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‘Video mapping’: projeções mudam a cara de monumentos, parques e prédios

Saiba quem são os artistas especializados na técnica de arte digital

Por Tatiane de Assis Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 12 out 2018, 17h31 - Publicado em 12 out 2018, 06h00
Fachada no Masp: intenverção do VJ Alexis Anastasiou (Ignacio Aronovich/Veja SP)
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No Vale do Anhangabaú desde 1922, o prédio do Centro Cultural dos Correios acompanha quieto e imutável as transformações na paisagem paulistana. Entre sábado (13) e domingo (14), no entanto, o grandalhão vai ganhar uma cara nova, pelo menos das 20 horas às 4 da manhã. É quando uma de suas fachadas será tomada por video mappings — projeções de imagens feitas sob medida para os cantos, linhas, curvas e outros detalhes da arquitetura.

As apresentações integram uma ação do SP Urban Digital Festival, comandado por seis artistas visuais. Eles estão na dianteira dessa linguagem que parte do mapeamento de uma superfície (eis o porquê do nome) para criar obras digitais que enchem os olhos do público. “Apesar de gigantesco, o prédio dos Correios não está na memória dos paulistanos. Nosso objetivo é reapresentá-lo ao público, usando ferramentas contemporâneas”, explica Marília Pasculli, curadora do evento, que faz parte do SP na Rua, idealizado pela prefeitura. Junto dos espetáculos luminosos a céu aberto, rolam festas também ao ar livre.

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Cores em prédio do Minhocão: intervenção do duo VJ Suave (@VJ Suave/Veja SP)

Espécie de neta do cinema, a técnica começou a ser difundida por aqui cerca de quinze anos atrás, quando pipocaram as primeiras projeções em edifícios. Sua expansão, porém, é bem mais recente. Além da modalidade chamada arquitetônica, a mais famosa, há a possibilidade de ocupar todos os lados de uma sala fechada (mapping indoor) ou ainda o corpo de uma bailarina (body mapping), por exemplo. “Os lugares são mais do que uma tela sobre a qual trabalhamos, são elementos integrantes da narrativa”, explica Spetto, de 44 anos.

O artista é um dos grandes VJs (sigla para video jockey, do tempo em que essa expressão designava apenas o DJ de vídeos) da cena brasileira. A versatilidade é o que mais atrai o profissional. “Com imagens, podemos transformar uma coluna em um pirulito”, diz Spetto. Na última semana, ele e sua equipe da empresa United VJ’s surpreenderam os argentinos durante a abertura dos Jogos Olímpicos da Juventude, em Buenos Aires. Fizeram do Obelisco, um dos principais monumentos da cidade, uma pista de corrida vertical, entre outras maluquices.

Da mesma geração de Spetto, Alexis Anastasiou, de 43 anos, é outro expoente do video mapping no país com carreira internacional de sucesso. Em seu currículo está Abraço ao Cristo Redentor, projeto no qual a estátua carioca fechou virtualmente seus braços. O gesto, que emocionou os cariocas em outubro de 2010, era um sinal de acolhimento às crianças e aos adolescentes que sofrem abuso sexual. Realizada a pedido do Conselho Nacional do Sesi, contou com a direção e criação de conteúdo do cineasta Fernando Salis. Anastasiou e a equipe da Visualfarm, empresa fundada em 2003, ficaram encarregados de “escanear” o monumento e garantir a integração da obra com a estátua.

Sesc Avenida Paulista
O Sesc Avenida Paulista:
espetáculo vertical
na fachada da unidade (Bia Ferrer/Veja SP)

Sete anos depois, o paulistano deu um dos voos mais altos de sua carreira. Na 1ª Bienal da Antártica, ele e seu time intervieram em icebergs. Nas mãos dos brasileiros, os grandes blocos de gelo ganharam brilho, desenhos de animais e frases de tom crítico que apontavam para o distanciamento entre homem e natureza. Em agosto, o VJ e empresário lançou-se em mais uma empreitada.

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Em São Paulo, criou o Festival das Luzes. O evento reuniu artistas que utilizavam o video mapping de diferentes formas. Ele próprio decidiu recriar a narrativa do Monumento às Bandeiras, no Ibirapuera. “De um lado da escultura, há só três pessoas puxando o barco, um sintoma da falta de união do Brasil. Com as projeções, colocamos todo mundo junto dentro da embarcação”, afirma Anastasiou.

A dupla VJ Suave, formada pelo paulistano Ygor Marotta, de 32 anos, e pela argentina Ceci Soloaga, de 35, fez uma escolha diferente: tomou a Praça Victor Civita, em Pinheiros. O interesse dos dois não era destacar elementos das construções, mas buscar a interação com quem passava por lá. Uma onça caminhava pelo paredão ao fundo enquanto, mais à frente, no tronco das árvores, foram projetadas crianças indígenas envoltas em uma espécie de teia azul. Para o espectador, a sensação era de entrar em um cenário de sonho.

 

Video mapping na Praça Victor Civita: Projeto Symbiosis, Roberta Carvalho, na primeira edição do Festival de Luzes
Video mapping na Praça Victor Civita: Projeto Symbiosis, Roberta Carvalho (Alexandre Battibugli/Veja SP)

O potencial de sensibilização impulsiona o circuito. Marotta e Ceci já expuseram em vinte países. A viabilização passa por um aspecto fundamental: o alto preço dos projetores. Um equipamento de alta potência não sai por menos de 8 000 reais. “O aluguel não pode ser superior à quantia cobrada pelo nosso trabalho”, afirma Marotta. Considerando que performances de médio porte contam com dois ou mais equipamentos, o valor pode dobrar ou triplicar.

O orçamento galopa quando se fala de produtoras de vídeo consagradas, que cobram a partir de 50 000 reais para projeções arquitetônicas. O orçamento inclui a contratação do VJ e a criação de conteúdo, que pode ou não ser feita pelo VJ (o processo colaborativo é comum). Outro fator importante nessa matemática é o perfil do contratante. Se a ferramenta é utilizada em cerimônias menores, como formaturas e casamentos, por exemplo, o custo baixa e fica entre 15 000 e 20 000 reais.

Muitas vezes, VJs em começo de carreira fazem projetos sem nenhum lucro, somente pelo desejo de experimentação. Isso aconteceu com Leandro Mendes, de 36 anos, que se apresenta sob o codinome de VJ Vigas. Em 2010, ele realizou um video mapping na antiga estação ferroviária de Joinville, em Santa Catarina. Para tal, inscreveu-se em edital de fomento à cultura da prefeitura. A verba, de pouco mais de 10 000 reais, cobriu os custos de produção, mas não foi suficiente para remunerá-lo. Oito anos depois, os louros da dedicação vieram com a apresentação do projeto Fuga no festival Sónar, em Barcelona, na Espanha.

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A proposta pertence a outra modalidade, o fulldome. Feita em uma espécie de cúpula, tem como característica a imersão. “Todos estavam quase dentro das imagens, passeando por túneis onde formas geométricas e orgânicas se misturavam”, lembra Vigas. Apesar das diferenças entre as modalidades, Vigas traça um modo comum, com algumas linhas mestras para a realização de um video mapping. Primeiro, é preciso estudar o lugar onde vai ser feito o projeto, entender suas características topográficas e extrair suas medidas com exatidão.

Outro ponto importante dessa fase é o cálculo da quantidade de luz necessária por metro quadrado, determinante para a próxima etapa, a criação de uma espécie de planta digital, sob a qual são construídos os conteúdos a ser exibidos. Isso pode ser feito com softwares que trabalham em 2D ou 3D. O produto pode ser um vídeo convencional com início, meio e fim ou ainda uma experiência interativa, na qual o que aparece na “tela” é resultado da interação em tempo real da pessoa com um dispositivo.

O teste acontece na reta final, quando os trabalhos são posicionados no local das apresentações. Se elas são feitas ao ar livre, é preciso colocá-los em torres metálicas, para que a luz não produza sombras em contato com espectadores ou outros obstáculos. A iluminação pública também deve ser considerada na equação. Da mesma forma que outras artes urbanas, como o grafite, o video mapping também requer autorização prévia da prefeitura — a Comissão de Proteção à Paisagem Urbana é a entidade responsável pela avaliação e liberação dos pedidos.

Achou o passo a passo trabalhoso? Pois saiba que o esquema para o body mapping trackeado, modalidade na qual as projeções são feitas em uma parte do corpo humano e acompanham a movimentação de músculos e órgãos, é ainda mais complexo. No clipe Vou Te Encontrar, de Paulo Miklos, lançado em novembro do ano passado, por exemplo, é possível observar essa simbiose entre homem e pixels. A porção central do rosto do cantor vira desde uma avenida com carros circulando até uma constelação.

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Festival de Luzes de SP
Video mapping no Monumento às Bandeiras, feito pela equipe de Alexis
Ana (Ignacio Aronovich/Veja SP)

O projeto, comandado por Arthur Boniconte e Gabriel dos Santos, da produtora audiovisual paulistana Midiadub, levou seis meses para ficar pronto. “Escaneamos o rosto do Miklos. Colocamos câmeras especiais em pontos-chave para que as imagens o acompanhassem”, explica Boniconte. O resultado foi aprovado pelo artista paulistano e também pelos seus fãs: já foi visto por cerca de 320 000 pessoas. “A canção tem um tom muito pessoal, então foi interessante que as imagens fossem projetadas na pele. Elas não servem como ilustração, mas como novas leituras da música”, afirma Miklos.

UM QUASE DIPLOMATA

Alexis Anastasiou
O VJ Alexis Anastasiou (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Alexis Anastasiou, de 43 anos, é um dos grandes VJs do país. À frente da Visualfarm, atua como diretor de projetos e produtor executivo. O paulistano, de ascendência grega, recruta colaboradores. O cineasta Fernando Salis, por exemplo, criou o vídeo do abraço no Cristo, em 2010. Formado em relações internacionais pela Universidade de Brasília, Anastasiou recusou uma vaga no Ministério da Cultura para seguir carreira na arte. A projeção no Monumento às Bandeiras é de agosto.

O DUO CRIATIVO E SEU TRICICLO

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Ygor Marotta, de 32 anos, e Ceci Soloaga, de 35: duo VJ Suave (@VJSuave/Veja SP)

Ygor Marotta, de 32 anos, e Ceci Soloaga, de 35, são os nomes por trás do VJ Suave. O duo, criado em 2009, trabalha com arte digital e realidade virtual. Enquanto a argentina é responsável por questões técnicas e roteiros, o paulistano bola as criaturas mágicas e os animais gigantes exibidos nos video mappings. Com o projeto Suaveciclo, triciclo que tem um projetor acoplado, eles já levaram suas histórias para São Paulo, Porto Alegre, Brasília e Rio, além do Canadá. Nos Açores, em Portugal, estamparam uma onça num morro.

UM HOMEM DE CERIMÔNIAS

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Spetto, um dos principais nomes do video mapping (Bia Ferrer/Veja SP)

Um dos criadores do United VJ’s, o santista Spetto, de 44 anos, é outro grande nome do video mapping. Esteve à frente das projeções da abertura da Olimpíada do Rio, em 2016, e também da equipe que cuidou das apresentações iniciais nos Jogos Olímpicos da Juventude, realizados neste mês em Buenos Aires. Em abril deste ano, comandou um show geométrico e colorido na fachada do Sesc Avenida Paulista.

COM OLHOS E LUZES NA LUA

VJ Vigas
VJ Vigas: revelação da área (ABDUKT/Veja SP)

Nascido em Joinville, Leandro Mendes, de 36 anos, o VJ Vigas, é uma das revelações da área. Em 2016, foi premiado no Circle of Light, em Moscou, um dos festivais mais importantes desse circuito. Questionado sobre os lugares onde gostaria de fazer projeções, ele brinca: “Na lua seria legal”. De volta ao chão, entrega planos não menos audaciosos. “Há o Burj Khalifa, em Dubai, que é o maior arranha-céu do mundo, a Times Square e o Atelier des Lumières, em Paris”. Na foto, Fuga, projeto indoor que fez na Espanha.

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