Sem polícia, prefeitura aposta em ação integrada para acabar com “favela do crack”
Retirada de barracos começou nesta terça (14) e deve ser finalizada na quarta. Usuários vão para hotéis da região, terão comida e trabalho remunerado
De forma pacífica e sem a necessidade da ação da Polícia Militar, começou nesta terça-feira (14) o desmonte dos 187 barracos montados nas calçadas das ruas Dino Bueno e Helvétia, em um local conhecido como “favela do crack”, no centro de São Paulo. Conforme antecipou VEJASAOPAULO.COM, a ação da prefeitura teve início um dia antes do previsto e segue até esta quarta-feira.
Enquanto funcionários da prefeitura e usuários desmontavam as barracas nesta tarde, o consumo da droga continuava no Largo Coração de Jesus, ao lado onde estão as tendas improvisadas.
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Em um novo tipo de abordagem para tentar resolver o problema da cracolândia, a prefeitura de São Paulo também lançou nesta terça a Operação Braços Abertos. Com cerca de 180 profissionais das secretarias de Saúde, Trabalho, Assistência Social e Segurança Urbana, o objetivo é dar moradia, comida, trabalho e atendimento médico aos usuários de crack. Os primeiros a participar do programa são os moradores da “favela do crack”.
Os 300 usuários cadastrados no programa vão morar em quatro hotéis do centro, a poucas quadras da cracolândia. Famílias e casais permanecerão juntos. Já os solteiros devem dividir quartos em grupos de três e quatro pessoas. Durante o dia, eles vão trabalhar por quatro horas em parques e praças, exercendo funções de zeladoria e varrição. Os usuários usarão uniformes diferenciados – segundo a prefeitura, para “facilitar o monitoramento”. Precisarão ainda cumprir um expediente de duas horas em cursos de capacitação. No fim da semana, receberão o equivalente a 15 reais por dia trabalhado.
Os participantes do programa terão direito a três refeições diárias nos restaurantes Bom Prato do centro e, se necessário, vale-transporte até o local de trabalho – a maioria, porém, deve trabalhar na mesma região.
Não há uma regra que exclua automaticamente o participante do programa. Segundo a Secretaria de Assistência Social, mesmo que ele falte no trabalho por problemas com o abuso da droga, os 15 reais serão pagos normalmente. Entretanto, cada pessoa será acompanhada por um funcionário da ONG Brasil Gigante, que fará avaliações individuais de cada usuário. Se ficar constatado que algum deles não tem mais condições ou não mostra interesse em participar do programa, essa pessoa é descadastrada e perde o direito ao hotel, trabalho e refeições. Também não há uma data-limite para que os usuários deixem o programa por conta própria.
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Não haverá internação compulsória, mas os viciados que desejarem tratamento serão atendidos no Espaço Braços Abertos, na Rua Helvétia, no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) e no Serviço de Assistência Especializada (SAE), na Rua Cleveland, e ainda nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) da região. Segundo a prefeitura, de 1º a 10 de janeiro, o Espaço Braços Abertos – que já estava funcionando desde julho – encaminhou 253 usuários para tratamento.
Sem polícia
Lançada há dois anos pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), a Operação Centro Legal, que colocou a PM na Cracolândia, foi considerada um fracasso por especialistas – os usuários migraram para ruas adjacentes e até outros bairros. Em pouco tempo, voltaram para a cracolândia.
A prefeitura optou por não pedir ajuda à polícia – apenas a Guarda Civil Metropolitana (GCM) participa da ação. Serão 30 homens destacados para fazer rondas na região e impedir o ressurgimento de novas ocupações ilegais.
A reportagem de VEJASÃOPAULO.COM esteve no local duas vezes nesta terça-feira (15). Algumas barracas já estavam sendo desmontadas e os restos de papelão e madeira levados por caminhões e carretas. Os usuários pareciam dispostos a sair. “Faço o que mandarem. Não posso perder essa oportunidade”, prometeu Márcio Alan, de 42 anos.
Alan disse que os usuários se reuniram antes da retirada dos barracos para acertar que não haveria tumulto durante o processo de remoção. A prefeitura afirma que “98% dos moradores” sairão de comum acordo.
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“Ainda não sei no que vou trabalhar, mas fico feliz só em sair daqui”, contou Raquel, de 32 anos, que compartilhava um barraco minúsculo com a sua “mãe de rua”. Ela é uma das moradoras da favela, que tem 187 casas improvisadas ao lado do terreno da antiga rodoviária de São Paulo.