A Cidade Bárbara
Ofuscada pelas vizinhas Estocolmo, Helsinque e Copenhague e distante da rota turística clássica, Oslo —a capital da noruega — proporciona uma experiência viking autêntica a quem se integra a sua rotina
Oslo não tem muitos pontos turísticos. Basta um dia para cumprir o roteiro básico. O parque de esculturas de Gustav Vigeland atrai hordas todos os anos. Dali para o Viking Ship Museum são vinte minutos: o museu abriga navios dos bárbaros, descobertos no século XIX em escavações próximas à cidade. O dia termina com o pôr do sol visto do terraço da Ópera Nacional, obra de 2008 do escritório local Snøhetta — autor do memorial de 11 de setembro em Nova York. Do alto desse iceberg de concreto, avista-se o fiorde, o golfo entre as montanhas por onde o Mar do Norte banha Oslo. Nesse ponto, a maioria dos visitantes zarpa para o litoral. Mas quem decide observar o movimento ao redor do teatro nota que vale ancorar no território e se mesclar à cadência dos habitantes. Numa onda similar ao impacto do Guggenheim em Bilbao, na Espanha, da Ópera irradia uma efervescência. Instituições culturais, cafés e parques pipocam na região. “Vivemos um período de mudanças, financiadas pelo petróleo”, diz Erlend Haffner, sócio do escritório de arquitetura Fantastic Norway. A Noruega é o quinto maior exportador do combustível. Os operários do óleo recebem 20 000 reais por mês, o dobro da média salarial do país. “Essa riqueza preserva a qualidade de vida e o ritmo calmo. É por isso que aqui é um dos melhores lugares para morar, divertir-se e criar os filhos.”
Quando confrontada com Estocolmo (a chamada Veneza do Norte), Copenhague (código postal do melhor restaurante do mundo, o Noma) e Helsinque (terra do design), Oslo é a capital escandinava menos cosmopolita. Registra 3,7 milhões de diárias por ano (75% do check-in nos hotéis é feito por noruegueses) — uma gota no oceano turístico se comparada a Paris, com 40 milhões de diárias anuais. Oslo é também mais cara: uma xícara de café custa 10 reais. A bebida é um bom jeito de começar o mergulho na cultura local. Com cerca de 600 000 habitantes, a cidade tem uma população equivalente a de um município como Uberlândia, no interior de Minas Gerais. Estima-se que cada um dos moradores beba 1 200 xícaras por ano, acompanhadas de pão seco com camadas de geleia e brunost, o queijo de cabra marrom criado por uma camponesa de Gudbrandsdalen, nos arredores da capital, em 1880, e peculiar até para os vizinhos do Norte. Por mais que o desjejum do estrelado e centenário Grand Hotel seja tentador, vale reproduzir o hábito de se encontrar cedinho nos cafés e padarias. O pioneiro é o Java, na região do Parque St. Hanshaugen. O estabelecimento é vizinho da mercearia Gutta på Haugen, reduto dos gourmets, e da confeitaria Pascal, que serve tortas apetitosas. No agitado bairro de Grünerløkka, o premiado barista Tim Weldelboe prepara doses de grãos selecionados em diferentes países. O Café Fuglen é o cenário perfeito para degustar cafés e o akvavit, licor de batata típico: móveis assinados por estrelas escandinavas dos anos 50 e 60 (do ilustre Arne Jacobsen aos menos conhecidos) decoram o espaço e estão à venda. Nos endereços da Åpent Bakeri, padaria louvada por dez entre dez locais, os destaques são os mais de quinze tipos de pão. Num dia ensolarado, prepare-se para disputar vaga com os carrinhos de bebê. A licença-maternidade norueguesa dura um ano, e o estabelecimento é um reduto de pais exibindo orgulhosamente seus filhotes. Refeições respeitáveis também fazem parte do cardápio da cidade. Dos sócios Esben Bang e Pontus Dahlstrøm, o Maaemo lidera a lista: é o único restaurante nórdico que recebeu, depois de quinze meses de funcionamento, duas estrelas no guia Michelin. Ali, o conceito de produtos locais é levado à risca: ingredientes e temperos são colhidos pela equipe nos bosques que circundam a cidade, acessíveis até de metrô. Aberto há menos de um ano, o Onda, o mais caro da cidade, fica à beira-mar e não aceita acomodar mais de quatro clientes em uma mesa. No verão, quando o sol se põe às 23 horas, o melhor é reservar um lugar no Grefsenkollen, que oferece uma vista panorâmica e um resumo do melhor de Oslo: dele se avistam das casinhas coloridas de madeira aos prédios de arquitetura industrial, do museu de tecnologia à enorme quantidade de cogumelos cantarelle blueberries selvagens, que levam noruegueses à caça durante os meses de outono.
Com temperatura negativa em grande parte do ano e a luz do dia que dura apenas seis horas no inverno, os nativos aproveitam ao máximo a estação mais quente. Em julho, a cidade inteira decreta férias, e muitos comerciantes fecham as portas. Em agosto, quando o termômetro marca até 25 graus, é nos mais de cinquenta parques e inúmeras praias urbanas que as pessoas se reúnem no fim do expediente, às 16 horas. Mercados de pulgas são a atração dessa época, e as exposições do Centro de Design e Arquitetura (DogA) são concorridas nos dias frios. À noite, bares e casas de show garantem a média de 5 000 apresentações anuais, da ópera ao black metal nacional. Nos domingos, performances e espetáculos de música experimental ocupam o lado de fora do Henie Onstad, a trinta minutos de carro do centro. O Museu de Arte Contemporânea é um dos ícones da arquitetura no país. Também aos domingos abre um dos tesouros mais escondidos da capital: o ateliê de Emanuel Vigeland, irmão do escultor Gustav. Emanuel pensou em transformar o espaço num museu, mas decidiu fazerdele seu mausoléu. São 800 metros quadrados cobertos por um afresco. Não se pode subestimar a programação de outono na cidade. A Exposição Nacional de Outono, que ocupa o prédio da Casa dos Artistas desde 1930, apresenta os melhores trabalhosde artistas contemporâneos desde 1882. Sem pré-requisitos para a inscrição, a mostra é uma das mais democráticas e uma boa oportunidade de revelar talentos. Foi ali que um quadro de Edvard Munch, cultuado pela tela O Grito, foi comprado, em 1891, por apenas 200 coroas (cerca de 60 reais). Com tanta vida “lá fora”, a melhor maneira de se locomover por essa pequena cidade é a caminhada. Além de evitar o trânsito (o horário de pico vai das 15h30 às 16h30), não existe ocasião melhor para espiar os noruegueses sorrindo sozinhos pelas calçadas,comprando frutas silvestres ou jogando conversafora num café. Tempo é o maior luxo que Oslo pode oferecer a seus habitantes — ou aos que apenas passam alguns dias ali.
Grand Hotel. Centenário, é o favorito dos viajantes com título de nobreza e vencedores do Prêmio Nobel, que ocorre na cidade desde 1901. Karl Johans Gate 31, grand.no. Diárias de verão a partir de 480 reais
Grims Grenka. Decoração minimalista, night club e um bar no terraço para ver a cidade. Kongens Gate 5, firsthotels.com. Diárias de verão a partir de 450 reais
Air France. Voos diários, com escala em Paris, a partir de 2 240 reais
TAM. Voos diários, em parceria com a Lufthansa, via Frankfurt, a partir de 2 330 reais