Ver ou não ver, não existe essa questão…
Confira um perfil do crítico de teatro da Vejinha Dirceu Alves Jr.
Gosto muito de encontrar Dirceu Alves Jr. em cinemas e shows. É uma ótima maneira de comprovar que ele não é um obcecado por teatro. O obcecado só vê um tipo de coisa, só curte um determinado gênero, não consegue enxergar beleza em outras manifestações. Essa falta de sensibilidade para manifestações variadas é algo muito complicado para um crítico. Dirceu gosta de teatro, o que é muito diferente. Gosta profissionalmente, o que é fundamental.
Mesmo assistindo a vários espetáculos por semana — numa cidade em que não é raro termos 100 peças em cartaz —, ele parece não perder o entusiasmo. Mesmo nós, que fazemos o teatro acontecer nos palcos, temos preguiça de vez em quando (tem cada peça por aí, valha-nos Deus). Por força da coluna que assina, Dirceu deixa a preguiça na gaveta e encara espetáculos admiráveis, chatos, experimentais, excitantes, enfadonhos. Eu me arriscaria a dizer que ele é o colunista e crítico teatral da grande imprensa que mais assiste a peças na cidade. E isso é muito importante para nós, que estamos do lado de cá do balcão.
Acontece que o espaço da coluna de teatro é fisicamente limitado. É preciso um rodízio de peças, e muitas vezes ficamos com a sensação de que a nossa tem uma placa com vários finais, pois “nunca” está no roteiro. Não é só por vaidade ou vontade de ver o nome na revista. Quando a peça entra no Roteiro da Semana, aumenta a chance de ter gente na plateia. Se a resenha é elogiosa ou acompanhada de várias estrelinhas, então, é quase certeza de boa casa (no jargão teatral, isso é sinônimo de plateia cheia de pagantes). Digo “quase” porque, em teatro, a boa crítica ajuda, mas o excesso de calor ou frio, a chuva ou o ar seco, às vezes até o último capítulo da novela ou a semifinal do campeonato de futebol do Leste Europeu servem de desculpa para o espectador deixar “pra semana que vem”.
É claro que todo esse mundo paradisíaco muda se a crítica é negativa ou contém menos estrelas do que o merecido (na visão de quem está em cena). O crítico “genial” vira qualquer coisa abaixo de facínora e os termos usados para defini-lo nas mesas de bar frequentadas pela classe teatral são impublicáveis numa revista de família. Já vi uma pessoa ter opiniões opostas sobre Dirceu, na mesma semana, conforme o diagnóstico diferente de dois espetáculos do mesmo profissional. Acontece — e acho que Dirceu já se habituou a isso.
Não é preciso concordar com a opinião de Dirceu. Eu mesmo nem sempre concordo. Minhas peças, na minha opinião, sempre mereceram cinco estrelas e ele nunca… Deixa pra lá. Na verdade, prova da maturidade do público de teatro paulistano é que as críticas servem de baliza, mas não matam nem constroem a carreira de um espetáculo. Muita peça ignorada pela imprensa lota as plateias, enquanto outras — importantes por seu tema, montagem, ousadia, reflexão — ficam às moscas. O crítico dá parâmetros, mas quem decide se vai ou não pagar o ingresso é o público. Nestes tempos de redes sociais impacientes, é muito importante ouvirmos (e respeitarmos) opiniões divergentes. Fundamental é que a resenha do crítico não seja marcada pelas relações pessoais ou por opiniões de momento. Nisso, Dirceu acerta. Suas birras, se é que ele as tem, ficam na mesma gaveta em que guarda a preguiça antes de ver o sétimo espetáculo da semana.
Mário Viana, jornalista, dramaturgo e roteirista de televisão, sobre Dirceu Alves Jr., crítico teatral da Vejinha desde 2007, que assiste a cerca de200 peças por ano.