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“A Praia Grande está luxuosa, você fica bobo de ver”, diz urbanista Edison Eloy

Ex-chefe do conselho de arquitetos da Baixada Santista fala sobre as mudanças políticas na região, a atuação do PCC e o abandono do Ilha Porchat

Por Pedro Carvalho
11 dez 2020, 06h00

Em 2018, o senhor entregou dez propostas urbanísticas para o prefeito de São Vicente. Havia a expectativa de que a chegada de Márcio França (PSB) ao governo destravasse as melhorias para a região. Por que nada andou?

Exatamente porque São Vicente virou um feudo do Márcio França. Não tem diálogo. Quando fui mostrar as propostas para o Pedro (Gouvêa, MDB, atual prefeito e cunhado de França), ele disse: “Eloy, não perca tempo, nós vamos é asfaltar a cidade”. Não deu outra: as obras ficaram inacabadas e o asfalto ainda aumentou as enchentes.

Como a cidade “virou um feudo”?

O França fez uma primeira gestão revolucionária (1997-2000). São Vicente não tinha legislação, as praias não tinham nenhuma estrutura. Ele resolveu certas coisas e foi reeleito. Daí é aquela história: começou a dominar a máquina pública, a botar os parentes ali e criou um feudo. A cidade foi afundando. A infraestrutura parou no tempo, o município não tem planos. Não tem nem saneamento, o esgoto vai para a praia.

Mas o grupo dele perdeu as eleições de outubro. Vai haver uma ruptura desse ciclo?

Essa é a esperança. O Kayo (Amado, do Podemos) é um cara da cidade, tem 29 anos, supostamente honesto. Na outra eleição, pegou em segundo lugar raspando. Ficou quatro anos se preparando. Mas vai enfrentar resistência grande da turma do França.

“São Vicente é um feudo do Márcio França. Não tem diálogo. Levei propostas e o prefeito disse: ‘Nem perca tempo’ ”

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Tem algum exemplo de cidade da Baixada Santista que resolveu seus problemas na última década?

A Praia Grande é essa exceção. Era um reduto daquelas excursões de sindicatos, do turismo de um dia — vulgo farofeiro —, que só detonava o município. O prefeito (Alberto Mourão, PSDB, no quinto mandato intercalado) fez uma legislação que impediu esse tipo de uso. Mas tem uma mágica na Praia Grande: é um lugar que atraiu muitos proprietários de São Paulo, conseguiu vender apartamentos grandes para pessoas de fora. Essas pessoas pagam IPTU, mas não usam a infraestrutura do município, então a prefeitura consegue atender a população com essa grana.

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Por que ali o continuísmo deu certo e em São Vicente não?

Porque (na Praia Grande) eram empreendedores. O prefeito era um empresário e estimulou a construção civil. Fizeram as obras para lucrar, mas são benfeitas. Também promoveram boas parcerias com empresas. Por exemplo: chamavam a Coca-Cola para patrocinar um quiosque, mas faziam um concurso para criar um quiosque decente. A Praia Grande mudou muito. O Canto do Forte tem apartamentos luxuosos, de quatro dormitórios. O (Litoral Plaza) shopping tem lojas de grife, você fica bobo de ver. A entrada parece Miami.

Santos é outra cidade que não consegue atrair mais tantos turistas paulistanos. O que falta ali?

Santos é a mesma coisa: tem um dono, que é a família Mendes. Seria preciso mexer no centro histórico, a região do porto, que está semiabandonada. Tem um monte de projetos para os pavilhões abandonados, mas é sempre um litígio com a União. Agora tem um cara linha-dura no porto, que não quer saber de conversa. O ideal seria fazer como Buenos Aires, ou mesmo Belém. É a briga eterna de levar habitação para o centro. O mesmo problema de pouca atividade e muito imóvel abandonado.

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As áreas de favela aumentaram na Baixada? O PCC também tem atuação por lá?

As áreas não cresceram tanto, graças a um bom trabalho da Cetesb. Sobre o PCC, é o mesmo filme das áreas de mananciais invadidas em São Paulo. O México 70, um bairro de palafitas em São Vicente, quem toma conta é o PCC. Eles também entraram nas máfias de transporte urbano e em outras atividades do município.

Há solução?

É preciso criar atividades econômicas que permitam que essas pessoas não apenas sobrevivam, mas que melhorem, inclusive culturalmente. Como a ideia de fazer marinas em São Vicente e Santos, algo que venho propondo.

Qual é a situação do Club Ilha Porchat? Acha que a liberação dos cassinos, em discussão no Congresso, pode ser uma boa ideia?

O Ilha Porchat está todo endividado, deve IPTU para caramba. E já perdeu o glamour, quase não tem mais associados, ninguém paga mais nada. Um grupo árabe tentou ressuscitar o cassino uns dois anos atrás, seria um baita empreendimento, e foi ver uma área no Guarujá, também. Mas tudo dependeria dessa liberação, que não andou. Fiz um monte de reuniões no Ilha Porchat, me ofereci para recuperar. O lugar é cinematográfico.

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Em 2020, houve alta de 64% na venda de imóveis na Baixada Santista. A pandemia trará mudanças à região?

A procura foi generalizada, em todo o entorno de São Paulo. Muita gente saiu da cidade. Minha filha morava perto de Congonhas e se mudou para a Aldeia da Serra, e você não acha mais casa para alugar na região. Se vai trazer benefícios à Baixada, acho duvidoso. Porque vai ter tanta perda financeira no caminho, vai morrer tanta gente… A pandemia não acabou e afeta principalmente a população de baixa renda.

Que sugestão faria ao próximo prefeito de São Vicente, cidade onde o senhor morou por sete anos?

Ele precisa retomar os planos da cidade: plano diretor, plano de resíduos sólidos. São Vicente ainda tem lixão! Está interditado, mas mora gente. A cidade não tem sequer reciclagem, incineração. Todo o lixo da Baixada é levado para o ABC de São Paulo, o que é inacreditável.

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Como será o Ano-Novo da pandemia na Baixada Santista?

Santos tem feito um controle maior, está fazendo barreiras nas entradas, vai ser mais controlado. Não vai ter mais o foguetório. Mas é inevitável, as pessoas irão para a praia, vão beber… E os hospitais não dão conta. Você tem bons médicos em Santos, mas em São Vicente não tem nada.

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Publicado em VEJA São Paulo de 16 de dezembro de 2020, edição nº 2717

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