Ana Paula Padrão: “Nunca deixei a vida escolher por mim”
Após dez anos como apresentadora do MasterChef, Ana conta o que motivou sua saída do programa
Na família de Ana Paula Padrão, 58, o mais apaixonado pelas câmeras parece ser o Mané. Aos 8 anos, o cãozinho da raça cavalier king charles spaniel não recusa cliques e já se ajeita toda vez que surge uma câmera. Ana Paula, por outro lado, se diz introspectiva, apesar da desenvoltura comprovada após quase três décadas de jornalismo e dez anos no comando do MasterChef, do qual se despede no fim deste ano.
Anunciada há uma semana, sua saída foi decidida em comum acordo com a Band e antecede a última temporada de 2024, MasterChef Confeitaria, que já foi gravada e será exibida a partir de 19 de novembro.
Agora ela assume como CEO da escola Conquer Unna, nova unidade de negócios voltada para cursos de liderança feminina, com disciplinas como gestão de pessoas e formação de rede. Com Mané sempre a postos, Ana recebeu a Vejinha em seu apartamento, nos Jardins, para a entrevista a seguir.
Como foi a repercussão depois de anunciar a novidade?
As pessoas naturalmente esperam que eu continue na televisão fazendo outra coisa, então era importante comunicar que não era esse o plano. Nessa semana louca que vivi, não precisei em nenhum momento explicar às mulheres o que ia fazer, elas compreendem em uma frase: uma nova unidade de negócios dedicada a cursos para a liderança feminina.
O que motivou sua saída?
Passou na minha frente a oportunidade de aliar o principal interesse da minha vida ao trabalho. Desde 2010, faço eventos para mulheres. Quando olho meu caminho, a grande linha de coerência é a de uma mulher que fez as próprias escolhas e bancou as consequências. Nunca deixei a vida escolher por mim. “Ah, mas tem um preço, vão te cobrar.” Fui muito cobrada quando saí da Globo e do jornalismo porque eu era aprovada naquilo que fazia e as pessoas têm dificuldade de tirar você da sua caixa. Mas quero que outras mulheres possam fazer e bancar as próprias escolhas.
Como foi a mudança ao entrar no MasterChef e como está sendo agora?
Na mudança do jornalismo para o entretenimento, decidi que não queria mais fazer hard news. Estava há 28 anos cobrindo assuntos difíceis e queria ser uma pessoa comum que pega o congestionamento do feriado, aquele de ficar sete horas engarrafada! Quando a Band me disse MasterChef… Oi? Eu nem sabia o que era o MasterChef. Aí fui ver o formato e achei que tinha tudo a ver com o cliente brasileiro da televisão. Tem jogo, competição, comida e uma coisa que combina muito com essa pessoa: é inocente, não tem sexo, drogas, nem rock and roll. A família inteira pode estar na sala na hora que vai ao ar.
Qual é o impacto da sua saída para o programa?
Não acho que algum de nós seja insubstituível. De todas as saídas possíveis, a minha é a menos importante. Inclusive porque em muitos outros países o programa não tem a figura da apresentadora, só dos chefs. Lá no início fui importante porque comuniquei ao mercado que aquele produto era bom e merecia o investimento. Ninguém imaginava que a Ana Paula iria para algo ruim depois dos 28 anos de jornalismo sério. Depois disso, gente, são dez anos. O formato se fez.
O que o novo cargo tem de parecido com seus últimos trabalhos?
A principal qualidade de um bom jornalista é ser curioso, e eu sou muito. Não nasci pronta, tive a vantagem de ter um pai que não me limitou para adquirir conhecimento e me posicionar no mundo. Minha mãe parou de trabalhar quando nasci, então todo o script da família tradicional brasileira estava lá em casa. E, ainda assim, meu pai nunca me preparou para ser uma dona de casa. Pelo contrário, acho que teria ficado decepcionado comigo se eu desejasse apenas ser mãe, que é uma escolha legítima como qualquer outra. Não tive a limitação inicial de um ambiente familiar que não apostasse na possibilidade de construir uma carreira. Mas isso não é a lógica do Brasil e da cultura.
Qual era sua ambição no início?
Era estar onde as coisas estão acontecendo. Sou de uma cidade muito atípica, Brasília, e nasci perto da inauguração. Só saí do país pela primeira vez aos 23 anos, com o que ganhei no meu trabalho. Meus pais não viajavam ao exterior, viajaram depois que comecei a levá-los — meu pai não porque tinha medo de avião (risos). Não era uma família com condições financeiras. Então queria muito fazer algo que me levasse para outros lugares.
E qual é a sensação de hoje poder ter o que quiser, financeiramente falando?
Não é exatamente o que eu quiser…
O que não daria para ter?
Um helicóptero (risos). Não, não daria para ter muita coisa. Obviamente minha vida é muito confortável, mas, quando você não tem, valoriza o poder do dinheiro. Não precisa ter uma bolsa mais cara. Pra mim, bolsa é até um bom investimento, aos 85 anos você ainda tem ela e continua usando. Mas um sapato caro é ridículo, compro todos os meus em liquidação ou de segunda mão. “Ah, usei duas vezes.” Passa pra cá!
A maioria das coisas que custam muito caro não faz mais sentido para mim. Eu me preocupo em ter dinheiro para envelhecer tranquilamente, isso sim. Então eu e o Gustavo (Diament, seu marido) fazemos muita conta para ter um parâmetro de quanto teremos aos 90 anos. Porque também não sou tímida sobre isso não: quero chegar bem até os 120… Pelo menos (risos)! Então vou ter que esticar muito esse dinheiro. Considerando que eu não fiz 60 ainda, vou viver outra vida minha.
Como é sua rotina atual?
Meu dia a dia é muito comum, de chegar em casa na sexta-feira à noite e só sair de novo na segunda-feira para o trabalho. E me divirto muito em casa. Boto a leitura em dia, passeio com o cachorro e gosto de cozinhar minha própria comida. Sou muito introspectiva e duas festas seguidas numa semana eu não aguentaria. É muita socialização. E eu já gostei muito de viajar por um ou dois meses, de hotel em hotel. Hoje tenho menos paciência para isso, prefiro ficar em um lugar.
Não sou tímida sobre isso: quero chegar bem até os 120 anos… Pelo menos!
A gente tem um apartamento em Lisboa e o meu sonho na vida é poder passar um mês no verão de Portugal. Com a gravação do Master é exatamente o contrário, a gente tem folga no verão daqui, mas, no verão de lá, estamos trabalhando ensandecidamente.
Você herdou algum hábito dos países que já visitou?
Basicamente, o interesse pelas comidas. Eu sou experimentadora, já comi gafanhoto, de tudo. E amo comida thai, adoro os temperos e fico procurando esses lugares. E não vou a lugar nenhum sem comprar um metrinho de tecido, sou colecionadora. Penduro muitos nas paredes, é algo que curto e trago sempre.
Quais são os clichês mais comuns sobre você que as pessoas ainda repetem?
“Nossa, ela é muito brava.” Eu? Não, eu levo as coisas a sério, o que é diferente. Eu sou a palhacinha do set, todo mundo fala isso, eu e (o chef Érick) Jacquin, os dois sagitarianos. Eu acordo rindo, cantando, em regra geral sou uma pessoa leve. Meu marido pode ter divergências comigo sobre ser brava (risos).
Publicado em VEJA São Paulo de 8 de novembro de 2024, edição nº 2918