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Prestes a desembarcar na COP30, Marcelo Rosenbaum fala sobre projetos em parceria com povos indígenas

Com quinze anos de parceria com comunidades tradicionais, arquiteto tem dois grandes projetos em Belém

Por luana.machado
24 out 2025, 08h00
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Marcelo Rosenbaum no Museu das Culturas Indígenas  (Carol Quintanilha/Veja SP)
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Quando o cacique Biraci Nixiwaká Yawanawá conheceu o arquiteto paulista Marcelo Rosenbaum, em 2012, no Festival Yawa — a maior celebração cultural e espiritual do povo Yawanawá —, ele não imaginava que dali surgiria uma parceria capaz de atravessar os limites da floresta. “Vi uma pessoa de bermuda sentada na poeira. Perguntei: ‘quem é esse maluco?’, porque ele não tinha se identificado. E é uma das coisas que eu mais admiro no Marcelo hoje em dia, a discrição”, lembra o líder da Terra Indígena que fica às margens do Rio Gregório, no Acre. Da relação nasceu um complexo arquitetônico que levou a Aldeia Sagrada Yawanawá para a Bienal de Veneza deste ano.

Construído com madeira nativa, cuidadosamente extraída sob o olhar dos moradores, e erguido em esforço coletivo entre o Escritório Rosenbaum, ribeirinhos e indígenas, o conjunto de edificações reúne a Universidade dos Saberes Tradicionais, a Casa Modelo e o Centro Cerimonial. “Foi a quebra de um paradigma para mim, fazer uma construção no meio da Amazônia, em um lugar de difícil acesso, com uma logística que custou três vezes mais que a obra. É um legado para os povos indígenas do mundo, uma inspiração para as novas gerações de que é possível fazer tecnologia com respeito às ciências ancestrais”, defende o cacique.

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A Universidade dos Saberes Ancestrais: estrutura em formato de Y, homenageando a etnia Yawanawá (Leo Finotti/Divulgação)

Mais do que edifícios, o complexo de três prédios propõe uma nova maneira de construir: unindo saberes tradicionais e contemporâneos, com tecnologia de ventilação cruzada que respeita o clima local. “Foram catorze anos de tentativas, respeitando o tempo da natureza. É uma obra fruto do protagonismo de um cacique, que conseguiu recursos a partir da arte local para me contratar e erguer construções que oferecem conforto térmico e durabilidade”, conta o arquiteto.

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Aldeia Sagrada: complexo inclui salas de aula, refeitório e vão livre para práticas (Leo Finotti/Divulgação)

Agora, mais de uma década depois do início do projeto pioneiro, Marcelo se prepara para apresentar dois grandes trabalhos na COP30 — a conferência mundial do clima, a ser realizada em Belém entre 10 e 21 de novembro — que não deixam de ser frutos do aprendizado junto aos Yawanawá. Um deles é a Aldeia COP, uma megaestrutura articulada pelo Ministério dos Povos Indígenas para abrigar 3 000 representantes de etnias da Bacia Amazônica e de outras regiões do mundo. Em meio ao cenário de especulação imobiliária que afeta os moradores da capital paraense e as delegações do megaevento, a iniciativa autogestionada ocupa mais de 72 000 metros quadrados da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará (UFPA), com alojamento, refeitório, arena de debates, casa de reza e feira.

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Dentre eles, 14 000 metros quadrados são de área já construída. “A ideia foi adaptar a infraestrutura existente e criar uma geodésica com passarela até a casa de reza. São construções leves, rápidas de montar e de baixo custo. Neste momento, estou na retaguarda, apoiando; quem está erguendo é a comunidade Guajajara”, explica Rosenbaum.

Paralelamente, ele finaliza a Casa Maraká, um casarão centenário no coração de Belém, na Avenida Nazaré — tradicional rota do Círio de Nazaré —, que abriga a Mídia Indígena, uma rede nacional com uma década de apoio a jovens comunicadores indígenas. “Nossa primeira parceria com o Marcelo foi em 2023 para a criação do Festival Brasil é Terra Indígena. De lá para cá, foram vários trabalhos. Então, o restauro dessa casa não poderia ser feito com outra pessoa. Ela materializa esses dez anos de pautas socioambientais, das artes e culturas indígenas”, explica Hony Sobrinho, coordenador de projetos na rede de comunicação.

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Casa Maraká: evento Varanda do Clima, no Círio de Nazaré, sediou encontros e apresentações com artistas em defesa da demarcação de terras indígenas (Olhar Chave/ Mídia Ninja/Divulgação)

Durante a conferência, a casa receberá uma exposição de fotógrafos indígenas, sessões de cinema e debates sobre demarcação de terras. “Foi uma honra receber esse convite do coletivo para desenhar uma casa que vai se tornar um legado pós-COP, quando ela se transforma numa escola para qualificar comunicadores”, celebra Marcelo, que participou do primeiro evento no casarão, realizado durante o último Círio, no dia 12 de outubro.

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Entre idas e vindas de São Paulo a Belém, ele retorna à capital paraense no dia 25 para montar a exposição Habitar a Floresta, em parceria com o também arquiteto Fernando Serapião. Ela abre no dia 30 e vai ocupar o mezanino do Centro Cultural Banco da Amazônia com uma curadoria que destaca catorze projetos, do Equador, da Bolívia, do Peru e da Amazônia brasileira. A mostra propõe um olhar colaborativo sobre a arquitetura tropical, valorizando iniciativas que fortalecem a permanência das populações locais em seus territórios.

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Ilustração digital da exposição no Centro Cultural Banco da Amazônia (Escritório Rosenbaum/Reprodução)

“Quem protege a floresta e mantém ela em pé são os povos indígenas dentro de áreas demarcadas. Mas ainda existem poucas oportunidades para garantir a permanência nos quesitos moradia, saúde, educação e geração de renda. Algumas delas são de escritórios incríveis que trabalham em prol de uma habitação de alto impacto social e com baixo custo”, afirma Marcelo.

Com o objetivo de amplificar o diálogo em torno de uma arquitetura em defesa da justiça climática, Rosenbaum se uniu à Unesp, ao Insper, à Escola da Cidade e à Casa da Floresta Ambiental para desenhar a primeira Bienal Indígena de Arquitetura e Urbanismo. O plano vai nascer de oito dias de escutas com os representantes dos povos na Aldeia COP. “Queremos uma curadoria feita por eles, que cause impacto na defesa da demarcação e no letramento do público não indígena”, adianta. Durante a agenda intensa da conferência climática, Marcelo também espera que o Conselho Indígena de Roraima — que reúne mais de trinta etnias — consiga captar recursos no evento para uma nova sede em Boa Vista, já projetada pelo Escritório Rosenbaum.

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O pós-COP promete ser igualmente movimentado, com construções em andamento em diferentes estados do Brasil. No Ceará, estão sendo erguidos treze edifícios com o povo Tremembé para a geração de renda. Na terra natal, Rosenbaum integra um time para a possível mudança do Museu das Culturas Indígenas, instituição onde foram feitas as fotos para esta reportagem. O acervo, que inclui uma instalação de Denilson Baniwa e murais de Tamikuã Txihi, está atualmente na Água Branca. A proposta é que vá para um prédio no centro de São Paulo, embora o plano ainda esteja em tratativas.

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Projeto Casa da Memória no Ceará, com o povo tremembé (Escritório Rosenbaum/Divulgação)

Com tantos trabalhos em andamento, Rosenbaum ainda toca o Instituto A Gente Transforma, que através do design fomenta parcerias com comunidades quilombolas, indígenas e ribeirinhas em várias regiões do Brasil. A primeira delas, junto às artesãs do quilombo de Várzea Queimada, que fazem arte com o capim-dourado do Cerrado, se transformou na coleção de luminárias Jalapoeira Apurada, que passou pela SP-Arte e está à venda na La Lampe. O projeto terá continuidade por mais três anos, com convênio da World Wildlife Fund, organização mundial voltada para a preservação da biodiversidade, que vai receber, em seu espaço próprio na COP30, Rosenbaum e lideranças quilombolas.

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Marcelo na Várzea Queimada, com chapéus feitos de capim-dourado (Loiro Cunha/Divulgação)
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Completando quinze anos de atuação em colaboração com comunidades tradicionais Brasil afora, Marcelo define o seu trabalho como uma ferramenta de amplificação cujo pilar é a aliança. “São projetos com muita gente envolvida, que só podem ser construídos em conjunto nos territórios; é intenso. Eu agradeço todos os dias por poder estar perto desses mestres, desses grandes detentores de conhecimentos”, afirma. A troca de ideias sempre nos leva adiante.

Publicado em VEJA São Paulo de 24 de outubro de 2025, edição nº 2967

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