MBAs e especializações tornam-se populares
Com uma oferta que dobrou nos últimos cinco anos, é preciso atenção para acertar na escolha
“Como vocês escolhem um supermercado?”, pergunta a professora. Sem acanhamento, os alunos passam a enumerar os fatores: localização, variedade de produtos, preço… Dois deles trabalham exatamente em uma rede do setor, o Carrefour. Outros vêm de empresas como Itaú Unibanco, Nestlé, Gerdau e Google do Brasil. Estamos em uma aula sobre posicionamento de marcas (ou ‘branding’, para os iniciados) no MBA em gestão empresarial da Fundação Instituto de Administração (FIA), no Butantã. Lá, os estudantes-executivos discutem questões de seu dia a dia, quase sempre com um olho na lousa e outro no laptop. Cenas como essa tornaram-se cada vez mais comuns nas chamadas escolas de negócio paulistanas. São, entretanto, apenas parte do universo da pós-graduação, cujo crescimento significativo vem sendo apontado por especialistas em educação, consultores de carreira e docentes.
Fernando Moraes
ESTREIA PROMISSORA Pós-graduados em computação gráfica 3D pelo Centro Universitário Senac, Alexandre Vieira e Bruna Bonadio trabalharam como animadores no curta-metragem Musa Divinorum, lançado no dia 11. O convite veio do professor Carlos Eduardo Nogueira, diretor do filme
Não há dados oficiais sobre o número de especializações e MBAs existentes no país. Desde que sigam um conjunto de regras definido pelo Ministério da Educação (MEC), as instituições de ensino podem criar cursos sem necessidade de aprovação prévia. E elas não se fazem de rogadas. Para acompanhar a evolução desse tipo de pós, VEJA SÃO PAULO realizou um levantamento em cinquenta das principais escolas da cidade. Há cinco anos, elas ofereciam 1 014 cursos. Hoje, são 2 000. Um aumento de 97%. Só de MBAs, a Associação Nacional de MBA (Anamba) estima que sejam mais de 1 000. “Mas apenas 100 podem ser considerados relevantes”, diz o professor Armando Dal Colletto, conselheiro da associação. “Alguns, apesar da sigla, que significa master in business administration, nem tratam de administração.” A oferta acompanha o crescimento no número de egressos da graduação. Conforme o censo mais recente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão ligado ao MEC, 88 756 pessoas concluíram a graduação em 2008 na capital. Três anos antes, esse número foi 11% menor.
Fernando Moraes
MUDANÇA DE RUMO Aos 32 anos, a farmacêutica Leticia Vasconcelos já não vive mais de fórmulas químicas. Com passagens por grandes empresas, ela comanda a área de planejamento de demanda e abastecimento de uma multinacional. Decidiu investir no MBA em gestão empresarial para ter também uma formação em negócios
Fernando Moraes
SEM INTERVALO Tão logo terminou a faculdade, em dezembro de 2008, a fisioterapeuta Mariana Artilheiro começou uma pós em neurologia na Unifesp. O atendimento a pacientes do Lar Escola São Francisco, em Moema, faz parte do programa. “Se eu esperasse demais, teria dificuldade em conseguir emprego nessa área”, diz
“Com a chegada de novos profissionais, quem está no mercado há anos sente necessidade de atualização”, afirma José Antônio Rosa, consultor em recursos humanos e professor de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Seja para os recém-chegados ao mercado de trabalho, seja para os mais experientes, é preciso ponderação antes de sentar-se novamente em uma carteira escolar. Um mergulho no mundo da pós exige o conhecimento de suas subdivisões. Os programas stricto sensu (do latim, sentido restrito) são recomendados para quem deseja seguir carreira acadêmica. Avaliados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), englobam os seguintes cursos:
■ Mestrado: é voltado à formação de professores universitários e inicia o aluno na pesquisa acadêmica, além de ser pré-requisito para o início de um doutorado;
■Mestrado profissional: similar ao mestrado acadêmico, mas direcionado ao mercado de trabalho, com conteúdo que mistura teoria e prática, em uma carga horária menos rígida;
■ Doutorado: forma pesquisadores de alto nível. Para concluí-lo, deve-se defender uma tese original e inovadora que colabore para o avanço do conhecimento na área de estudo.
Se a ideia é obter apenas uma formação complementar, que traga novos conhecimentos para a vida profissional (e, consequentemente, uma atualização do currículo), deve-se optar pelos cursos lato sensu (do latim, sentido amplo), categoria em que entram a especialização e o MBA. Em comum, ambos precisam oferecer 360 horas de aula e ter no mínimo 50% dos professores com título de mestre ou doutor em seu quadro. Como é possível notar em qualquer rodinha de executivos, o MBA caiu no gosto da turma do terno e gravata. Deve dar base teórica e treinamento prático a quem deseja administrar uma companhia. Só a Universidade de São Paulo ofereceu 189 especializações nos câmpus da capital em 2009. Na lista atual da Faap constam cerca de 140 opções. É preciso ter cuidado redobrado na hora da escolha (veja dicas no quadro abaixo). “Mas mesmo a má educação é melhor do que nenhuma”, defende o economista Gustavo Ioschpe. “A pós funciona como um diferencial.”
PARA NÃO ERRAR NA ESCOLHA
O que levar em conta antes da matrícula
■É fundamental entender as diferenças entre mestrado, doutorado, mestrado profissional, especialização e MBA para descobrir qual atende melhor a sua necessidade
■Invista em uma instituição reconhecida e com credibilidade
■Tenha uma indicação. Converse com alunos e ex-alunos para ouvir opiniões sobre a dinâmica das aulas e a importância do curso na carreira deles
■Analise o corpo docente. Professores capacitados, com boa formação acadêmica e prática de mercado, quando necessário, são imprescindíveis para o sucesso da pós
■Cheque se o perfil dos alunos matriculados bate com o seu. Um trainee, por exemplo, pode se sentir um peixe fora d’água em uma turma de gestores
■Veja se a grade curricular contempla os assuntos de seu interesse
■Não faça várias especializações muito parecidas. Uma formação eclética amplia os horizontes
■No caso de MBAs, vale consultar os rankings para conhecer os melhores. Há listas baseadas na avaliação de alunos, empregadores e da comunidade acadêmica
■O preço dos cursos pagos também serve como termômetro. Se o valor for muito abaixo do da concorrência, desconfie
■Preste muita atenção às siglas e nomenclaturas. Nem todo curso vendido como MBA cumpre, de fato, o programa de um. Muitas entidades também oferecem cursos livres que não valem como especialização lato sensu
Uma pós-graduação pesa no currículo e influencia no contracheque. Pesquisa publicada em 2008 pela Fundação Getulio Vargas mostrou que cada ano de estudo adicional representa um aumento médio de 15% no salário. Mas essa não deve ser a única razão para alguém voltar aos livros. “O diploma não serve simplesmente para obter um emprego, mas para aprender a pensar”, acredita César Souza, presidente da consultoria Empreenda. Baiana radicada em São Paulo, a advogada Juana Melo Pimentel, de 33 anos, já fez uma especialização em direito empresarial e outra no novo Código Civil brasileiro. Agora, está terminando seu master of laws, espécie de MBA jurídico, em direito societário. “Esse último foi pago pela empresa”, conta a superintendente jurídica da Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário. “Como comando uma equipe de dez funcionários, pretendo ainda fazer uma pós em gestão de pessoas.”
Fernando Moraes
CURRÍCULO RECHEADO Superintendente jurídica da Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário, a advogada Juana Melo Pimentel tem em seu currículo duas pós. Está para concluir a terceira, em direito societário, e ainda quer especializar-se em gestão de pessoas
Uma das faculdades que aparecem no currículo de Juana, o Insper, antigo Ibmec, ministra seus três MBAs executivos em nove salas com planta semelhante às da Universidade Harvard, nos Estados Unidos. “O formato de ferradura facilita a interação entre professor e alunos”, explica Irineu Gianesi, diretor de pós-graduação lato sensu do Insper. Em março a escola começará uma reforma que ampliará sua área em 80%. Vinte novas salas no padrão Harvard devem ser erguidas. No interior desses centros observa-se a formação de uma grande rede de contatos entre estudantes, professores e palestrantes convidados. Trata-se de uma maneira de conhecer as referências e os jargões daquele nicho, de conviver com profissionais da área e dividir experiências. Dessa convivência, não raro surgem propostas de emprego. “No grupo de e-mails da minha turma trocamos informações e indicações”, diz Leticia Vasconcelos, aluna da FIA. Formada em farmácia, ela atua como chefe da área de planejamento de demanda e abastecimento de uma multinacional. Investiu na pós para consolidar sua mudança para o ramo executivo. Seu curso exige pelo menos três anos de experiência na área gerencial — condição fundamental para a maior parte dos MBAs do tipo. “Quem nunca administrou nada não consegue assimilar o conteúdo”, explica o headhunter Robert Wong.
Fernando Moraes
ACADÊMICO FASHION Um dos stylists mais requisitados da cidade, o professor universitário Marcio Banfi tem pósgraduação e está fazendo mestrado na Faculdade Santa Marcelina: “Sentia falta de uma formação teórica em moda”
Na área da saúde, a lógica é oposta. Assim que concluiu a graduação em fisioterapia, em dezembro de 2008, Mariana Artilheiro, de 22 anos, emendou uma especialização de nome complicado: fisioterapia motora hospitalar e ambulatorial aplicada à neurologia, na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Cumpriu horas de prática no Hospital São Paulo e no Lar Escola São Francisco, que promove a reabilitação e a inclusão social de deficientes físicos de baixa renda. “É preciso se especializar para ter sucesso no mercado de trabalho”, afirma. Graduado em artes plásticas, o stylist Marcio Banfi trabalhou, nos anos 90, como assistente do estilista Alexandre Herchcovitch. Só depois partiu para a especialização. “Sentia falta de uma formação teórica em moda”, lembra. Caso raro entre seus colegas do mundinho fashion, ele é mestrando e professor da Faculdade Santa Marcelina.
Fernando Moraes
BATALHA EM CLASSE O curso de estratégia militar para a gestão de negócios, da Faap, ministrado pelo coronel Rodrigues e pelo general Burgos, inclui liderança, geopolítica e viagem à Amazônia
Com tantas opções no mercado, vale quase tudo para se diferenciar e atrair alunos. Entre os catorze cursos lançados pelo Centro Universitário Senac neste ano, chama atenção o de administração de negócios do vinho. “Uma pesquisa mostrou que a oferta de vinhos no Brasil ainda é muito limitada por falta de conhecimento dos profissionais”, diz Juliana Trombeta Reis, criadora da especialização. “Queremos oferecer um panorama de toda a cadeia: produção, distribuição e venda.” A Faap acaba de formar sua primeira turma de especialistas em estratégia militar para a gestão de negócios. À frente do pelotão estão o general Antonio Burgos e o coronel Edson Rodrigues, ambos da reserva. “A estratégia nasceu na área militar e se aplica completamente à administração empresarial”, afirma Burgos. As relações são mesmo numerosas: liderança, geopolítica, prospectiva, logística e mobilização, inteligência e contrainteligência estão incluídas na grade curricular. Sem falar nas missões externas, como a viagem de sete dias à Amazônia para conferir a organização do Exército brasileiro. “Essa experiência agrega muito à vida executiva”, avalia o general. Seja em um auditório inspirado em Harvard, seja na selva amazônica, é tempo de volta às aulas.
CINCO MBAs BEM-CONCEITUADOS
Gestão de Luxo – FAAP
Pioneiro, traz conceitos de produção, distribuição, venda de produtos e serviços de luxo. Há doze candidatos para cada vaga. 4 semestres, 45 200 reais.
Master in information technology — Fiap
Tem disciplinas bastante específicas destinadas a profissionais com cargos de comando na área de tecnologia da informação. 3 semestres, 25 725 reais.
MBA marketing — FIA
Leva para a sala de aula discussões sobre as estratégias e a gestão de marketing nas empresas brasileiras e estrangeiras. 3 semestres, 35 840 reais.
MBA executivo em finanças — Insper
Com ênfase em finanças corporativas, foi lançado em 1987 e é certificado pela Association of MBAs (Amba). 4 semestres, 54 220 reais.
OneMBA — FGV
Totalmente em inglês, este programa executivo é oferecido em parceria com escolas de negócios dos Estados Unidos, Holanda, México e China. 3 semestres e meio, 112 000 reais.
CINCO ESPECIALIZAÇÕES CURIOSAS
Administração de negócios do vinho — Centro Universitário Senac
Oferece um panorama de toda a cadeia operacional do vinho, da produção à exposição nas gôndolas. Não é focado em degustação. 2 semestres 11 250
Design de interiores náutico esportivo — Centro Universitário Belas Artes
Específico para os interessados em design de embarcações. Há aulas sobre mobiliário, conforto e segurança do meio ambiente. 3 semestres, 22 572 reais.
MBA em gastronomia — Anhembi Morumbi
Administração, tecnologia, direito, economia e marketing, sempre relacionados aos negócios de gastronomia. 3 semestres, 16 803 reais.
Packaging 360º — Faap
Trata-se de um curso sobre embalagem destinado, principalmente, a designers gráficos e de produto. Entre as disciplinas, gestão da marca e inovação da embalagem. 3 semestres, 17 856 reais.
Personal training — Unip
Forma personal trainers, especialistas em programas de atividades físicas individuais. 2 semestres e meio, 3 133 reais.