Cor é documento
Descubra o que está por trás das embalagens Laranja Hèrmes, Vermelho Cartier e Azul Tiffany, emblemáticas do luxo
A máxima de que o conteúdo vale mais do que a embalagem cai por terra quando entra em cena uma certa caixa turquesa arrematada por fita de cetim branco. O mesmo vale para outra, vermelha com laço escarlate, ou, por fim, para uma na cor laranja queimado, fechada por um nó de gorgorão marrom. Reconhecidos de longe, esses três pacotes são sinônimos de cobiçadas marcas de luxo — Tiffany, Cartier e Hermès, respectivamente — e costumam deixar os presenteados felizes mesmo antes de eles porem os olhos no conteúdo. Imagine, por exemplo, alguém que receba a caixa vermelha da Cartier. Com o pacote ainda fechado, não se sabe o que ele esconde (pode ser um porta-cartões de 280 reais ou um pingente de ouro e diamantes de 133 000 reais). De qualquer forma, a boa impressão já está garantida. Há quem jamais se desfaça da embalagem. Ilustrador requisitado por marcas como Fabergé e Baccarat, o japonês Shinsuke Kawahara decorou o apartamento com cada uma das caixas recebidas com presentes Hermès.
Laranja Hèrmes
Uma necessidade imposta pela guerra criou a cor-símbolo da maison francesa. Antes da ocupação nazista, as compras feitas no número 24 da Faubourg Saint-Honoré eram embaladas com papel bege acinzentado. Com a escassez de suprimentos, a Hermès se viu obrigada a adotar o único tom disponível: o laranja. Hoje, mais de 2,5 milhões de caixas são produzidas por ano, em 700 formatos, para acomodar a coleção de itens fabricados pela empresa fundada por Thierry Hermès em 1837: do equipamento de equitação, passando pela porcelana, até o prêt-à-porter.
A menor mede 5 cm x 5 cm x 1,5 cm, e foi pensada para abrigar um anel para lenços. Modelos inusitados são confeccionados apenas para embalar pedidos especiais, caso das caixas em formato de violão para os cases de guitarra feitos sob encomenda. Chamada de ‘bolduc’, nome que deriva da cidade holandesa de Bois-le-Duc, especialista em aviamentos, a fita marrom leva o logo da carruagem e o nome da marca estampados com uma tinta branca que lhes dá o efeito de alto-relevo. É fabricada pelo mesmo produtor há cinquenta anos: mais de 4 000 quilômetros de fita atados em presentes mundo afora.
Vermelho Cartier
Graças à beleza fulgurante e aos olhos cor de ametista, a atriz Elizabeth Taylor sempre teve admiradores e, não raro, ganhava deles presentes caros. Assim, montou uma das mais espantosas e (toc, toc, toc) invejadas coleções de joias do mundo. Mas até ela tremeu nas bases diante de uma das célebres embalagens vermelhas da maison francesa Cartier. Foi em 1957, quando vivia o terceiro de seus oito casamentos, com o produtor de cinema Mike Todd. Liz nadava na piscina de uma vila alugada pelo casal, nos arredores de Monte Carlo, quando viu o marido aproximar-se, tendo em mãos a caixa de couro marroquino gravada com desenhos dourados. Dentro, havia um suntuoso colar de diamantes e rubis, acompanhado de brincos. A cena, registrada em filme por uma amiga, foi parar no acervo da grife e ilustra um livro comemorativo lançado em 2009. A maison adotou a cor em 1847, ano de sua fundação. Por dentro, o ‘estofamento’ depende da joia: pode ser de cetim de seda branco ou veludo preto, o que valorizar melhor a peça. Nos anos 20, a caixinha estava tão associada a pedras de cair o queixo e acessórios dignos de marajás que apareceu na peça ‘Os Homens Preferem as Loiras’, de Anita Loos, na Broadway. Três décadas depois, o texto serviria de base para o filme homônimo, com Marilyn Monroe cantando ‘Diamonds Are a Girl’s Best Friend’. Feitas sob medida, as caixinhas vermelhas contribuem para os altos lances alcançados em leilões. São consideradas parte da joia.
Azul Tiffany
Um fenônemo curioso se passa com a Blue Box, marca registrada (literalmente) da joalheria americana. De tempos em tempos, um espertinho anuncia a caixa azul — vazia — no gigante eBay, site pioneiro na venda de todo tipo de artigo usado. Nas lojas, não raro entra um curioso e pede uma caixinha de presente aos vendedores. Em vão. Reza a lenda que a Tiffany se viu obrigada a tomar precauções até com o lixo das lojas para evitar gaiatos vasculhando seu material descartado em busca de um exemplar da embalagem turquesa. Nem os funcionários têm permissão de portá-las vazias para fora de qualquer endereço da joalheria americana. Tudo isso porque, já em 1906, a regra era clara: nenhum dinheiro do mundo paga a Blue Box. O único jeito de obtê-la é comprando uma peça da grife. Ou adquirindo uma versão da caixa em porcelana (cubos de 5 cm x 5 cm x 4 cm ou 9 cm x 9 cm x 8 cm, que custam, respectivamente, 365 reais e 630 reais), lançada justamente para satisfazer o fetiche pela embalagem.
Conhecida como azul Tiffany, a cor — icônica a ponto de virar referência até para a decoração — foi adotada desde 1837, ano da abertura da primeira loja da marca. A razão da preferência se perdeu na história, mas acredita-se que o tom tenha sido escolhido porque a turquesa era muito popular no século XIX. Era hábito entre as noivas da época vitoriana presentear o futuro marido com um broche em forma de pombo incrustado com a pedra.