Grifes criam estratégias de apreensão contra a pirataria
Marcas como Dudalina e Cartier contratam escritórios para investigar venda de produtos falsos
Dois fatores chamam a atenção de quem põe os pés nas galerias lotadas de produtos de origem ilícita nas regiões da Rua 25 de Março e da Avenida Paulista. O primeiro é a sofisticação de alguns materiais vendidos. Há desde a cobiça da bolsa Birkin, da francesa Hermès, a 4 200 reais (sim, uma peça falsa pode custar essa fortuna), até o modelo em forma de pérola da Chanel, novidade da última coleção, por 500 reais — as verdadeiras saem a partir de 30 000 e 55 000 reais, respectivamente. No Shopping 25 de Março, há um estande especializado em camisas polo da Lacoste L!ve, linha moderna da grife francesa, e outro em camisetas Louis Vuitton. O segundo fator é a liberdade criativa dos copiadores. O logotipo pode até copiar algum famoso, mas certas peças seriam inimagináveis na marca.
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Tome-se como exemplo o tênis infantil da Osklen com estampa do artista plástico Romero Britto, disseminado no mercado paralelo. A empresa carioca nem sequer desenvolve linhas para crianças e jamais fez parceria com o pintor multicolorido. Muitos desses comerciantes também diversificam sua distribuição pelas redes sociais. “Segue minha loja no Instagram, me manda um WhatsApp e eu te falo os preços”, orienta o chinês, dono do quiosque 10 do Paulista Center, na esquina da Avenida Paulista com a Rua Pamplona. Não bastasse o aperfeiçoamento da qualidade e das novas plataformas de venda dos informais, o setor reclama de um afrouxamento no combate à pirataria na capital.
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Desde que assumiu a prefeitura, em 2013, Fernando Haddad tirou poderes do Comitê de Combate à Pirataria, ligado à Secretaria de Segurança Urbana. Capitaneado pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), o órgão criado em 2010 realizava batidas frequentes em camelódromos e shoppings populares. No primeiro ano de atuação, comandou 22 operações e apreendeu 26 milhões de itens, avaliados em 1,3 bilhão de reais. Hoje, não faz mais nenhuma ação do tipo. Segundo a administração municipal, a corporação não tem a atribuição de atuar em espaço privado. Assim, se um ambulante vende uma cueca Calvin Klein falsa na calçada, os agentes tomam medidas. Se o mesmo ocorre em uma galeria, não. “Houve uma repressão ao comércio ilegal há alguns anos, mas isso deixou de ser prioridade durante a gestão atual”, afirma o advogado Luiz Cláudio Garé, do Grupo de Proteção à Marca — BPG, que tem associados como Alpargatas, Bic e Nike. “Há um aumento de lojas desse tipo no centro e no Brás. A impressão é que a pirataria está vencendo a guerra.”
Com a saída de cena do comitê, agora as operações são realizadas por órgãos como o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e pela Receita Federal. No ano passado, a polícia recolheu um total de 6 milhões de itens, 74% a menos em comparação com as quantidades apreendidas anteriormente pela GCM. Com 25 operações, a Receita retirou 19,6 milhões de produtos de circulação no mesmo período, um desempenho ainda abaixo do da guarda. Para ocupar o buraco deixado pelo poder público, as próprias empresas passaram a assumir o controle das investigações. Hermès e o grupo suíço Richemont, dos relógios Cartier, Montblanc e Piaget, se reúnem para entrar com ações civis em conjunto na Justiça e obter autorização para recolher o material falsificado de lojas. “Isso ajuda a dividir os custos, que incluem alugar caminhões para retirar toneladas de peças, depois armazená-las e, por fim, destruí-las”, explica o advogado José Roberto Gusmão, do escritório Gusmão e Labrunie, que representa as grifes internacionais.
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Uma das principais companhias têxteis do Brasil, a Dudalina perde 500 milhões de reais por ano devido à pirataria. “Conseguimos diminuir a oferta dos ilegais porque organizamos a nossa própria fiscalização”, conta Marcio Guze, diretor financeiro da marca. Para reduzir o estrago, a empresa contratou o advogado Flávio Meirelles, do escritório Meirelles IPC, cuja equipe, composta de nove pessoas, percorre comércios e vasculha sites atrás dos pontos de venda. Em junho, uma operação resultou em noventa mandados de apreensão em lojas do Shopping 25 de Março. “Ao todo, fomos acompanhados por 200 policiais, com o recolhimento de 25 000 peças”, diz Meirelles, que ainda tem clientes como Calvin Klein, Mormaii, Quiksilver e Umbro. Os números são mais assustadores no segmento de óculos. A GO Eyewear, dona da marca Ana Hickmann, apreendeu 10 milhões de armações somente em 2014. “O nosso caso é de saúde pública. Esses artigos falsos não protegem do sol e podem queimar a retina”, explica o diretor de marketing, Fabio Monzillo.
Os escritórios especializados atuam também na pirataria digital, ao notificar sites que vendem itens falsos. Apenas no Meirelles IPC, há dias em que são realizadas até 100 denúncias do tipo, com a exclusão de links de plataformas como o AliExpress, fenômeno chinês de comércio virtual. “Só para a Dudalina, conseguimos excluir 41 000 links no ano passado”, conta o advogado. “Facebook e Mercado Livre, por exemplo, criaram mecanismos on-line para que os empresários denunciem os vendedores de produtos falsos.”
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