“Raspamos o cabelo juntos por causa do meu câncer de mama”
Carol Pimentel conheceu o marido, Juliano, quando os dois trabalharam juntos em 2013. Depois do nascimento da filha, Bella, ela descobriu a doença
“Juliano, 38, mudou minha vida. Eu o conheci em 2013 quando ele fazia estágio em ortopedia no mesmo hospital que eu operava como cirurgiã bucomaxilofacial. Ele inventou que poderíamos escrever um artigo científico juntos e trocamos telefone. O artigo nunca rolou, mas deu namoro. Namoramos a distância por três anos, ele no Espírito Santo, eu em São Paulo. Tínhamos cinco minutos cravados por dia para falar ao telefone e nos víamos uma vez por mês.
O pedido de casamento aconteceu na Páscoa, no meio da Santa Missa. Ele perguntou, bem direto, em qual mês preferia casar. As condições eram que morássemos em Vitória e que meu filho, Cayo, 15, também fosse responsabilidade dele. Mas mudamos para São Paulo há dois anos.
Na formatura do Juliano, dei um martelo cirúrgico banhado a ouro com seu nome gravado, por causa da ortopedia, mas ele depois mudou para nutrologia. Em 2016, ele explodiu na internet com um canal sobre alimentação e saúde. Junto a isso veio o assédio das seguidoras. Eu não me incomodava porque sei que ele quer estar comigo, mas a coisa ficou tão maluca — mandavam até nudes — que ele começou a ficar incomodado e me convenceu a entrar nessa também, para mostrar que era bem-casado. No começo resistia porque tinha problemas com autoimagem: já cheguei a pesar 103 quilos e fiz bariátrica, mas estava voltando a engordar. Emagreci porque ele me ensinou a comer de forma saudável. Juliano me fazia participar das lives e dizia que eu não enxergava a grande mulher que eu poderia ser.
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Juliano é celíaco e desconfiava que poderia ser estéril. Até que um dia senti uma cólica às 4 horas da manhã e fiz o teste de farmácia. Fiquei paralisada com o resultado. Eu voltei para a cama, Juliano me abraçou e me perguntou porque meu corpo estava rígido. Revelei que estava grávida e ele, emocionado, começou a me beijar.
Depois que ganhei a Bella, em julho, uma consultora de amamentação da maternidade me ensinou a fazer massagem na mama para a saída do leite. Ao massagear, sentia que o seio esquerdo estava diferente. Fui ao médico fazer ultrassom e, quando ele colocou o aparelho na mama, vi no monitor imagens com bordas irregulares. Na hora soube que era câncer. O médico tirou uma biópsia e mandou para análise. Assim que saiu o resultado, ligaram para o Juliano confirmando o carcinoma. Ele me puxou para dentro do quarto, sentou na cama, pegou na minha mão e começou a chorar.
Quando falou o resultado, parecia que eu tinha tomado uma porrada na cara. Eu já sabia, mas, escutar em definitivo que é realmente aquilo, é diferente. Meu mundo caiu, meu chão desabou. Eu só queria ir ao mastologista para remover os seios. Juliano ligou para o amigo e oncologista doutor Raphael Brandão, outro presente de Deus na minha vida. Maravilhoso como médico e também como ser humano. Parece que ele veio embalado com um laço vermelho para mim. Doutor Raphael diz que o momento da notícia é o mais urgente, porque a primeira coisa que o paciente pensa é que vai morrer, mas o câncer não é sentença de morte. Ele me pôs de volta ao meu eixo e explicou que o tipo de câncer determina o tratamento. Decidi enfrentar a doença e até apelidei o tumor de 6 centímetros de “tutu”. Como doutor Raphael diz que minhas sessões de quimioterapia vão “derreter” o câncer, criei a hashtag #derretendootutu.
Compartilho todo meu processo nas redes sociais e filmei Juliano raspando meu cabelo. Ele raspou o dele também e depois me levou para tomar banho e tirar o resto de fios presos ao corpo. Achei refrescante a sensação da água caindo na careca! Juliano disse que só deixará o cabelo dele crescer quando o meu crescer. Há os que são contra minha exposição na internet, mas, se eu posso ajudar outras mulheres com meu testemunho, é o que vou fazer.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 14 de outubro de 2020, edição nº 2708.