Thomaz Farkas tem livro e exposição no Instituto Moreira Salles
Aos 86 anos, ex-proprietário da Fotoptica foi um dos responsáveis por introduzir o modernismo no Brasil
O fotógrafo paulista Cristiano Mascaro se lembra bem de quando, ainda na infância, o jogo de futebol na rua com os amigos parava, os meninos apontavam para um elegante Citroën DS 19 e diziam: “Lá vem o dono da Fotoptica”. “O homem dava a impressão de ser sofisticado e importante. Nunca imaginei que, décadas depois, seríamos bons amigos”, conta Mascaro.
A pessoa em questão é Thomaz Farkas, um dos maiores ícones da fotografia brasileira e tema de uma retrospectiva no Instituto Moreira Salles, em cartaz desde sexta. ‘Uma Antologia Pessoal’ reúne cerca de 100 imagens realizadas entre as décadas de 40 e 70 e, como indica o título, é composta de registros escolhidos pelo próprio Farkas, de 86 anos, com assistência dos filhos João e Kiko. A seleção também rendeu um livro publicado pelo Instituto Moreira Salles (295 páginas, 85 reais), que administra seu acervo em regime de comodato. “Além de trazer os clássicos dele, a exposição conta com trabalhos inéditos descobertos enquanto pesquisávamos dezenas de negativos”, afirma João Farkas.
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Nascido em Budapeste, na Hungria, em 1924, Thomaz Farkas veio com a família para o Brasil seis anos depois. O pai, Desidério, dono e fundador da loja de equipamentos Fotoptica, presenteou-o com a primeira câmera aos 8 anos. Em 1942, o hobby ganhou ares de vocação quando o jovem de 18 anos ingressou no mítico Foto Cine Clube Bandeirantes, polo da fervilhante cena paulistana da época. “Tanto o fotoclube quanto a Fotoptica ficavam no mesmo prédio, na Rua São Bento, então eu passava toda hora por lá”, lembra Farkas. Entre outras figuras reveladas ali estão Geraldo de Barros (1923-1998), Chico Albuquerque (1917-2000) e German Lorca. “Fazíamos viagens juntos de ônibus, mostrávamos as coisas uns para os outros e víamos muita revista importada para acompanhar o que estava sendo feito na Europa.”
Essa brilhante geração introduziu o modernismo na fotografia nacional. No caso de Thomaz Farkas, as características mais marcantes incluíam flertes com o surrealismo, ênfase em detalhes quase abstratos de arquitetura e, sobretudo, flagrantes de personagens urbanos de São Paulo e Rio de Janeiro. A partir das décadas de 50 e 60, ele introduziu um aspecto mais documental e jornalístico nas obras, caso dos registros do princípio de Brasília.
Nos anos 70, época em que viajou país afora ao lado de cineastas para realizar filmes sobre regiões do Nordeste e da Amazônia (a chamada “Caravana Farkas”), incursionou pelo território da foto colorida, bastante presente na nova mostra. “Procuramos equilibrar todas as fases, desde o foco experimental do início até a pegada humanista da maturidade”, explica Sergio Burgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles. “Afinal, o Thomaz nunca foi escravo de tendências.”
Farkas destacou-se ainda como empresário: além da Fotoptica, vendida pela família em 1997, manteve uma galeria e uma revista para revelar talentos das câmeras. Tantas facetas resultaram em um estilo extremamente autoral e influente. Como afirma Cristiano Mascaro: “Vejo um filme de Fellini e sei na hora de quem é. Acontece a mesma coisa com as fotos do Farkas”.