Tumulto em eleição para síndico termina na delegacia
Alegando fraudes, grupo de condôminos do Baronesa de Arary, na Paulista, contesta a atuação da família que se reveza no posto administrativo há mais de uma década
Reuniões de condomínio costumam ser momentos sujeitos a altas doses de bocejo. Pautas palpitantes como a troca da cor do uniforme dos funcionários ou reclamações contra o vizinho barulhento afugentam a maioria das pessoas. A monotonia, porém, passou longe na última assembleia para a eleição do novo síndico do Edifício Baronesa de Arary, um dos maiores e mais antigos residenciais da Avenida Paulista, com 590 apartamentos, aproximadamente 3 500 moradores e arrecadação mensal de 200 000 reais. A disputa entre a dentista Alethéia Adriano, atual gestora, e a fotógrafa Louise Chin, da única chapa concorrente, terminou com urnas quebradas, cédulas rasgadas, agressões físicas e até registro de boletim de ocorrência no 78º DP, nos Jardins.
Realizada em um dos salões do hotel Maksoud Plaza no último dia 28 (o Baronesa não dispõe de um espaço onde caibam os participantes), a reunião, com cerca de 150 pessoas, começou em clima tenso. Há anos um grupo de condôminos contesta a atuação da família que se reveza no posto administrativo — Alethéia, em seu segundo mandato, é filha da advogada Meiri Luci Adriano, síndica em outras cinco gestões, e do advogado Sergio Tulio Rocha, que presta serviços ao edifício desde 2001.
O bate-boca pegou fogo na hora da contagem dos votos. Segundo a oposição, a turma de Alethéia não poderia concorrer: o argumento era que um dos conselheiros indicados pela chapa não residia no prédio. A dentista negou a acusação e apresentou uma declaração do candidato de que ocupa seu imóvel pelo menos três vezes por semana. Alegando fraude, com o argumento de que o apartamento em questão estaria em reforma, alguns participantes pediram o cancelamento da votação e, em coro, gritaram “É ilegal! É ilegal!”.
Em meio à confusão, a presidente da mesa, Sandra Khairallah, deu início à contagem das cédulas. Para impedirem a continuidade da eleição, alguns condôminos tentaram destruir os votos. Em um tumulto generalizado, sobrou até agressão. “A Sandra bateu diversas vezes no meu braço com o microfone e chegou a quebrar o equipamento”, diz o técnico em segurança Humberto de Souza, que saiu de lá direto para a delegacia, onde prestou queixa. A acusada, por sua vez, afirma que apenas tentava proteger os votos e que usou o equipamento para afastar os manifestantes. “Se ele estava no meio e foi atingido, não tenho culpa”, defende-se. A advogada também registrou um boletim de ocorrência alegando ter sido xingada de “corrupta” e “velha”, entre outros termos.
A rixa entre a família Adriano e uma ala de moradores do Baronesa de Arary não é recente. Em 2010, uma ação judicial determinou que Meiri deixasse o cargo por irregularidades. Um dos maiores opositores da administração é o técnico de laboratório Jurandir Rodrigues, que reside no local desde 1997. Há três anos ele alimenta um blog com acusações contra a gestão — conta já ter sido processado quatro vezes pelo conteúdo. Uma de suas reclamações diz respeito a um suposto superfaturamento na indenização a um ex-zelador. Na ocasião, um rateio teria sido realizado para pagar a multa de 100 000 reais, mas a arrecadação ultrapassou o dobro do valor. De acordo com a síndica, não houve má-fé. “O caixa do prédio estava negativo, então o conselho decidiu aproveitar o rateio para saldar outras dívidas”, justifica. “Nossos apoiadores imploram que continuemos na administração”, garante.
O bafafá recente deixou o ar nos corredores do Baronesa ainda mais pesado. “Um grupo saiu me xingandodepois de me abordar na garagem”, relata Sandra. Alguns vizinhos começaram a organizar um abaixo-assinado parar tirar do posto a Techsys, atual administradora. Segundo a ata da assembleia, uma reunião deverá ser marcada para dar continuidade à contagem dos votos, mas ainda não há data definida para o encontro. Diante da polêmica, Alethéia acenou com a possibilidade de desistir do cargo, com salário de 7 000 reais.
Ao lado do Parque Trianon e quase em frente ao Masp, o Baronesa já foi conhecido como o “Treme-treme daPaulista”. Entre 1993 e 1994, chegou a ficar interditado por problemas elétricos. Construído nos anos 50, o edifício já teve moradores ilustres, como o casal de atores Walmor Chagas e Cacilda Becker. Hoje seus habitantes pagam entre 230 e 1 200 reais de condomínio. Em troca do privilégio da vista da Avenida Paulista, quitinetes de 33 metros quadrados são vendidas atualmente por mais de 300 000 reais.