Torcedores de outros estados têm pontos de encontro em São Paulo
Para curtir o Brasileirão, fãs do Flamengo, Fluminense, Atlético Mineiro, Bahia e Internacional formam animados consulados da bola
Vestidos com a camisa do clube e cercados de faixas alvinegras penduradas pelas paredes, dezenas de fãs acompanham a rodada do Campeonato Brasileiro no telão de um bar de Perdizes na noite de uma quinta-feira. A 7 quilômetros dali, outro grupo não desvia o olhar dos lances de uma partida em um restaurante no Paraíso decorado com bandeiras tricolores. A rotina é comum na capital, com a diferença de que eles não apoiam Corinthians ou São Paulo, mas agremiações de outros estados: no caso, Atlético Mineiro e Fluminense. Composto de pessoas que vieram morar aqui a trabalho, esse tipo de torcida se articula pela internet e escolhe um ponto de encontro permanente para assistir aos jogos, formando pequenos e animados consulados da bola.
A GaloSampa, por exemplo, se reúne no Bar do Parque, em Perdizes. “Não é uma organizada, apenas uma reunião de amigos”, diz o administrador Luciano Marques, um dos líderes do grupo. A concentração atleticana existe desde 2001 e já passou por seis sedes. Há quatro anos, em busca de um espaço maior, decidiu mudar do Itaim para o endereço atual. O dono do estabelecimento, o santista Roberto Arboleda, vê a invasão com bons olhos: ela representa 20% de seu faturamento. Em dias de futebol, são vendidas cerca 150 garrafas de cerveja à turma. Para evitar problemas, adeptos de outros clubes não podem aparecer no local em noite de jogo.
Seguindo uma liturgia semelhante à dos estádios, eles cantam seu hino, xingam os ataques adversários e se ajoelham nos lances mais perigosos. A parede é coberta por pôsteres, faixas e bandeiras nas cores branco e preto; a decoração fica guardada no próprio bar. São os clientes-torcedores que costumam providenciar quitutes mineiros e ajudam a preparar pratos como torresmo de barriga e feijão-tropeiro. A GaloSampa mantém um cadastro dos mais assíduos: são 350, dos quais cinquenta ingressaram no último ano.
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A organização é semelhante na Sampa Flu, facção do Fluminense criada em 2000 e que desde o ano passado se encontra no restaurante Delicacy, no Paraíso. Especializada em comida a quilo no almoço, a casa passou a abrir excepcionalmente nos horários dos jogos (à noite e nos fins de semana) somente para os cariocas. Nessas ocasiões, a dona do estabelecimento, Regina Rayes Nogueira, oferece um cardápio especial, com opções como isca de peixe, frango à passarinho, pastéis e batata frita — a conversão do restaurante em reduto tricolor lhe garante um faturamento adicional de pelo menos 10.000 reais por mês.
São-paulina, ela enfrentou um desafio duplo no dia 9: atender 36 pessoas e vê-las festejar a vitória justamente sobre seu time. Sob um coro que repetia “Fluminense, eterno amor”, alguns deles vestiam versões da camisa da Sampa Flu — existem três tipos, nas cores vinho, verde e branca, vendidos por 40 reais. Como tudo que envolve futebol, não falta superstição. O gerente de sistemas Carlos Alberto Côrtes Freitas, por exemplo, sempre acompanha os jogos na mesma cadeira. “No dia que saí daqui, perdemos”, justifica. Existem 280 pessoas cadastradas no e-mail do grupo.
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Para agradar ao freguês do futebol, não basta o telão. Promoções também são bem-vindas. O Sotero Cozinha Original, em Santa Cecília, baixou o preço (de 34 para 25 reais) do combinado de três cervejas, com porção de seis acarajés, exclusivamente para a Embaixada Tricolor SP, do Bahia. Mas a paixão vai além das ofertas. Para não perder a sede da Fla-Sampa, do Flamengo, o presidente da torcida, Rodrigo Fortuna, comprou uma parte do Badalo da Vila, na Vila Clementino, que estava à venda no ano passado. Uma das suas primeiras medidas foi mudar as cores internas do bar para vermelho e preto. Os rubro-negros correspondem a até 40% da receita do bar, principalmente nas fases de bons resultados em campo. Os cinquenta mais antigos, geralmente presentes a 80% das partidas, ganham carteirinhas que lhes dão direito a mesas reservadas.
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Apesar da organização e da seleção dos integrantes, as embaixadas do futebol vivem sob o olhar desconfiado e curioso dos clientes comuns. “O paulistano ainda não se acostumou a ver aglomerações de torcedores de outros estados”, afirma o engenheiro Luis Antonio Tiesto Santos, líder do Consulado do S.C. Internacional em São Paulo, que se reúne no Quintal do Espeto, em Moema. Aproximar-se dos ídolos do passado é outro objetivo dos consulados. Em 2007, o grupo gaúcho reuniu, em uma churrascaria no Morumbi, antigos jogadores, como o goleiro Gilmar Rinaldi (que atuou no clube gaúcho entre 1978 e 1985) e o zagueiro chileno Elias Figueroa (defendeu o colorado entre 1971 e 1977). Foi um momento que eles não esquecem.
Jogo Fora de Casa
Os endereços dos redutos do futebol na capital
GaloSampa (Atlético-MG)
Sampa Flu (Fluminense)
Embaixada Tricolor SP (Bahia)
Consulado do S.C. Internacional em SP (Internacional)
Fla-Sampa (Flamengo)