Cycle Chic: pedaladas de salto alto
Ganha espaço na capital o movimento que une moda e bicicleta
Quando a ilustradora Fernanda Guedes, de 46 anos, surge pedalando pela Avenida Sumaré, em volta dela proliferam acenos e gritinhos de “Linda!”, “Chique!” e “Parabéns!”. A própria bicicleta, uma Blitz Comodo 700 branca (adquirida por 1.200 reais), apelidada de Lady Bike e equipada com três cestinhas, chama atenção. Mas é a dona da magrela o motivo das reações: ela comanda o guidão usando vestidos, sapatos de salto alto, maquiagem Chanel e luvas de oncinha. “Amo andar assim o dia todo, e não teria por que trocar de roupa quando estou no trânsito”, diz. “Sou perua e me encaixei no movimento Cycle Chic”, completa ela, adotando o termo importado da Europa que começa a se disseminar pelas ruas da cidade.
+ Galeria traz adeptos do Cycle Chic em São Paulo
Não se trata de mera peruagem, mas de uma nova bandeira do ativismo sobre duas rodas. Segundo essa filosofia, os ciclistas estão em um meio de transporte como outro qualquer e, se têm o direito de usar as ruas tanto quanto carros, motos e ônibus, não devem abrir mão de seus trajes habituais para ir aos compromissos. Por isso, abandonam as bermudas de Lycra ao estilo esportivo e se locomovem a bordo de figurinos mais produzidos. A expressão foi cunhada há quatro anos pelo fotógrafo dinamarquês Mikael Colville-Andersen, que mantém um blog sobre o tema repleto de fotos de pessoas alinhadas com ternos e boas peças de vestuário pelas ruas. Para ele, não há nada de excêntrico nessa moda: “A expressão denomina cidadãos normais pedalando pela cidade sem ter de renunciar às roupas do seu cotidiano”.
É o que defende o assessor parlamentar Daniel Guth, de 27 anos, que abandonou o carro em 2008. Cofundador do Libvee, movimento que organiza um calendário de eventos voltados ao ciclismo urbano, ele vai de bicicleta ao trabalho. Quando faz frio, coloca chapéu e paletó. “Assim, chego ao escritório cheio de adrenalina”, conta. Para Guth, porém, não é fácil manter a elegância em meio a um trânsito tão hostil. “A falta de educação é uma dificuldade, principalmente em relação aos condutores de ônibus e táxis.”
+ Xaveco Virtual: nossa ferramenta para paquerar no Twitter
Ao contrário da plana Copenhague, a capital da Dinamarca, onde mora o pioneiro do movimento, São Paulo tem uma topografia acidentada e um tráfego temerário — em 2010, foram 49 ciclistas mortos. Por isso, seria mesmo recomendável incentivar os paulistanos a andar em meio aos outros veículos e fora de faixas exclusivas, como querem os ativistas? Para o urbanista Candido Malta, isso não faz sentido algum. “A cidade é enorme e as pessoas têm de cobrir grandes distâncias”, diz ele, que faz ressalvas também quanto à integração aos meios de transporte coletivos. “Você não consegue andar em um ônibus ou metrô superlotado com a bicicleta do lado.”
É o tipo de análise que costuma enfurecer a militância do selim. “Não vejo razão nenhuma para abandonar esse hábito”, afirma Natália Garcia, líder do projeto Cidades para Pessoas. Ela encoraja ainda quem teme entrar na onda para não começar o expediente suando em bicas. “Com o tempo, você adquire condicionamento físico e aprende a se aproveitar da inércia para se cansar menos”, completa. Os adeptos escolhem equipamentos dos mais simples, sem marcha, aos sofisticados, cujos preços passam dos 2.000 reais. Já para o estilo não há concessão, e nem a chuva é desculpa. Membro do grupo Pedalinas, a jornalista Verônica Mambrini, de 27 anos, tem um figurino para a ocasião. “Monto um look com capa de chuva, galochas ou botas”, diz a dona de quatro bicicletas: Aimeé, Greg, Carlota e Capitu.
PARA ANDAR MAIS SEGURO
– O ideal é ganhar experiência em ciclofaixas antes de se aventurar no trânsito
– Campainha, sinalização noturna e espelho retrovisor esquerdo são itens previstos por lei
– Jamais saia sem capacete e sem luvas. Não use fones de ouvido
– Quando estiver em grupo, ande em fila
– Sinalize sua intenção por meio de gestos antes de executar manobras
Fontes: Federação Paulista de Ciclismo e Polícia Militar do Estado de São Paulo