Crise da Avianca faz pilotos migrarem para a Ásia
Profissionais estão dispostos a se mudar para qualquer país para continuarem atuando
Dezessete pilotos de avião assistem a uma palestra no Sindicato Nacional dos Aeronautas, em São Paulo, sobre a possibilidade de trabalhar no Vietnã para uma companhia chamada Bamboo Airlines, que, segundo seus representantes, está “realmente crescendo” e voa para “destinos-chave”. Desses, quinze trabalhavam na Avianca Brasil e estão dispostos a se mudar para qualquer país para continuarem atuando como pilotos. Eles repetem o caminho que outros brasileiros da área já fizeram. Após o fim da Varig, no início dos anos 2000, vários pilotos brasileiros foram para a China.
“Vou para onde tiver vaga para não ficar desempregada. Preferia ficar no Brasil ou ir para a Turquia (a Turkish Airlines também está contratando), mas pode ser Vietnã”, diz Nathalie Porto, de 36 anos, que trabalhou um ano e meio como copiloto na Avianca.
Casada e com dois filhos – um de 9 anos e outro de cinco–, cogita levar a família para Portugal, e não para o Vietnã, porque as diferenças culturais são menores. Caso passe no processo seletivo da Bamboo, poderá trabalhar seis semanas no Vietnã e descansar duas na Europa ao lado dos filhos, já que a empresa tem essa escala mais favorável aos estrangeiros. “Me pareceu que voando lá conseguimos ter uma qualidade de vida boa. A escala de trabalho é tranquila e o salário bom para o país”, diz Nathalie.
A Bamboo oferece 11 000 dólares (43 000 reaisl) para comandantes de um A 320 e, segundo os representantes da companhia que davam a palestra no sindicato na semana passada, é possível viver com metade desse valor no Vietnã. “Apenas a escola internacional para as crianças é cara, entre 1 500 e 2 000 dólares”, diz um piloto que viveu no país e foi chamado para contar sua experiência aos candidatos brasileiros. “Mas as crianças vão falar inglês todos os dias. Ter matemática e ciências em inglês. E depois vão poder escolher um terceiro idioma, chinês ou francês”, destaca. Ele conta ainda que a companhia aérea costuma fazer parceria com as escolas e conseguir 20% de desconto nas mensalidades.
Para os homens solteiros, diz o piloto com experiência oriental, dá para estar em Hong Kong em duas horas e é possível ir para Bali para surfar. “A Bamboo voa para Bali”, lembra ele. Para os casados, ele aconselha, porém, deixar a mulher – “se ela tiver um emprego bom” – no Brasil e vir visitá-la a cada seis semanas. “As mulheres não gostam muito do Vietnã. Não tem muito o que fazer, apenas uns dois ou três shoppings bons.”
Os slides da apresentação da Bamboo Airlines mostram que a companhia oferece alguém no país para acompanhar todo o processo de mudança e tirar qualquer dúvida dos pilotos, além de organizar eventos culturais para os funcionários estrangeiros. Mas nem o salário superior à média brasileira (um comandante aqui ganha, em média, de 20 000 a 30 000 reais) nem os benefícios oferecidos pela companhia vietnamita são suficientes para empolgar os candidatos com a possibilidade de mudança ou fazer com que eles levem suas famílias. A maioria está disposta a morar no Oriente apenas para evitar o desemprego.
“Até considerava ir para lá, mas só daqui uns sete anos, para guardar dinheiro e ter uma aposentadoria melhor. A ideia era esperar meu filho, que tem onze anos, estar maior”, diz um ex-comandante da Avianca que pediu para não ser identificado. Se conseguir uma vaga, ele, que se candidatou a outras duas companhias vietnamitas, deve deixar a criança e a namorada no Brasil.
Outro ex-piloto da Avianca conta que preferiria ir para a China, porque os salários lá são melhores. “Vale a pena só por causa da valorização do dólar”, destaca. “Mas estou disposto a ir para qualquer lugar para trabalhar. Estou tentando Vietnã, China e Índia.” Com dois filhos, também pretende ficar indo e voltando do Oriente para as folgas de duas semanas.
O presidente do sindicato dos aeronautas, Ondino Dutra, afirma que, por causa da crise na Avianca Brasil, houve um aumento “considerável” na procura por vagas no exterior, mas diz não ser possível quantificar. Desde que a Avianca entrou em recuperação judicial, em dezembro, a entidade já recebeu profissionais de onze companhias aéreas e de cinco agências, que representam um total de 34 empresas, para seleção de pilotos e comissários.