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Inaugurações

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Por Ivan Angelo
Atualizado em 14 fev 2020, 16h01 - Publicado em 13 jul 2018, 06h00

Não se pode dizer que eram bons para o amor aqueles tempos: as moças tinham de se casar virgens, e isso não raro trazia tormentos, frustrações, culpas, punições descabidas, fugas no meio da noite — problemas para elas e para as famílias. Vi isso acontecer com minha tia mais nova e se repetir com minha irmã mais velha: uma fugiu na madrugada, com grande alarido de galinhas e patos do meu avô, e a outra se casou entre correrias e tapas. Brincadeiras de namorados ou de amiguinhos paravam ali no que a imprensa chamava de tabu da virgindade. Em nome dele, podia-se anular um casamento.

Foi somente em 2002 que o Congresso aprovou um novo Código Civil retirando a perda da virgindade dentre os “erros essenciais de pessoa” que justificavam a anulação de um casamento. O erro seria o recém-casado ignorar que a moça não era mais virgem. Se ela contasse e ele aceitasse, tudo bem; se ele não aceitasse, adeus, casamento; se ela não contasse, corria o risco da descoberta e da anulação; se não tivesse coragem de contar a um pretendente, ficava encalhada; se a coisa vazasse, ficava falada e encalhada; se se aproveitasse, passava a ser uma desfrutável. Complicado.

Para o moço de hoje, a virgindade de uma garota é um detalhe, um lance legal, algumas vezes uma surpresa. Ele se sente honrado quando ela o escolhe para ser o primeiro, e essa é geralmente uma doação de amor, eterno enquanto dura. A mulher da geração pré-pílula dava-se ao “homem da sua vida”; a de hoje não tem um projeto de tão longo prazo e nem a exclusividade está necessariamente no horizonte.

A moça que perde o momento por insegurança e chega invicta aos 26, 28 anos se sente em desvantagem, faz segredo. Quando toma coragem, nem avisa, para não grilar o rapaz, tipo: ela deve ter algum problema. Nem os pais agitam mais essa bandeira. É só um entre tantos momentos de passagem na vida dos filhos, como a dentição, o desfraldar, a escola, a engrossada de voz do menino, a menstruação, a primeira relação, o primeiro emprego, o casamento, a maternidade…

A estreia dos meninos também foi mudando, mas nunca houve tabu. Na Europa medieval, o rapazinho tinha primeiro de mostrar seu valor nas armas de guerra, antes de ganhar o favor das damas. Tornava-se “homem” nos dois sentidos. Mais tarde, os meninos das boas famílias eram iniciados pelas empregadas da casa, mulheres livres das classes trabalhadoras, prostitutas e pelos casamentos precoces. Até uma época em que a classe média acabou com os casamentos juvenis: o homem tinha de se formar primeiro.

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A maioria dos pais não se envolvia: os rapazes que resolvessem o problema, como eles tinham resolvido o deles. Preveniam os filhos contra as más companhias, o jogo, o cigarro, a sinuca, a bebida, as doenças, e silenciavam quanto ao resto. Por volta dos 14, 15 anos, os meninos, trêmulos, buscavam suas mestras.

Hoje, a primeira transa é mais igual entre as partes: o menino inexperiente com a menina inexperiente, ou um dos dois com experiência mínima. Ambos não têm motivos para inibições porque aprendem o jogo juntos, depois de bater bola por algum tempo e discutir as regras.

Os pais deveriam se adaptar aos novos tempos. Não basta fornecer a casa e o lanche. Se ensinam a dirigir carro, a explorar os celulares e os computadores, a se vestir, a comer sushi com hashi, por que não a lidar melhor com a vida amorosa? No capítulo do proveito, elas deveriam ser encorajadas a procurar e mesmo a reivindicar resultados. Seria bom para os dois e para o futuro de cada um.

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