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Um legítimo craque paraguaio é a cara do Timão campeão

Capaz de alternar momentos geniais com outros de um perna de pau, Romero foi quem melhor encarnou o espírito do hepta

Por Sérgio Luz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 16 nov 2017, 10h28 - Publicado em 15 nov 2017, 23h38
 (Estadão Conteúdo/Estadão Conteúdo)
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Nem o mais fervoroso corintiano começou o ano otimista com o clube, a começar pela escolha do técnico, o novato Fabio Carille, nome opaco em meio à constelação de “professores” que orbita os grandes times nacionais. Se não bastasse, enquanto rivais gastavam rios de dinheiro em contratações, os reforços do Parque São Jorge eram bastante modestos. O principal deles, o atacante Jô, vinha de uma fase sonolenta. O conjunto parecia a versão século XXI do “Faz-me rir”, apelido que o fraquíssimo elenco de 1961 recebeu, inspirado no bolero de Edith Veiga, grande sucesso na época. Aos poucos, no entanto, o atual alvinegro começou a surpreender.

Corinthians x Palmeiras
Romero: útil no ataque e na defesa (fotoarena/Veja SP)

Venceu o Paulista e, na sequência, engatou o melhor primeiro turno da história do Brasileirão. Desde então, passou a administrar a enorme folga e nunca foi verdadeiramente ameaçado. Confirmou o título com antecedência na noite desta quarta, 15, ao bater o Fluminense por 3 a 1 no estádio de Itaquera. Considerando-se as próximas três partidas que ainda restam, será o campeão com maior tempo de permanência na liderança de uma temporada. A partir da quinta das 38 rodadas, assumiu a ponta — e de lá não saiu mais. Uma façanha e tanto em um torneio historicamente bem equilibrado.

faz-me-rir-corinthians
O Timão de 1961: piada inspirada em letra de bolero (Placar/Veja SP)

Carille provou ser um treinador competente e equilibrado. Nos melhores momentos, o Corinthians exibiu um entrosamento acima da média. Nos jogos principais, atropelou os adversários mais perigosos, como Grêmio e Palmeiras. Jô venceu as desconfianças, marcou dois dos três gols contra o Fluminense e está hoje entre os artilheiros do Brasileirão. Jovens como o lateral Guilherme Arana despontaram. O goleiro Cássio fechou o gol tão bem que voltou a ser convocado para a seleção, depois de um longo e tenebroso inverno de frangos e atuações medíocres. Mas nenhum outro jogador tem tanto a cara do time campeão quanto o atacante Romero, um autêntico craque paraguaio.

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Nascido em Fernando de la Mora, a 9 quilômetros de Assunção, o rapaz de 25 anos sempre foi objeto de piadas e críticas no Brasil. Seu irmão gêmeo, Óscar, dizem por aí, seria muito melhor. Ou seja, Romero já seria “falsificado” de berço. As gozações prosperam porque alterna jogadas geniais com lances de perna de pau. Uma reportagem desde ano do programa Esporte Espetacular, da Rede Globo, virou meme. O jornalista atirou uma bola fácil na direção do corintiano, que não conseguiu dominar. Magoado, Romero passou os meses seguintes negando-se a dar entrevistas.

Ele tem qualidades técnicas, embora esteja longe de ser o jogador mais refinado do planeta. No quesito espírito de luta, ou raça, como se chamava antigamente, há poucos capazes por aqui de rivalizarem com o atleta. Além de municiar o ataque, tem como uma de suas principais funções ajudar a proteger um dos flancos da defesa quando o time não está com a bola. Nesse papel, mesmo quando cai no chão humilhado por um drible, volta à carga imediatamente, feito um Jason boleiro. É incansável e, sobretudo, eficiente. Nas estatísticas da temporada, tem sido o corintiano que mais intercepta passes dos adversários. A exemplo do Corinthians 2017, Romero mostrou ser melhor do que parecia. O título de legítimo craque paraguaio deveria ser unânime depois do que ele fez este ano, mas isso não é possível em um país que cultiva ainda o gosto pelos boleiros indolentes e talentosos. Dentro da nossa cultura futebolística, a habilidade natural vale como passaporte para ignorar treinos e não suar a camisa nas partidas. Malandro que nasce bom de bola não precisa correr atrás dela.

Ocorre que, no futebol moderno, há cada vez menos espaço para o gênio preguiçoso. Talento continua sendo fundamental, é claro. Mas vence quem combina isso com preparação física, força mental e disciplina tática. Não à toa, Cristiano Ronaldo foi eleito cinco vezes o melhor do mundo nos últimos anos. Há quem ainda o despreze no Brasil. Existem também os que ignoram outros sinais claros de mudança dos tempos nos gramados. Com apenas 300 000 habitantes e tradição zero no futebol, a Islândia superou bichos-papões na Eurocopa de 2016. Chegou às oitavas de final, depois de eliminar a Inglaterra. Nas eliminatórias da Copa da Rússia, mostrou que isso não era um golpe isolado de sorte. Classificou-se pela primeira vez na história para a disputa do Mundial. Na última segunda (13), a Itália, ficou de fora dessa mesma competição, sucumbindo diante da Suécia. Por ter menos títulos e tradição, ela era considerada a zebra na disputa mata-mata com os tetracampeões. O Corinthians de Romero é mais um exemplo de como um bando disciplinado e determinado de operários da bola pode superar adversários mais bem-dotados tecnicamente. Pode ser uma lição valiosa para a seleção brasileira, que já tropeçou inúmeras vezes na soberba da superioridade da camisa canarinho e vai tentar em 2018 dar a volta por cima do vexame dos 7 a 1.

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