MAC-USP exibe primeira retrospectiva da artista plástica Suanê
Museu reúne mais de sessenta obras da pernambucana radicada em São Paulo
Sete décadas em São Paulo não foram capazes de apagar as raízes pernambucanas de Lúcia de Barros Carvalho (1922-2020). Até sua morte, aos 98 anos, a artista plástica mais conhecida como Suanê viveu uma rotina discreta e distante do circuito artístico da capital paulista — onde terá, a partir de sábado (20), a primeira retrospectiva de seu trabalho, exibida no Museu de Arte Contemporânea da USP.
“São Paulo foi um meio para se tornar artista, mas ela mantinha a conexão com o Pernambuco ‘cósmico’, que não é necessariamente real e histórico, e sim um território de seus sonhos e lembranças”, define o curador responsável, Tálisson Melo.
A partir desse olhar, a mostra O Pernambuco Cósmico de Suanê reúne cerca de sessenta pinturas, incluindo itens de coleções particulares e do acervo preservado pela família da artista.
“Fizemos um levantamento de tudo o que tem por aí e recuperamos algumas obras, porque ela vendeu um pouco nos anos 1980”, explica Talita Desserie, que conduz o trabalho de preservação do acervo em parceria com Fernanda Gonçalves.
Com produções que vão de 1946 a 2019, a seleção inclui a têmpera sobre madeira Santa com Anjos (1946), retratando Nossa Senhora da Conceição, cultuada em Águas Belas, sua cidade natal. “É uma das primeiras de Suanê, feita com um altar e bandeirinhas de São João, que aparecem até nas obras pintadas por ela nos últimos anos de vida e são representações de festa e ancestralidade”, descreve Tálisson.
Criações como Enterro na Rede (1946) e Interior de Fazenda (1946), ambas parte do acervo do MAC, surgem ao lado de Tsakhakat-xua em Duas Cores (1988), que registra a influência do povo fulni-ô em sua infância e também integra a exposição. Pinturas da “fase cósmica”, do final da década de 1980, completam a curadoria.
“Assim como duas pinturas feitas pela mãe dela, Dona Francisquinha, quando Suanê a ensinou a pintar em seus últimos anos de vida”, adianta. “E um retrato da artista feito pelo marido, Nelson Nóbrega.”
Embora tenha deixado sua marca na cidade ao assinar os afrescos da Capela do Morumbi, nos anos 1950, a artista passou longe do mercado da arte e de grandes exposições, exceto em ocasiões como a I Bienal Internacional de São Paulo, no início de 1950, e em salões internacionais de cidades como Paris, Tóquio e Santiago.
“É uma artista que sofreu um apagamento pessoal por ter sido muito exigente consigo mesma. Nem ela nem o marido gostavam de se mostrar e, assim, Suanê ficou à margem, por ter essa autocrítica”, opina Talita.
“Suas pinturas tiveram um papel importante na projeção do Nordeste no imaginário da metrópole paulistana. Ela trouxe nuances à imagem estereotipada que se construiu sobre a região, falando de vida e de festas em um lugar marcado pela ideia de miséria”, completa Tálisson.
MAC USP. Avenida Pedro Álvares Cabral, 1301, Ibirapuera, ☎ 2648- 0254. Estreia sábado (20). Ter. a dom., 10h/21h. ♿ Grátis. Até 21/7. mac.usp.br
Publicado em VEJA São Paulo de 19 de abril de 2024, edição nº 2889