Estrela da Band, Datena é um dos mais bem remunerados da televisão
Apresentador ganha cerca de 1 milhão de reais por mês, coleciona relógios e está prestes a se mudar para uma mansão avaliada em 3 milhões de reais
O efeito é imediato. Quando José Luiz Datena chega arrastando seu corpanzil de 1,83 metro e 114 quilos pelo estúdio de 90 metros quadrados onde apresenta diariamente o programa policial “Brasil Urgente”, na sede da Band, no Morumbi, a temperatura ambiente de 18 graus parece ficar ainda mais fria. Conhecido pelo temperamento explosivo, o maior astro da emissora, que aparece de terno chumbo, gravata de seda vinho e relógio e pulseiras cintilantes, provoca um clima de tensão.
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A equipe de oito pessoas faz silêncio enquanto ele conversa pelo ponto eletrônico com o editor-chefe, Simão Scholz. Às 16h45, quinze minutos antes de entrar no ar, Datena fica por dentro das reportagens do dia. “Essa entra, essa deixamos de lado”, determina à medida que recebe as informações. A vinheta da atração toca. É o aviso de que pelas próximas duas horas e vinte minutos o homem de voz possante vai falar sobre temas como congestionamento, enchente, roubo e assassinato.
O tom do discurso e o gestual do jornalista de 53 anos variam de acordo com sua irritabilidade e com os bordões que solta, muitas vezes com razão no que diz (“Os impostos neste país são uma vergonha” e “Onde estão os direitos humanos da vítima assassinada?” são alguns dos exemplos). Fala sem seguir roteiro e toma duas doses de café puro em um copo de plástico ao longo do programa. “Depois que assumi o horário, a audiência quintuplicou”, afirma, ao final do trabalho. Sob seu comando desde 2003, o “Brasil Urgente” se tornou a atração mais bem-sucedida da Band, com média de 6 pontos de ibope e picos de 10, o equivalente a 580.000 televisores ligados na Grande São Paulo.
Em sua jornada diária de doze horas de trabalho, o apresentador fica quase metade do tempo no ar. A primeira atração que comanda é o programa de rádio “Manhã Bandeirantes”, entre 10 horas e 11 e meia. Depois de um pequeno intervalo, já está na frente das TVs com o “SP Acontece”, das 13 horas às 14h15. Em todos esses momentos, consegue obter uma audiência acima da média, o que se reflete no faturamento de ambos: o dele e o da Band. Somente o “Brasil Urgente” rende uma receita de 2,2 milhões de reais por dia em publicidade.
Com essas credenciais, Datena é hoje um dos profissionais mais bem remunerados da TV brasileira. Entre salário e merchandising, estima-se que ele embolse 1 milhão de reais por mês. “Acho feio ostentar, por isso não falo em números”, avisa, para, em seguida, cair em contradição. “Recebo mais ou menos o que ganha o babaca do Galvão Bueno”, diz, com muita fineza. O narrador esportivo da Rede Globo também está na faixa de rendimento de 1 milhão de reais por mês.
Embora seja um sucesso de público, Datena volta e meia leva umas espinafradas da imprensa. Na semana passada, por exemplo, ao se referir à série de catástrofes que vem assolando o planeta, o colunista José Simão, da “Folha de S.Paulo”, escreveu que “o mundo datenou”. O apresentador não acusa o golpe. “Tenho meu público, respeito os direitos humanos e as leis de Deus e não passo por cima de ninguém”, afirma. “Se descem o pau em mim, é porque incomodo e realizo um bom trabalho.”
Ele se esforça para fazer jus à fama de ser um dos jornalistas mais truculentos e encrenqueiros da cidade. Certa feita, cansado de ser interrompido pelo apresentador, um entrevistado virou as costas e o deixou falando sozinho no ar. Por causa de suas opiniões fortes, também já bateu de frente com uma série de figuras, como o ex-jogador Ronaldo (na opinião de Datena, ele não passa de “um puxa-saco da Globo”). Seu público vibra a cada uma dessas oportunidades. “Esse cara tem coragem de dizer o que a população pensa”, acredita Natalício Bezerra Silva, presidente do Sindicato dos Taxistas de São Paulo.
O estilo desbocado não rendeu apenas desafetos. De tempos em tempos, Datena consegue, em primeira mão, notícias exclusivas e relevantes, que repercutem em vários lugares. Em março de 2010, José Serra assumiu numa entrevista a ele que seria o candidato tucano a disputar a Presidência da República. Na semana passada, foi a vez de o técnico Muricy Ramalho escolhê-lo para dizer que vai comandar o Santos. “Ao contrário do Ratinho e do Gilberto Barros, que são uma espécie de animador de auditório, o apresentador tem experiência de três décadas como jornalista”, avalia Eugênio Bucci, autor de diversos livros sobre ética na imprensa. “Mas não podemos esquecer que a base de sua receita é o sensacionalismo puro.”
Filho de uma costureira de bola de capotão e de um segurança, Datena nasceu em uma família de classe média baixa de Ribeirão Preto (SP). Ainda jovem, arrumou um emprego em uma rádio e, aos poucos, seu vozeirão ganhou prestígio na região. Foi convidado para trabalhar como repórter da Globo local e, depois, migrou para fazer exclusivamente jornalismo esportivo, já na Band. “Ele sempre teve o dom da comunicação”, diz a dona de casa Matilde, sua mulher há 34 anos.
No fim da década de 80, a convite do atual ministro Antonio Palocci, colega e conterrâneo de Ribeirão Preto, filiou-se ao PT. A ideia dele era transformá-lo em candidato a vereador da cidade. Datena, porém, nem chegou a tentar. “Política não tem nada a ver comigo”, afirma. Mesmo na condição de repórter esportivo da Band entre 1990 e 1996, sua família vivia no aperto. Tentou seguir a carreira na Record, mas, dois anos depois da transferência, a emissora decidiu demitir seus quinze repórteres esportivos. Datena foi o único que escapou do corte, sendo reaproveitado no “Cidade Alerta”, um dos precursores do gênero “mundo cão” na TV. “Caí de gaiato na cobertura policial”, diz ele. Com menos de um ano no ar, virou um sucesso e passou a receber salário de 60.000 reais mensais.
Tal qual um jogador de futebol, seu primeiro investimento foi um carrão. No caso, uma Grand Cherokee branca. De lá para cá, Datena não parou mais de gastar. Estão estacionados em sua casa de 500 metros quadrados, em Alphaville — de onde vai se mudar dentro de dois meses para outra ainda maior, em um condomínio no Morumbi, avaliada em 3 milhões de reais —, dois Audis (Q7 e A8) e dois BMWs (X6 e 550i). Todos blindados.
Os relógios são outra obsessão. Datena tem uma coleção de cerca de cinquenta modelos, entre eles Rolex, Montblanc e Tag Heuer. Ele costuma fazer aquisições de forma compulsiva, assistindo aos canais de leilão em TV por assinatura. Quando acorda no meio da madrugada, desce até a sala principal da sua casa, decorada com imagens de Jesus Cristo e de Che Guevara, e começa a zapear as melhores ofertas. “Insônia é sinônimo de prejuízo”, admite. “Parcelado em dez vezes, um Rolex até que não fica tão caro.”
Volta e meia, quando algum amigo comenta que achou bonito o relógio que brilha em seu pulso, Datena arranca o acessório para dar de presente. “Já ganhei mais de vinte”, diz o amigo e jornalista Jorge Kajuru, conhecido por seus exageros. “Isso sem falar que ele pagou uma dívida minha de 700.000 reais.”
O estilo mão-aberta faz de Datena a alegria dos garçons dos restaurantes em que aparece. “Em média, ele deixa 200 ou 300 reais a quem o atende aqui no Jardim de Napoli”, conta Antonio Buonerba, dono do estabelecimento de Higienópolis. Mas o esquema é toma lá dá cá. Volta e meia, pede por telefone que lhe entreguem em casa — que fica a 23 quilômetros de distância — um prato de polpetone, o carro-chefe do restaurante.
Quando fala fora do ar sobre temas como a segurança pública, suas opiniões podem surpreender. Datena diz ser contra a pena de morte e acha que a questão da criminalidade somente será resolvida com o combate à miséria. Ele só não poupa o tráfico de drogas, um problema que provocou uma tragédia em sua família.
Durante um tempo, Vicente, um de seus cinco filhos, foi viciado em crack, mas se curou depois de um tratamento numa clínica de reabilitação. “Esse inferno acabou há dez anos”, diz o apresentador. “Foi a pior experiência da minha vida.” Hoje, Vicente tem um restaurante próprio em Goiânia. Com “ódio mortal” de traficantes, Datena admite ter provado cigarro de maconha em duas ocasiões, ainda na adolescência. “Detestei e não recomendo a ninguém.”
Os muitos anos de uma rotina estressante, aliados à falta de cuidados com a saúde, estão lhe cobrando um preço alto. Teve um tumor benigno removido do pâncreas em 2006 e convive com uma hérnia na barriga que precisa ser operada, além de sofrer de diabetes. Ele se aplica cinco doses diárias de insulina, no total de 88 mililitros, para controlar sua taxa de glicemia, de 350 miligramas por decilitro de sangue (o normal é entre 70 e 100). Também toma outros quinze remédios para controlar a pressão alta.
O lado bom de todo esse desconforto é ter abdicado de um estilo de vida desregrado. “Não bebo mais feito um doido e hoje sou completamente fiel à minha mulher”, diz. A maior reclamação de Datena é em relação à carga pesada de trabalho. “Não aguento mais apresentar o ‘Brasil Urgente’”, confessa. “Mas aqui na Band não me deixam fazer outra coisa”, finaliza ele, espécie de refém do próprio modelo policialesco que ajudou a criar. E, em contrapartida, o transformou em um encrenqueiro milionário.
O ENCRENQUEIRO MILIONÁRIO
IDADE: 53 anos
PESO: 114 quilos
ALTURA: 1,83 metro
NATURAL DE: Ribeirão Preto (SP)
FORMAÇÃO: fez três anos do curso de direito na Universidade de Ribeirão Preto, sem concluir
SALÁRIO: estimado em 1 milhão de reais por mês
IBOPE: seu programa “Brasil Urgente” é o de maior audiência da Band, com média de 6 pontos de ibope e picos de 10
JORNADA DE TRABALHO: doze horas diárias, das quais mais de cinco horas ao vivo, revezando-se entre rádio e TV
ESTADO CIVIL: é casado com a dona de casa Matilde há 34 anos. Eles ficaram separados entre 1986 e 1987. Nesse período, Datena morou com a jornalista Mirtes Wiermann
FILHOS: Joel, 33 anos, Vicente, 29, e Junior, 22 (filhos com Matilde), e Marcelo, 24, e Letícia, 23 (filhos com Mirtes)
NETOS: André Luís, 10 anos, Bárbara, 8, e Neto, 4, todos filhos de Joel
PROBLEMAS DE SAÚDE: removeu um tumor benigno do pâncreas em 2006. Sofre de pressão alta e diabetes — sua taxa de glicemia é de 350 miligramas por decilitro de sangue (o normal é entre 70 e 100)
VAIDADE: comprar relógios em leilões promovidos por canais de TV por assinatura. Tem mais de cinquenta modelos de marcas como Rolex, Montblanc e Breitling
CARROS: Q7 e A8, da Audi, X6 e 550i, da BMW
CASA: mora em uma casa de 500 metros quadrados em Alphaville, mas vai mudar-se daqui a dois meses para outra em um condomínio no Morumbi cujo valor estimado é de 3 milhões de reais. Tem propriedades em Goiânia, Florianópolis e Guarujá
RESTAURANTES PREDILETOS: Jardim de Napoli, Gero e Novilho de Prata
HOBBY: ler livros sagrados, como a “Bíblia”, o “Alcorão” e a “Torá”