Entenda o projeto de lei que permite criação de “Times Square paulistana”
Proposta de mudança da Lei Cidade Limpa gera controvérsia entre associações

Há dezoito anos, quem cruzasse a Rua Treze de Maio ou a Marginal Pinheiros estaria cercado de anúncios em plotagens, lambe-lambes, outdoors em semáforos e até nas fachadas de comércios e prédios. “Foi uma luta para aprovar a Lei Cidade Limpa em 2006. A capital estava encoberta, um horror”, lembra Edison Farah, presidente da Associação Viva o Centro, que integrou na época a campanha “Amo São Paulo. Quero minha Cidade Limpa”, em prol da aprovação da Lei 14.223 pela Câmara Municipal. A medida cria uma série de normas para coibir a poluição visual, como a proibição de anúncios em logradouros públicos, com exceção dos que celebram parcerias público-privadas, em árvores, obras de arte públicas, faixas e placas de sinalização de trânsito.

Quase duas décadas depois, os vereadores da capital aprovaram em primeira votação um projeto de lei que busca modernizar o dispositivo que regula a publicidade para gerar receita. Proposto em 2023 pelo vereador Rubens Nunes (União Brasil) — que enfrenta um processo de cassação na Justiça Eleitoral pela acusação de uso indevido de meio de comunicação social —, o PL visa a permitir a instalação de painéis publicitários luminosos sob diretrizes como não comprometer 30% da visibilidade de bens culturais e limites de área para imóveis públicos ou privados. “Não quero rever a Lei Cidade Limpa, mas criar um centro de publicidade, algo que se tornou popularmente conhecido como ‘Times Square’. Seria uma ‘Times Square’ paulistana. Para isso, é preciso uma pequena alteração para delimitar essa área especial composta exclusivamente por painéis de LED”, afirma o vereador.
Inicialmente, o projeto sugeria uma modificação mais ampla, o que foi alterado durante a tramitação e as tratativas com associações e entidades. Agora, quatro locais figuram como os mais cotados para receber a mudança: o cruzamento da Avenida Ipiranga com a São João, a Rua Santa Ifigênia, o Largo da Batata e a Avenida Paulista.
O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-SP) reagiu publicando, em junho, um manifesto contrário ao projeto com ilustrações em inteligência artificial mostrando possíveis efeitos. Representante do IAB na Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU), que atua junto à Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) no cumprimento da Cidade Limpa, Claudia Muniz indica que o órgão já recebeu várias propostas para instalação de painéis luminosos em edificações. “Quando a lei foi elaborada, os dispositivos não eram recursos utilizados pelos estabelecimentos. Uma atualização pode e deve ser feita, mas não de forma desenfreada. Primeiro, temos que conhecê-los em termos de preço, variação de luminosidade e de imagens, dimensões e carga de energia”, pondera a arquiteta, que cita a necessidade de um plano de ordenamento da paisagem urbana, algo previsto na diretriz de 2007. Agora, com o avanço do novo PL, a CPPU criou uma subcomissão para analisar os efeitos dessas tecnologias na paisagem urbana.

Apoiador da instalação da “Times Square” na Santa Ifigênia, Charles Resolve, presidente da Associação Geral do Centro de São Paulo (AGC-SP), que reúne empresários e moradores, cita o benefício econômico da medida. “A pandemia, com o crescimento do e-commerce, e a violência derrubaram o centro. Então, a gente recebe com muito entusiasmo, como uma ferramenta para reavivar mesmo. Porém, não concordo com a criação na São João porque é uma parte histórica e tem residências. Mas na Santa Efigênia seria maravilhoso, até por ser um polo tecnológico”, defende.
Outra associação da área, a Pró- Centro, concorda com o argumento da retomada financeira do centro por meio da flexibilização. “Quando aplicada a um perímetro controlado e acompanhada de regras claras, pode representar uma oportunidade concreta de valorização da região central.” Em contrapartida, a entidade Viva o Centro atesta estar radicalmente contra a modificação e que irá recorrer judicialmente em caso de nova aprovação. Ainda sem previsão de data para a segunda votação, o PL deve passar por uma rodada de audiências públicas.
Publicado em VEJA São Paulo de 8 de agosto de 2025, edição nº 2956