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“Pequena África”: Sítio arqueológico Saracura começa a ser resgatado

Vestígios de quilombo que existia na região do Bixiga foi encontrado nas obras da futura linha Laranja do Metrô

Por Hyndara Freitas
27 jan 2023, 06h00
Obras da parada 14 Bis, da futura Linha 6 - Laranja do Metrô.
Obras da parada 14 Bis, da futura Linha 6 - Laranja do Metrô. (Linha Uni/Divulgação)
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Encontrado por acaso durante a escavação da parada 14 Bis da futura Linha 6-Laranja do Metrô, no bairro do Bixiga, o sítio arqueológico da Saracura começa enfim a ser resgatado. Após uma previsão de que a tarefa seria iniciada em 2022, a empresa A Lasca, responsável pela escavação histórica, deu a largada no processo na última segunda-feira (23).

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O bairro era atravessado por um córrego chamado Saracura. O quilombo da região, um dos maiores da cidade, ficou conhecido como “Pequena África”. Abrigou “aquilombados” — pessoas escravizadas e descendentes que fugiam das senzalas — desde o início do século XIX, segundo os historiadores. A área teria sido, ainda, um dos berços paulistanos do samba de bumbo e do batuque — não à toa, é onde nasceu a escola de samba Vai-Vai, em 1930.

As obras da Linha Laranja, prometida para 2025, são acompanhadas desde o início pela consultoria arqueológica A Lasca. Após a descoberta, em abril do ano passado, a construção chegou a ser suspensa temporariamente. Acabou retomada, mas passou a ser monitorada de perto pelos arqueólogos até que houvesse segurança para o resgate dos materiais históricos.

Mapa de 1985: quilombos foram historicamente invisibilizados, e coletivo da região do Bixiga luta para mudar isso.
Mapa de 1895: quilombos foram historicamente invisibilizados, e coletivo da região do Bixiga luta para mudar isso. (Reprodução/Reprodução)

Os vestígios arqueológicos estavam soterrados entre 3 e 5 metros da superfície. Logo no início das escavações, foram descobertos itens como garrafas e louças que retratavam a vida no quilombo. “São elementos que contam a história de uma sociedade de maneira diferente. A documentação histórica tem um viés: o olhar de quem informava. Com os artefatos, a gente entende o cotidiano de outra maneira”, afirma Lúcia Juliani, sócia da A Lasca. Após a coleta, os itens resgatados são limpos e catalogados. A consultoria faz, então, um relatório que situa os achados dentro do contexto histórico, com pesquisas bibliográficas. Depois, vão para instituições especializadas como o Centro de Arqueologia de São Paulo e o Museu de Arqueologia da USP. Um parecer do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) considerou o sítio como “elemento de valorização, identificação e pertencimento de grupos vulneráveis e silenciados do povo brasileiro”.

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Um coletivo de moradores atua para que a estação 14 Bis receba o nome de Saracura-Vai-Vai. Há um abaixo-assinado com mais de 2 800 assinaturas pela proposta. Nas redes sociais e em manifestações no processo arqueológico da Linha Laranja no Iphan, o grupo — composto principalmente de ativistas, sambistas, historiadores, arqueólogos e arquitetos — pede que as obras sejam suspensas até que exista um projeto de preservação dos achados, que incluiria a construção de um memorial na estação. Também demandam que a guarda dos vestígios fique sob responsabilidade de uma instituição especializada em patrimônio negro, como o Museu Afro Brasil.

Um dos achados do sítio arqueológico Saracura.
(A Lasca em relatório ao Iphan/Reprodução)

Em nota, a Linha Uni, concessionária responsável pelo ramal, afirma que trabalha “na caracterização da descoberta” e que os materiais serão investigados e catalogados. “Com a aprovação do Iphan, eles serão encaminhados para o acervo do Centro de Arqueologia de São Paulo, vinculado ao Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura. Posteriormente, com a devida autorização das autoridades competentes, a Linha Uni, em conjunto com a comunidade do entorno, poderá promover exposições de forma a ampliar o direito de acesso e conhecimento do material encontrado”, diz a nota.

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Não é incomum que achados arqueológicos aconteçam em obras ferroviárias de São Paulo. Por lei, qualquer grande construção, pública ou privada, precisa de acompanhamento especializado no assunto. A expansão da Linha 2-Verde até a Penha, por exemplo, é alvo de uma ação do Ministério Público Federal por atravessar o Parque Linear Rapadura, um sítio arqueológico. O projeto visa construir um pátio de trens no local. O processo não foi julgado. Na própria Linha Laranja, foram encontrados itens de valor arqueológico nas futuras estações São Joaquim, Santa Marina e Pompeia, mas o “Saracura-14 Bis” é visto como o mais relevante até o momento.

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Publicado em VEJA São Paulo de 1 de fevereiro de 2023, edição nº 2826

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