Miklos, em 2016. Confira, a seguir, a conversa com o roqueiro.

Você pediu a bênção da sua mãe antes de começar os shows em tributo a ela. Como foi essa conversa?

Eu liguei para ela e disse: “Seguinte, estou preparando isso e queria saber o que vocês acham, se eu tenho a bênção de vocês”. E ela respondeu: “Lógico, claro. Tem mais que fazer mesmo. Se você não fizer, alguém vai”. É isso, fazer em família. Eu fui no bloco (de Carnaval) Ritaleena e me vi cercado de adolescentes cantando as músicas da minha mãe, pulando, dançando. Ninguém dessa molecada viu a minha mãe em ação, é muito louco como as músicas atravessaram essa nova geração. Por isso é muito bacana tocar esses hits ao vivo, depois que a minha mãe se aposentou. Esse é o propósito.

Em São Paulo, o show também terá a participação de Luísa Sonza. Como nasceu esse convite?

A Luísa sempre deixou explícito que é fã da minha mãe. É uma garota que, quanto mais eu fui conhecendo, mais fui respeitando e admirando. Ela começou ralando, cantando em churrascaria, e hoje está aí, no topo do Olimpo. Eu dou um puta crédito para isso. E ela é do rock, ela curte, entende a malandragem da coisa. A gente fez o Altas Horas, foi a nossa primeira apresentação juntos, e foi maravilhoso. A voz dela ficou linda em Amor e Sexo. Não sei o que vamos aprontar, mas vai ser um prazer receber aquele talento.

É uma responsabilidade sua, como filho, homenagear a sua mãe no palco?

Vejo homenagens aqui e ali, acho ótimo, que venham mais. A minha é uma entre várias rolando, isso é fantástico. Cresci ouvindo essas músicas, é uma extensão da minha vida. Vi algumas delas sendo gravadas, outras sendo criadas. Minha mãe sentada na mesa, escrevendo — o grande barato dela era a composição. Essas coisas me trazem memórias de todos os tipos, até olfativas. Mas é isso, a responsa está na minha mão.

Qual é a sua memória mais especial de ver seus pais compondo?

Eu me lembro de estar no estúdio, nas gravações do álbum que todo mundo chama de Lança Perfume (disco Rita Lee, de 1980), e ouvir essa música, lembrando dos meus pais tocando ela em casa, com violão, gravando em um cassete para registrar a ideia. Entre tantas, essa é especial, é um golaço.

O primeiro show que você fez após a morte de sua mãe foi na Virada Cultural. Como você se sentiu?

O palco, para ela, era um lugar sagrado. Ela sempre falava isso, que no palco você tem que esquecer o passado, o futuro e se concentrar no presente. Esquecer birras, amarras e focar no agora. Foi muito emocionante, porque o show foi exatamente vinte dias depois. Eu ainda estava absorvendo tudo. Toda vez que piso em um palco, me lembro dela, é inevitável. Mas está tudo bem, eu sei que todo mundo aqui tem que cumprir um contrato de alma, para a gente se encontrar depois em outro lugar. Ela cumpriu o dela, e a gente vai seguir.

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Você já disse que pediu para sua mãe visitá-lo nos seus sonhos. Você sonhou com ela nos últimos dias?

Não, mas eu sinto às vezes uma presença em casa. É difícil explicar. Você está sozinho, cortando cenoura na cozinha, e de repente parece que tem alguém atrás de você. A minha filha (Izabella) tem sonhado muito com ela, volta e meia ela tem falado disso. Nos últimos momentos, estávamos vivendo dia por dia, torcendo por ela, unidos. Foi uma época bem tensa, mas a gente estava tentando processar e entender que a morte faz parte da vida. É um fim, mas é um começo também.

“Eu sei que todo mundo aqui tem que cumprir um contrato de alma, para a gente se encontrar depois em outro lugar. Ela cumpriu o dela, e a gente vai seguir”

Você falou da Izabella. Como era a relação dela com a Rita?

Era uma relação de muita cumplicidade. Elas iam para o quarto da minha mãe, ficavam as duas conversando, rindo. Foi muito impactante a chegada da minha filha, porque fez com que a minha mãe entendesse o alcoolismo como uma doença. E a Iza deu um estalo nela, coisa que até então ela não tinha tido. Quando a minha filha nasceu, foi um gatilho. Foi incrível o poder disso. Elas tinham uma superamizade, minha mãe adorava tirar sarro das coisas de criança, desmistificar isso, principalmente o universo feminino. Elas eram bem grudadas, a Iza sente muita falta dela.

Os Titãs estão rodando o país com a turnê Encontro. Como chegou a notícia que eles fariam esse projeto?

Foi um pouco antes da turnê do disco Olho Furta-Cor (2022). Os Titãs merecem isso, são anos e anos construindo essa carreira (de quarenta anos), com esse repertório incrível. Meu lado fã ficou muito feliz. E a nossa formação continua, no paralelo, ela não deixou de existir. É importante eles comemorarem esse capítulo, porque eles merecem, são batalhadores, ralam para caramba e fazem muita gente feliz.

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No último disco dos Titãs, vocês gravaram a música Caos, parceria sua com seus pais. Sua mãe deixou mais letras para serem lançadas?

Essa foi a última que a gente gravou. Mas tem muitas letras que o meu irmão João achou. Outro dia, fuçando em umas coisas da minha mãe, também encontrei folhas avulsas, com a caligrafia dela. Falei: “Isso só pode ser letra”. E realmente eram esboços. Nós, como filhos, estamos unidos nesse propósito, de ver o que lançar primeiro. Temos planos, Dona Rita continuará ativa.

Publicado em VEJA São Paulo de 5 de julho de 2023, edição nº 2848

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