SXSW: diretor de criação traz na bagagem os destaques do evento no Texas
Especialista participou do South by Southwest (SXSW), festival que há décadas antecipa o futuro em Austin

Austin não é uma cidade como qualquer outra. O lema local, “Keep Austin Weird” (mantenha Austin esquisita), não é só um slogan de camiseta, mas um modo de vida pra quem vive no meio do Texas, um estado historicamente conservador, que recebe o maior festival de inovação (e inovação é o oposto de conservadorismo) do planeta. É como se aparecesse uma cidade californiana no meio oeste. E é nesse cenário peculiar, onde um cowboy hipster toca blues em uma esquina enquanto um poeta vende poemas escritos na hora com sua máquina de escrever em frente a um bar que serve tacos veganos (sim, é um lugar de sobreposição de referências), que acontece o South by Southwest (SXSW), o festival que há décadas antecipa o futuro.
Durante alguns dias de março, Austin se transforma. É como se uma cidade inteira fosse hackeada por mentes criativas do mundo todo. Você pode esbarrar num engenheiro da Audi, como aconteceu comigo, que me contou sobre os novos padrões de conforto dos carros autônomos do futuro – massagens, experiências sensoriais, telas imersivas – porque, afinal, dirigir será uma coisa do passado. Ou então, do nada, encontrar uma artista japonesa de realidade virtual de quimono comendo costelas ao barbecue em um autêntico saloon texano. Contrastes inesperados que só fazem sentido aqui.
Além disso existe uma dinâmica única nas ruas. O SXSW não é só um festival de tecnologia, inovação e cultura. Ele é um verdadeiro experimento social em tempo real. São mais de 70 mil participantes lotando as ruas, disputando um lugar nos mais de 350 painéis, workshops e ativações que acontecem simultaneamente em dezenas de locais espalhados pela cidade.
A mágica do evento está justamente nessa geografia descentralizada. As palestras acontecem em teatros históricos, hotéis, galpões industriais e até em bares, o que força um deslocamento constante. Você sai de um painel sobre o futuro da inteligência artificial, corre para outro sobre o impacto da personalização na cultura de consumo, e no caminho pode acabar trocando ideia com um dos palestrantes ou com alguém que trabalha exatamente naquilo que você quer entender melhor.
E é aí que o FOMO (Fear of Missing Out) atinge níveis épicos. Porque sempre há pelo menos três eventos imperdíveis acontecendo ao mesmo tempo. O resultado? Todo mundo perguntando “Onde você estava? O que você viu? Foi bom?”, enquanto tenta planejar os próximos passos. Mas no fundo, o melhor do SXSW não está só no que você escolhe assistir, mas no que você encontra no caminho. E a presença de brasileiros é maciça. Chega a ser estranho (ou seja, normal por aqui) encontrar tanta gente do Brasil – aproximadamente 2.500 – pelas ruas e painéis. Os grupos de brasileiros no WhatsApp fritam com dicas, novidades e notícias sobre filas, ativações e insights. É você desligar e aparecem duzentas mensagens e comentários.

Entre os grandes nomes deste ano, Michelle Obama falou sobre liderança e cultura em tempos de mudanças radicais, enquanto Ben Stiller, num painel com o Eddy Cue – VP de serviços da Apple – abordou os desafios de retenção de atenção e os paralelos de sua série Ruptura com a própria Apple na questão criativa.
Mas um dos momentos mais esperados foi a palestra de Amy Webb, futurista e CEO do Future Today Institute, que apresentou cenários provocativos sobre como a convergência entre IA, biotecnologia e novos sensores estarão redefinindo o comportamento humano. Um dos destaques do evento também foi o dos impactos da tecnologia no comportamento e na saúde das pessoas. Muitos painéis abordaram a questão e o preço que as tecnologias podem cobrar tanto nas relações sociais quanto nas de trabalho, a abordagem sobre a ética no uso de inteligência artificial também é uma novidade presente.
Mas o SXSW não é só sobre palestrantes famosos. Muitas das conversas mais transformadoras acontecem nos encontros informais, nas trocas inesperadas que acontecem entre uma sessão e outra. É o tipo de lugar onde um bate-papo casual pode virar uma colaboração global.
Como diretor de criação que foca em experiências, percebi como as ativações de marca e as experiências imersivas de todos os segmentos transformam Austin em um playground de inovação. O Museu do Futuro de Dubai, por exemplo, trouxe uma instalação imersiva “Earth Dreams” do renomado artista digital, Refik Anadol’s , na qual os visitantes eram transportados para uma realidade paralela através de uma sala redonda toda de led com espelhos com ambientação sonora em 3D. Na saída você podia participar de painéis sobre tecnologia, tomar um tchai e ganhar o chocolate que é tendência no mundo do Tik-Tok. Parece muito e é.
Além disso a cidade e o entorno do centro de convenções ficam lotados de lançamentos de produtos, filmes e séries, todos espalhados em grandes estandes construídos em estacionamentos, dentro de bares e teatros, é como se cada espaço vazio da cidade se tornasse uma oportunidade para marcas se mostrarem, verem e serem vistas. Uma espécie de CCXP nas ruas.
Quem fez sucesso também foi a SP House, iniciativa do Estado de São Paulo que levou para Austin uma curadoria de eventos, shows e transmissões ao vivo focadas em criatividade e conexões globais. É a chance também de as pessoas da cidade vivenciarem o trabalho de artistas imersivos como a instalação Stars do Andrew Schneider – que ficará no palco do maior auditório da Faculdade de Belas Artes até depois do SXSW. A instalação é um penetrável super imersivo e conta com 400 lâmpadas penduradas em fios de led e mais de 500 canais de áudio que geram, no escuro completo, volumes nessa tela imersiva (com você no meio, sim é difícil de explicar) e te leva a um mergulho interno, uma pausa para reflexão.
O artista que é considerado “alucinante, psicotrópico e milagroso” pelo NYTimes e sua obra realmente mexe com as pessoas. Conversei com Andrew ao final da minha experiência (fui o primeiro a chegar, olha o FOMO aí) sobre o uso de sua voz na narrativa e ele explicou o uso da abordagem do tempo e da forma que a gente o usa – por exemplo, você tem mais 70 anos de vida e ficará 1 ano esperando em filas – nesse espaço que convida as pessoas a um hiper foco do agora.
E com certeza a ativação de marca mais impressionante deste ano foi, sem dúvida, o primeiro voo de drone tripulado por humanos do mundo. Sim, não é cena de ficção científica. Foi aqui, no SXSW, que testemunhamos um vislumbre do que pode ser a mobilidade urbana em um futuro próximo.
Ano após ano, o SXSW prova que não é apenas um festival, mas um radar do que está por vir. O que acontece em Austin durante esses dias costuma antecipar mudanças que, em pouco tempo, impactam o mundo.
Mais do que tecnologia, o festival nos faz refletir sobre como estamos vivendo. Se as redes sociais hiper personalizam nossa experiência digital, agora esperamos o mesmo do mundo físico. Queremos que tudo seja sob medida, feito para nós, sem fricção. Essa hiper customização, essa curadoria especial que começou no feed do Instagram, já chegou às marcas, aos serviços e até à nossa forma de interagir com o mundo.
O SXSW 2025 deixou claro que o futuro não será só sobre inovação tecnológica, mas sobre como continuamos humanos dentro dessa nova realidade.
E se tem um lugar onde essa conversa acontece primeiro, é aqui, em Austin. E não se engane, o FOMO do ano que vem já começou…
