Morre Fauzi Arap, o diretor da palavra
Cada vez que você ouvir Maria Bethânia declamar um poema ou explorar a dramaticidade de uma canção no palco, pode ter a certeza de que ali também estará Fauzi Arap. Parceiro constante da cantora, ele concebeu e dirigiu os mais importantes shows de sua carreira, como Rosa dos Ventos (1971), A Cena Muda (1974), Pássaro […]
Cada vez que você ouvir Maria Bethânia declamar um poema ou explorar a dramaticidade de uma canção no palco, pode ter a certeza de que ali também estará Fauzi Arap. Parceiro constante da cantora, ele concebeu e dirigiu os mais importantes shows de sua carreira, como Rosa dos Ventos (1971), A Cena Muda (1974), Pássaro da Manhã (1977) e Imitação da Vida (1996), criando para a estrela uma personalidade cênica mantida até hoje.
Ator, diretor e dramaturgo, o paulistano Fauzi Arap morreu na manhã desta quinta-feira (5), aos 75 anos, em seu apartamento na Avenida Paulista. Solteiro e sem filhos, ele estava com um câncer diagnosticado há seis anos. O corpo está sendo velado na Catedral Ortodoxa, e o enterro deve acontecer na sexta-feira (6), às 11h, no Cemitério São Paulo.
Engenheiro de formação, Fauzi Arap estreou como ator profissional no Teatro Oficina com A Vida Impressa em Dólar, em 1961. Ganhou destaque em sucessivas montagens do grupo de Zé Celso Martinez Corrêa, como Pequenos Burgueses, e também atuou no Teatro de Arena. A consagração viria com base em duas peças polêmicas de Plínio Marcos. Ao lado de Nelson Xavier, o intérprete protagonizou Dois Perdidos Numa Noite Suja (1967). No ano seguinte, Tônia Carrero confiou a ele a direção do espetáculo que traria novos rumos a sua carreira. Em Navalha na Carne, a atriz abandonou o glamour característico de suas performances para incorporar a decadente prostituta Neusa Sueli ao lado dos atores Nelson Xavier e Emiliano Queiroz em uma encenação que incomodou o regime militar e tornou-se um clássico do teatro brasileiro.
A valorização da palavra sempre foi a principal marca dos espetáculos comandados por Fauzi Arap. Como um caminho natural, em 1975, ele se lançou na dramaturgia com a peça Pano de Boca, escrevendo na sequencia O Amor do Não e Um Ponto de Luz. Em parceria com Juca de Oliveira, o diretor criou dois espetáculos distintos e muito bem-sucedidos, A Quarta Estação (1995) e Caixa Dois (1997). No primeiro, ele extraiu de Juca e Denise Fraga interpretações carregadas de lirismo e dramaticidade. Já em Caixa Dois, que ficaria quatro anos em cartaz, Arap valorizou a sátira política e social em torno da corrupção brasileira escrita e protagonizada por Juca. Também foram dele a adaptação do monólogo A Paixão Segundo GH, que revelou o talento da atriz Mariana Lima em 2002, e a direção do solo Kerouac (2006), o melhor momento de Mário Bortolotto nos palcos como ator.
Os mais recentes trabalhos de Fauzi Arap como dramaturgo foram vistos no ano passado em São Paulo. Denise Fraga e Claudia Mello dividiram a cena na comédia dramática Chorinho, dirigida pelo autor e Marcos Loureiro. Em cena, uma solteirona conservadora vai aos poucos encontrando afinidades com uma moradora de rua aparentemente amalucada. Em pauta, a marginalização feminina na sociedade.Também na trilha tragicômica, o ator Nilton Bicudo protagonizou o monólogo Coisa de Louco, criado por Arap especialmente para ele. Sob a direção de Elias Andreato, a peça mostrou um contador cheio de problemas que aceita ministrar – sem embasamento algum – uma palestra sobre drogas em troca de um cachê.
Está nas mãos de Nilton Bicudo e Elias Andreato a última peça escrita por Fauzi Arap. Batizado de A Graça do Fim, o texto inédito deve ganhar o palco até o final de 2014 e, mais uma vez, mostra que Fauzi Arap sempre procurou as palavras certas para cada momento.
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