Gustavo Rosa deixou texto para ser publicado após a morte
Desprezado pela crítica, mas amado por ricos e celebridades, artista morreu na terça-feira (12)
Conhecido pela produção em série, o artista plástico Gustavo Rosa, de 66 anos, raramente demorava mais de quinze dias para terminar uma tela. No começo de outubro, começou a se dedicar àquele que seria seu último trabalho: um retrato de Ratinho, encomendado pelo próprio apresentador, que honrou antecipadamente a conta de 5 000 reais (a maioria dos clientes, porém, pagava preços na casa dos 50 000 reais). Debilitado devido às complicações de um câncer no pâncreas, não tinha ainda dado as últimas pinceladas na obra no dia 24 quando teve de ser levado ao Hospital Albert Einstein. Segundo Roberto, o único irmão vivo, estava desanimado por não ter mais a energia de antes. “Ele dizia: ‘Quero viver, mas, a apenas sobreviver, prefiro ir embora’”, relata. No primeiro momento de consciência, já entubado, olhou para Roberto e apontou o dedo indicador para cima. “Era uma expressão de que desejava ‘subir’, ou seja, morrer.” Segundo o médico Sergio Simon, jamais houve recuo no tratamento. “Os cuidados foram mantidos no mesmo ritmo até o fim”, conta o oncologista. Gustavo morreu na tarde de terça (12).
A luta contra o tumor começou em 1999, assim que o pintor descobriu ser portador de um tipo grave de câncer na medula óssea. No ano seguinte, após um transplante, a doença regrediu. O problema voltou em 2010, e posteriormente também apareceu no pâncreas. As agruras médicas contrastavam com o estilo do artista, autor de telas cheias de cor e alegria, que o tornaram querido de colecionadores, ricos e famosos. No fim de 2012, o apresentador Silvio Santos se encantou com um retrato da cantora Madonna no salão de Jassa, no Jardim Paulista. “Ele me disse: ‘Que bonito isso, me leva até o autor?’”, conta o cabeleireiro. Na primeira visita ao ateliê, inaugurado em 2005, na Rua Veneza, nos Jardins, o dono do SBT arrematou seis pinturas. Compraria mais sete ao longo deste ano. A empresária Lucilia Diniz e o publicitário Nizan Guanaes também eram clientes.
A popularidade nunca se repetiu na crítica. Era tido como uma espécie de Romero Britto paulistano e, assim como ele (sem falar dos herdeiros de Picasso e Dalí), investia no licenciamento de produtos — de xícaras a relógios. “Tem gente cheia de Bienais no currículo morrendo de fome”, afirmou Gustavo em uma entrevista concedida em 2005, em resposta ao desprezo dos especialistas. Jacob Klintowitz, exceção entre os críticos, resume sua importância: “Era um excelente pintor, tinha humor no que fazia”. Criado no Jardim Europa, filho de advogado e dona de casa, Gustavo dispensou a faculdade e participou de sua primeira exposição em 1966. Realizou ainda exibições em cidades como Nova York e Paris.
Com muitas namoradas (a atriz Mila Moreira foi uma delas), ele não se casou nem teve filhos. O irmão Roberto, o único herdeiro, vai administrar o ateliê, onde venderá reproduções. Uma biografia sobre ele deverá ser publicada em dezembro. Na noite da terça passada, pouco depois da morte, chamou atenção um post em primeira pessoa na sua página no Facebook. O texto e a senha da rede social haviam sido deixados nas mãos da secretária para publicação caso ele “subisse”. No post, registra: “Inquieto como sempre fui, resolvi flanar em outras plagas e parto no caminho da luz. Lá, vou alçar altos voos que serão tão leves quanto os traços que risco brancas telas, e tão vibrantes quanto as cores que transbordam da minha palheta”.