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Piorou? Melhorou?

Por Ivan Angelo
Atualizado em 5 dez 2016, 19h44 - Publicado em 18 set 2009, 20h19

Quer ver uma coisa que piorou? A roubalheira. Sempre houve? Sempre houve. Mas era aquela coisa de comerciante tubarão, juiz ladrão, ratazana da política, delegado de polícia na caderneta de bicheiro, pelegos nos sindicatos, jabaculê para tocar música no rádio, essas tropicalidades. Eram identificáveis, se alguém quisesse identificá-los, privilegiados que estavam em posição propícia. Não era essa coisa geral de cento e tantos deputados, contas de milhões de dólares no exterior, anões de orçamento, toneladas de maconha, cocaína e armas circulando em tours rodoviários, liberadores de pagamentos municipais, estaduais e federais, intermediários, lobistas com maços de dinheiro nas maletas de laptops, meeiros de caixa dois, policiais e advogados quadrilheiros… Piorou.

Mas tem coisa que melhorou. A televisão não melhorou? Melhorou, ô se melhorou. Tem muita porcaria, isso tem, vai ver até mais do que antes, porque aumentou a quantidade de programas e de canais. O que tem de pior hoje são restos do que já era ruim: novelas, humorísticos, shows bregas, incluindo aí os exorcismos. Ninguém vai negar que a tecnologia melhorou, e a dramaturgia, a interpretação, o jornalismo.

Olha uma coisa que piorou demais: torcidas de futebol. A rivalidade era ruidosa mas pacífica. Não havia nem torcida uniformizada, ninguém se disfarçava de multidão. Dentro ou fora dos estádios, torcedores eram pessoas comuns da cidade, um pai, um filho, uma namorada, vizinhos. Não havia paus, pedras e bombas de cada lado, apenas gritos, gozações, risadas. Os estádios não eram essa arena de hoje, eram mais um teatro em que se representava a tragédia da derrota, o drama do empate, a comédia da vitória.

Melhoraram os cinemas, que nem pulgas têm mais.

Piorou o Carnaval, aprisionado nos sambódromos.

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Ah, melhorou muito o telefone. Pouco tempo atrás, era uma coisa falar ao telefone. Interurbano? Ligava-se para uma telefonista, que ligava para outra telefonista em outra cidade e esta ligava para a casa da pessoa, fazendo a ponte. Dependendo do tráfego, isso podia durar duas horas, três. Em cidades pequenas, onde não existiam aparelhos nas casas, as pessoas eram chamadas ao posto telefônico. Quem ligava ficava no posto da sua cidade esperando horas. Havia filas nos postos, e nem sempre dava certo: “Piracicaba está sem comunicação”. E as linhas residenciais e comerciais? Caríssimas! Entravam na declaração de bens do imposto de renda, coisa de classe média para cima. Olha: um drama. Melhorou demais.

A escola pública: nossa! Essa piorou – e como! Hoje até dão o que não davam: uniforme, comida, dentista. Mas não dão o que davam: educação. No ensino fundamental, formam até analfabetos. Os dentes das crianças brilham; os cérebros saem embaçados. Leitura, conhecimentos básicos, educação civil, respeito às regras e aos professores – cadê?

A medicina melhorou. Antigamente até gripe matava.

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O Natal piorou, envolvido pela avidez e pelo comércio.

O correio melhorou, para quem tem internet.

A poluição piorou, nos rios, na terra, nos muros, no ar.

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A indústria melhorou, o produto nacional tem prestígio.

Pioraram muito os reformatórios para menores. Juntam todos os recolhidos num grande curral, e tome lambada. Não é assim que se “reeduca”. Reeducar como, se a maioria nunca antes foi educada? Fortes misturados com fracos, escolados com aprendizes, criminosos com vítimas – um fracasso anunciado.

Umas coisas melhoram, outras pioram. Não sejamos pessimistas. Algumas que tinham piorado, como o cinema nacional, como a inflação, voltaram a melhorar. O povo brasileiro, numa enquete nacional, declarou-se predominantemente feliz. É isso, entre um tranco e um barranco, vamos indo.

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